São Paulo, segunda-feira, 29 de janeiro de 2007

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crítica/livros/ficção

Palahniuk soa repetitivo e monocórdio

JOCA REINERS TERRON
ESPECIAL PARA A FOLHA

Q uem tem medo de Chuck Palahniuk? Ninguém, aparentemente, se forem considerados os efeitos colaterais da leitura de "Diário", seu sexto romance lançado por aqui. De crítico contumaz da sociedade de consumo e do "american way of life", Palahniuk soa cada vez mais repetitivo e monocórdio e, ao menos neste livro, esvaziado de sua melhor qualidade, o humor negríssimo e corrosivo.
Sobram os recursos estilísticos usados e abusados por Chuck, o lobo mau: "chocantes" descrições anatômicas, uma incessante repetição de informações (chamada de "coros") que apenas cansam o leitor, e a presença na trama de uma sociedade secreta de subversivos (assim como em "Clube da Luta" e "No Sufoco").
Em substituição aos executivos entediados que se reúnem para quebrar a cara uns dos outros ou à terrorista de meia-idade acompanhada de seu filho dos livros anteriores, temos uma corja de velhinhos ecologistas radicais dispostos a tudo para preservar seu modo de vida e o seu habitat (a ilha de Waytansea -trocadilho intraduzível para "espere e veja"-, habitada por tradicionais famílias de pioneiros). Mas para chegar a essa parte da história, o leitor antes terá de superar os dribles narrativos impostos pelo autor, que progressivamente sonega informações básicas sobre os personagens, obrigando-nos a trabalhar duro na busca de algum entendimento.
O que (em tese) poderia induzir à leitura, naufraga na falta de clareza, chafurdando na presunção de Palahniuk. O resultado é um sub-Stephen King com pinceladas de crítica social e política. Coisa para fazer mingau de criancinhas.
Misty Marie se casa com Peter Wilmot, um filho de família tradicional, e com ele vai viver em Waytansea Island. No início da história Peter está num hospital, em coma, e é torturado pela rancorosa Misty que, entre outras carícias, gosta de perfurá-lo com um alfinete enferrujado. O título do livro se refere ao "diário" que a esposa faria do coma do marido, suicida falhado que a deixou com uma filha para criar, além da sogra esnobe para aturar. Aos poucos se descobre que Grace Wilmot é a líder da comunidade que enreda Misty Marie numa trama à la "O Bebê de Rosemary". Demasiado previsível, apesar da confusão da estrutura narrativa. Soninho.
Na turnê americana do lançamento do livro, entre 2003 e 2004, o célebre desejo de chocar de Palahniuk propiciou ao público alguns momentos de diversão. Numa espécie de "flash-mob" (aquelas performances-relâmpagos organizadas por meio da internet) literário, assim que o escritor lia "Guts" (um conto sobre masturbação repleto de descrições "repulsivas") pessoas da platéia desmaiavam em conjunto.
No início ele ficou chateado, mas depois gostou, assumindo os desmaios como verdadeiros. Quem tem medo de Chuck Palahniuk? Ah, ninguém.


JOCA REINERS TERRON é escritor, autor de "Sonho Interrompido por Guilhotina" (Casa da Palavra).

DIÁRIO   
Autor:
Chuck Palahniuk
Tradução: Ryta Vinagre
Editora: Rocco
Quanto: R$ 34 (240 págs.)


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