São Paulo, domingo, 29 de março de 2009

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Garota é vista como "Picasso do grafite"

A inglesa Solveig Barlow, 11, ficou famosa com os desenhos coloridos que faz nos muros de Brighton, Londres e Berlim

Ela também foi comparada pela mídia britânica a Banksy, artista anônimo cujas obras chegam a ser vendidas por US$ 1 milhão


FERNANDA MENA
COLABORAÇÃO PARA A FOLHA, EM BRIGHTON

Metida num uniforme escolar britânico, de camisa branca, saia nos joelhos e meias três quartos, Solveig Barlow, 11, não levanta suspeitas sobre aquilo que costuma fazer. Um olhar mais atento dá uma pista: nas mãos, além das unhas pintadas cada uma de uma cor, há centenas de pontinhos de tinta branca, azul, preta e amarela.
É que ela adora decorar seus cadernos com flores, corações e bichos. Mas, diferentemente das coleguinhas, fora da escola ela troca margaridas por caveiras, lápis por spray e o papel pelos muros de Brighton, cidade do sul da Inglaterra, onde vive.
"Algumas vezes, desenho antes um esboço daquilo que quero grafitar. Outras vezes vou direto pro spray, tipo "free-style'", explica. "Na verdade acho mais fácil desenhar no muro. Com spray, se você errar é só pintar por cima."
Os desenhos multicoloridos e de traço bem marcado de Solveig chamaram a atenção de artistas locais, viraram mania entre grafiteiros e foram parar em revistas e tablóides do Reino Unido. Ela agora é chamada de "o jovem Picasso da arte de rua" e de "mini Banksy", em referência ao artista anônimo cujos trabalhos são vendidos a cifras que beiram US$ 1 milhão.
Para ela, no entanto, as comparações superlativas fazem pouco sentido. Quem é Picasso mesmo? "Ele era um artista muito famoso que fazia pessoas com cara de triângulo. Só que não tem muito a ver com meus desenhos", avalia. Mas ser comparada ao artista de rua de maior sucesso no mundo deve ser um elogio e tanto, certo? A menina torce o nariz. "O que Banksy faz não é nem grafite, se você quer saber!", desdenha.
É que a técnica utilizada por ele para criar imagens políticas ou apenas irreverentes é o stencil: um molde em negativo que permite a impressão da mesma imagem várias vezes, em diversas superfícies, com spray ou tinta. Solveig desenha de próprio punho. "Pra mim, o que ele faz é trapaça", provoca.

"Foi um choque"
Solveig -que significa "raio de sol" em norueguês- pegou numa lata de spray pela primeira vez aos oito anos de idade. Depois de alguns anos acompanhando seu pai em intermináveis sessões de grafite por Brighton, Solveig resolveu se divertir também. "Era bem chato ficar lá sentada, só olhando. Aí pedi pra experimentar também. E adorei", conta.
"Eu era um pouco resistente à ideia de Solveig fazer grafites. Mas ela foi muito incisiva no pedido. Quando vi o desenho, foi um choque. Não é porque sou pai dela, mas, francamente, era muito bom para alguém que nunca tinha feito aquilo", lembra Paul Barlow, 38, pai dela. Ele costumava fazer letras desenhadas, sem representações. Comparar a produção do pai com a da filha virou covardia.
De lá pra cá, Solveig grafitou em Brighton, Londres e no muro de Berlim. "Desenhar num muro em que pessoas eram mortas por tentar pular para o outro lado é estranho", escreveu on-line (www.flickr.com/supersolveig).
No ano passado, ela fez sua primeira tatuagem: estampou a cabeça de um lobo na perna de um amigo do pai em que quase não havia espaço. "A perna dele parecia mais um muro de tanto desenho. E tive muito medo de errar. Tatuagem não é spray, né?", diverte-se.
Nas horas vagas, Solveig gosta de conversar com amigos no computador e de brincar com a coleção de Barbies, que agora começa a renegar. "Bonecas são legais, mas acho que enjoei. Quero vender minha coleção."

Praia e Sol
Há dois anos, Solveig esteve com a família de férias em Natal. "Com aquelas praias, não pensei muito em grafite quando estava lá. Mas um dia, quero grafitar um muro no Rio!"
Em seus desenhos, Solveig nunca deixa de fora seu apelido, Sol, e sua idade à época. "O que mais gosto de desenhar hoje são esqueletos, zumbis e animais de muitas cores", conta. "Acho que o grafite sempre deixa a cidade mais bonita. Mas, quando alguém faz um grafite num muro em que não pode fazer, fica feio", acredita.
No Reino Unido, existem zonas livres, em que é permitido grafitar à vontade. Em muros privados, no entanto, é proibido. Solveig segue a regra, e balança a cabeça em aprovação à repressão contra os pichadores da Bienal. "Ficaria muito brava se alguém grafitasse no muro da minha casa sem eu deixar. Grafite só é bonito onde ele é bem-vindo", avalia, numa lógica infantil que pouco reflete a alma subversiva da arte de rua.
Ainda é muito cedo para Solveig decidir se quer seguir grafitando muros quando for mais velha. "Quero fazer arte. Mas acho que vai ser mais na área de arquitetura, algo assim. Quero fazer uma casa diferente, tipo uma casa em formato de triângulo. Aí, sim, vai ser algo parecido com Picasso."


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