|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
29ª MOSTRA DE CINEMA
Atriz espanhola homenageada pelo festival faz show de bossa nova hoje; no cinema, diz que já teve suas "doses" de Almodóvar
Victoria Abril solta a voz e o verbo em SP
SILVANA ARANTES
DA REPORTAGEM LOCAL
A atriz espanhola Victoria Abril,
45, é dessas pessoas que parecem
haver nascido prontas para tudo.
O que não quer dizer que não se
atrasem.
Anteontem, em São Paulo, ela
demorou 40 minutos além do
previsto para iniciar seus encontros com a imprensa, no hotel que
recebe convidados da 29ª Mostra.
Victoria se arrumava no quarto.
Desceu num modelito metade
John Galliano metade superposição de saias compradas em Calcutá. "Mas, atenção, é seda pura."
Logo de cara alguém lhe pede
que cante, já que é um show de
bossa nova (hoje à noite) a principal atração que ela traz à Mostra.
A exibição de quatro filmes de sua
carreira ("Entre as Pernas", "Sem
Notícias de Deus", "Kika" e "O
Sétimo Dia") é bônus do pacote.
"Cantar aqui? Agora? Mas claro!" E emenda os mais conhecidos versos de "Sampa". Sem modéstia, mas simpaticamente, diz:
"Não falo português, mas canto
perfeitamente [no idioma]".
Soando consciente de que o domínio vocal não é seu principal
predicado, ela afirma que "as notas [musicais] são sete e não há
nenhuma falsa. As harmonias é
que podem errar".
Nada tímida e bastante espalhafatosa, Victoria acompanha suas
frases de onomatopéias e gestos.
A um fotógrafo que flagrou uma
careta sua, diz: "Quando eu fizer
burghburghburghg [sopra os lábios], não me fotografe ou tomo
seu crachá". Ele depois a surpreende num sorriso, e ela observa: "Você está melhorando".
Victoria diz que a bossa nova "é
a trilha sonora" de sua vida e a
música ideal para curar dores de
amor. Há 23 anos, ela trocou a Espanha pela França, levada por
uma paixão. "Menos mal que ele
era francês e de Paris. Já pensou se
fosse do Congo?"
Ao lembrar a única vez que esteve no Brasil antes, em 95, diz:
"Passei sete noites sem dormir na
cama. No Rio, acordava na praia,
com um copo na mão, vendo as
bundas mais bonitas do mundo".
Abaixo, ela fala à Folha.
Folha - Dez entre dez atrizes sonham filmar com o diretor Pedro
Almodóvar. A sra., que filmou com
ele, sonha com o que no cinema?
Victoria Abril - Com o próximo
trabalho. Sempre sonho com algo
concreto e real. Não faço castelos
no ar nem quero trabalhar com
Almodóvar se ele não quiser trabalhar comigo. É perda de tempo
trabalhar com quem não te quer.
Deve-se contentar com a normalidade e fazê-la maravilhosa.
Folha - Almodóvar é um mestre...
Abril - Fiz três filmes com ele. Tive minhas doses de Almodóvar.
Todo tipo de dose. A melhor foi
"De Salto Alto" [91]. "Ata-Me"
[90] foi a primeira vez, "Kika"
[93], a terceira. Cada uma foi um
momento, como numa história
de amor: começa, se desenvolve e
depois morremos ou nos separamos. Mas a vida continua, e cada
degrau nos leva a um lugar. Não
quero ficar parada em nenhum.
Folha - A sra. disse que seu início
no cinema foi tão fácil como andar
de bicicleta. Depois isso mudou?
Abril - Nunca tive dificuldade
para entender os papéis. Quando
tive, não os fiz. Não me meto no
que não sou capaz de compreender. Faço meu trabalho de atriz
como se fosse advogada. Defendi
cem mulheres, não obstante o que
tenham feito. Eu as defendi. Não
as julguei nem as critiquei.
Folha - Cite um personagem que
recusou por não compreendê-lo.
Abril - O de "Mulheres à Beira de
um Ataque de Nervos" [Almodóvar, 1998]. Não o papel de Carmem [Maura], o outro [de Rossy
de Palma]. Não queria fazê-lo. Pareceu-me uma bobagem. Disse
não, e ele [Almodóvar] depois escreveu para mim "Ata-Me".
Folha - Seu próximo filme será dirigido por Antonio Banderas, com
quem já contracenou. Imagina que
mudará sua relação com ele no set?
Abril - Ele é como meu irmão.
Meu irmão me pedirá que faça
coisas por ele, e eu farei. [O filme]
é a história de uma mulher madura que se envolve com um jovenzinho. Então, não há problema
[risos]. Não preciso estudar matemática para entender esse papel.
Folha - Chegar à maturidade no
cinema a assusta?
Abril - Mais do que assustar, me
fode. Aos 40, os bons papéis terminam. Sobram as amargas,
abandonadas pelo marido, ou as
más. Já fiz as amargas e as más.
Sobra "Conduzindo Miss Daisy".
Putcheros do Brasil
Show de bossa nova com Victoria Abril
Quando: hoje, às 21h, no Sesc Pinheiros
(r. Paes Leme, 195, Pinheiros, SP, tel. 0/
xx/11/3095-9400)
Quanto: de R$ 7,50 a R$ 15
Texto Anterior: Panorâmica - Dança: Corpo e Milton Nascimento são destaque no "NYT" Próximo Texto: Frase Índice
|