São Paulo, terça-feira, 28 de novembro de 2000

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Companhia mineira encena os dilemas da opção pelo trabalho de grupo
Galpão embarca teatro e cinema no mesmo trilho

Giovani Pereira/Folha Imagem
Atores do Galpão em cena de "Um Trem Chamado Desejo"



"Um Trem Chamado Desejo", musical do grupo de "Romeu e Julieta", estréia em Belo Horizonte


ISRAEL DO VALE
ENVIADO ESPECIAL A BELO HORIZONTE

Belo Horizonte, fim dos anos 20. A cidade em formação é habitada por uma gente que trocou a vida do interior pela perspectiva de renovação -geográfica, intelectual, financeira- oferecida pela nova capital, fundada havia apenas três décadas.
O sonho da metrópole contrasta com o ideário matuto, caseiro, mas não impede que o imaginário da intelectualidade local se alimente da vontade de saber o que há por trás da cadeia montanhosa que aprisiona a cidade. Pelo menos é o que querem acreditar os atores da Companhia Alcantil das Alterosas, espécie de alter ego do grupo Galpão em seu novo espetáculo, "Um Trem Chamado Desejo", que estréia na capital mineira hoje, para convidados -quinta, para o público.
Empenhados em manter-se como companhia estável, com um repertório de musicais, os integrantes da Alcantil das Alterosas fazem vistas grossas para a realidade e prosseguem firmes no projeto de reproduzir ali o êxito das grandes produções cariocas.
Não bastassem as limitações naturais do contexto, deparam-se com outro grande empecilho: a crescente investida do cinema como opção de entretenimento. Após sucessivos fracassos no palco, dobram-se às evidências e, sob influência do diretor espertalhão, procuram pôr a companhia nos trilhos pelo atalho da imagem em movimento.
Na nova montagem do grupo mineiro -que se celebrizou com a encenação de "Romeu e Julieta", recém-levada ao Globe Theatre, em Londres-, qualquer semelhança com a realidade não terá sido mera coincidência. Para além da paródia que o nome possa insinuar (com a carona no bonde do dramaturgo norte-americano Tennessee Williams), este "Trem" trafega por um jogo de espelhos, feito de oposições e imagens invertidas que recompõem, em registro de farsa, a trajetória do próprio grupo. A começar da busca de sobrevivência -exercício feito há 18 anos pelo Galpão.
Pela primeira vez sob direção de Chico Pelúcio, um dos atores de maior veia cômica na trupe, o grupo reúne nesta comédia musical (que já está confirmada para o Festival de Curitiba, em março de 2001) um enxame de cúmplices angariado aos picadinhos, esparsamente, em trabalhos anteriores.
Assim foi com Cacá Carvalho, diretor da montagem anterior, "Partido", em 99, e que agora faz ponta, como cartomante, no filme "Cenas de um Casamento", primeira incursão da companhia no universo do cine-teatro.
Luís Alberto de Abreu assina a dramaturgia, a exemplo do que fez no ano passado em "Caixa Postal 1.500", dirigida por Chico Pelúcio para o Oficinão do Galpão, projeto paralelo encenado no Cine Horto, centro cultural mantido pelo grupo. A trilha sonora tem assinatura do carioca Tim Rescala, compositor da opereta "O Homem Que Falava Português", montagem da Cia. Burlantins dirigida por Pelúcio em 1998.
Marcio Medina, responsável por cenografia e figurinos, retoma a parceria iniciada em "Partido" e faz profissão de fé no trabalho de grupo, como tem sido com a Cia. do Latão, de São Paulo, ou o Centro de Pesquisa Teatral do italiano Roberto Bacci, em Pontedera. "O desafio de produzir para uma companhia é maior; é outro nível de inquietação artística", diz.
Desta vez, o principal dilema de Medina foi dar mobilidade aos cenários, criando uma estrutura firme o bastante para sustentar o urdimento e, ao mesmo tempo, fácil de desmontar, "para poder mambembar por aí", como diz.
Grupo forjado no teatro de rua, o Galpão retoma a possibilidade de levar o espetáculo a espaços públicos, após o confinamento a espaços fechados exigido pela estrutura de "Partido". "Só precisa ser um lugar silencioso", diz Chico Pelúcio. A versão atual repete a intenção de expor ao público as vísceras da cenografia, explicitando o movimento das engrenagens -e deixando claro o jogo do teatro. Aqui, como no cotidiano do teatro, o improviso se mostra essencial à sobrevivência.


Peça: Um Trem Chamado Desejo Dramaturgia: Luís Alberto de Abreu Direção: Chico Pelúcio Com: grupo Galpão Quando: de qui. a sáb, às 21h; dom., às 19h. Até 17/12 Onde: Galpão Cine Horto (r. Pitangui, 3.613, tel. 0/xx/31/3481-5580, BH, MG)
Quanto: R$ 20 e R$ 10 (estudantes) Patrocínio: Telemig Celular e Petrobras


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