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Garota é vista como "Picasso do grafite"
A inglesa Solveig Barlow, 11, ficou famosa com os desenhos coloridos que faz nos muros de Brighton, Londres e Berlim
Ela também foi comparada pela mídia britânica a Banksy, artista anônimo cujas obras chegam a ser vendidas por US$ 1 milhão
FERNANDA MENA
COLABORAÇÃO PARA A FOLHA, EM BRIGHTON
Metida num uniforme escolar britânico, de camisa branca,
saia nos joelhos e meias três
quartos, Solveig Barlow, 11, não
levanta suspeitas sobre aquilo
que costuma fazer. Um olhar
mais atento dá uma pista: nas
mãos, além das unhas pintadas
cada uma de uma cor, há centenas de pontinhos de tinta branca, azul, preta e amarela.
É que ela adora decorar seus
cadernos com flores, corações e
bichos. Mas, diferentemente
das coleguinhas, fora da escola
ela troca margaridas por caveiras, lápis por spray e o papel pelos muros de Brighton, cidade
do sul da Inglaterra, onde vive.
"Algumas vezes, desenho antes um esboço daquilo que quero grafitar. Outras vezes vou direto pro spray, tipo "free-style'", explica. "Na verdade
acho mais fácil desenhar no
muro. Com spray, se você errar
é só pintar por cima."
Os desenhos multicoloridos
e de traço bem marcado de Solveig chamaram a atenção de artistas locais, viraram mania entre grafiteiros e foram parar em
revistas e tablóides do Reino
Unido. Ela agora é chamada de
"o jovem Picasso da arte de
rua" e de "mini Banksy", em referência ao artista anônimo cujos trabalhos são vendidos a cifras que beiram US$ 1 milhão.
Para ela, no entanto, as comparações superlativas fazem
pouco sentido. Quem é Picasso
mesmo? "Ele era um artista
muito famoso que fazia pessoas
com cara de triângulo. Só que
não tem muito a ver com meus
desenhos", avalia. Mas ser
comparada ao artista de rua de
maior sucesso no mundo deve
ser um elogio e tanto, certo? A
menina torce o nariz. "O que
Banksy faz não é nem grafite, se
você quer saber!", desdenha.
É que a técnica utilizada por
ele para criar imagens políticas
ou apenas irreverentes é o stencil: um molde em negativo que
permite a impressão da mesma
imagem várias vezes, em diversas superfícies, com spray ou
tinta. Solveig desenha de próprio punho. "Pra mim, o que ele
faz é trapaça", provoca.
"Foi um choque"
Solveig -que significa "raio
de sol" em norueguês- pegou
numa lata de spray pela primeira vez aos oito anos de idade.
Depois de alguns anos acompanhando seu pai em intermináveis sessões de grafite por
Brighton, Solveig resolveu se
divertir também. "Era bem
chato ficar lá sentada, só olhando. Aí pedi pra experimentar
também. E adorei", conta.
"Eu era um pouco resistente
à ideia de Solveig fazer grafites.
Mas ela foi muito incisiva no
pedido. Quando vi o desenho,
foi um choque. Não é porque
sou pai dela, mas, francamente,
era muito bom para alguém que
nunca tinha feito aquilo", lembra Paul Barlow, 38, pai dela.
Ele costumava fazer letras desenhadas, sem representações.
Comparar a produção do pai
com a da filha virou covardia.
De lá pra cá, Solveig grafitou
em Brighton, Londres e no muro de Berlim. "Desenhar num
muro em que pessoas eram
mortas por tentar pular para o
outro lado é estranho", escreveu on-line (www.flickr.com/supersolveig).
No ano passado, ela fez sua
primeira tatuagem: estampou a
cabeça de um lobo na perna de
um amigo do pai em que quase
não havia espaço. "A perna dele
parecia mais um muro de tanto
desenho. E tive muito medo de
errar. Tatuagem não é spray,
né?", diverte-se.
Nas horas vagas, Solveig gosta de conversar com amigos no
computador e de brincar com a
coleção de Barbies, que agora
começa a renegar. "Bonecas
são legais, mas acho que enjoei.
Quero vender minha coleção."
Praia e Sol
Há dois anos, Solveig esteve
com a família de férias em Natal. "Com aquelas praias, não
pensei muito em grafite quando estava lá. Mas um dia, quero
grafitar um muro no Rio!"
Em seus desenhos, Solveig
nunca deixa de fora seu apelido,
Sol, e sua idade à época. "O que
mais gosto de desenhar hoje
são esqueletos, zumbis e animais de muitas cores", conta.
"Acho que o grafite sempre deixa a cidade mais bonita. Mas,
quando alguém faz um grafite
num muro em que não pode fazer, fica feio", acredita.
No Reino Unido, existem zonas livres, em que é permitido
grafitar à vontade. Em muros
privados, no entanto, é proibido. Solveig segue a regra, e balança a cabeça em aprovação à
repressão contra os pichadores
da Bienal. "Ficaria muito brava
se alguém grafitasse no muro
da minha casa sem eu deixar.
Grafite só é bonito onde ele é
bem-vindo", avalia, numa lógica infantil que pouco reflete a
alma subversiva da arte de rua.
Ainda é muito cedo para Solveig decidir se quer seguir grafitando muros quando for mais
velha. "Quero fazer arte. Mas
acho que vai ser mais na área de
arquitetura, algo assim. Quero
fazer uma casa diferente, tipo
uma casa em formato de triângulo. Aí, sim, vai ser algo parecido com Picasso."
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