São Paulo, Sábado, 29 de Maio de 1999
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WORLD MUSIC
A artista israelense Dana International participa hoje do Eurovision
Transformista representa Israel em concurso musical

Reprodução
O transexual Dana International, cantora de música pop israelense


MARCELO STAROBINAS
especial para a Folha

Yaron Cohen era apenas um jovem de trejeitos afeminados de Tel Aviv, que sonhava em ser artista e seguir a trilha de Ofra Haza, cantora consagrada em Israel nos anos 70 e 80. Em 1993, uma operação de mudança de sexo e um "milagre" da indústria de cosméticos transformaram o garoto judeu de origem iemenita em Dana International, a maior estrela da música pop israelense na atualidade.
Dana, 27, se tornou internacional ao vencer, no ano passado, o concurso Eurovision. Suas canções, fusão de tecno e dance music, sincretizam o caldo cultural judaico-árabe-ocidental que norteia o mundo artístico em Israel.
A vitória de um transexual como representante do país no exterior causou furor nos meios judaicos ultra-ortodoxos israelenses. O vice-ministro da Saúde, rabino Shlomo Ben-Izri, do partido religioso Shas, encontrou um paralelo bíblico para condenar Dana: "Nem em Sodoma havia algo assim".
"Como filho do povo judeu, isso me ofende. A escolha de Dana para representar o país foi uma desgraça. Dana é uma abominação."
Criticado pelo lobby ultra-ortodoxo, o primeiro-ministro Binyamin Netanyahu a recebeu como "heroína", em seu retorno ao país, na sede do governo.
Detentor do título do concurso musical europeu, Israel se qualificou a ser a sede da próxima disputa, que acontece hoje. A idéia de ver Dana passando a coroa ao seu sucessor, com os muros sagrados da cidade velha de Jerusalém ao fundo, vem causando calafrios.
Dana já sofreu tentativa de agressão durante um show em Jerusalém. Símbolo da cena gay clubber de Tel Aviv -cidade habitada majoritariamente por laicos-, a luta contra a influência política dos religiosos é uma de suas bandeiras.
"Os reais inimigos de Israel são os ultra-ortodoxos, não os palestinos", declarou ao jornal alemão "Suddeutsche Zeitung".
Leia a seguir trechos da entrevista por fax que Dana International concedeu à Folha.

Folha - Você tem canções em hebraico e em árabe. Aproximar árabes e judeus é uma de suas tarefas como estrela da música pop?
Dana International -
Não, não faz parte do meu trabalho. É minha obrigação como cidadã israelense, como uma pessoa que vive no Oriente Médio. Devo fazer o máximo que puder para ajudar as pessoas a aprender a viver em paz.
Folha - Você mantém as tradições judaicas no seu dia-a-dia?
Dana -
Respeito e tento manter as tradições da melhor forma, inclusive jejuando durante o Yom Kippur (dia do Perdão).
Folha - Há muito preconceito contra homossexuais em seu país?
Dana -
Após ter viajado pelo mundo, posso dizer que as pessoas em Israel têm mentes abertas em comparação a outros países. A situação dos gays aqui não é diferente dos outros lugares. Acho que os fanáticos religiosos e homofóbicos são iguais em todas as partes.
Folha - Você já foi ameaçada por extremistas árabes ou judeus?
Dana -
Já fui ameaçada aqui em Israel e no exterior. Não gosto de falar sobre essas experiências. Você pode imaginar como me senti.
Folha - A comunidade ultra-ortodoxa tentou, mas não conseguiu impedir a realização do concurso Eurovision em Jerusalém este ano. O evento terá alguma simbologia por causa dessa disputa?
Dana -
As divergências sobre religião não serão resolvidas a não ser que os dois lados entendam que se trata de uma situação de viva e deixe viver. Só com o diálogo conseguiremos solucionar essa disputa. O Eurovision é uma oportunidade para Israel promover o turismo em comemoração do ano 2000.


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