São Paulo, Sábado, 29 de Maio de 1999
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LIVRO - LANÇAMENTOS
Ike Turner responde a Tina com autobiografia

Associated Press
O guitarrista Ike Turner, 68, que tem a sua autobiografia, "Taking Back My Name", lançada na Inglaterra


PAULO VIEIRA
especial para a Folha, em Londres

O valor literário é nenhum, mas não é isso o que se procura em biografias de artistas de rock'n'roll. Rock'n'roll não parece o gênero musical apropriado para Ike Turner, o ex-marido de Tina, para sempre seu algoz doméstico, mas é exatamente com o que Little Richard, na apresentação, o associa.
Com a anuência do próprio autor páginas mais tarde, Ike Turner começa "Taking Back My Name" (algo como "Limpando Meu Nome"), como o pai do gênero, tendo se antecipado a Bill Halley com "Rocket 88". "Rocket" é apontada por "especialistas" como a primeira gravação de rock'n'roll, em 1951.
Mais do que pioneirismo, o que esse evento prenuncia é uma série de incidentes, que acompanharão Ike por toda sua biografia, transformando-o num anjo torto.
"Taking Back" é claramente uma resposta à biografia "I, Tina", de Tina Turner, e principalmente à cinebiografia "What's Love Got to Do with It?", em que é apresentado como um mulherengo, estuprador e alguém que batia muito em Tina.
Ele não nega que goste de mulheres e efetivamente se exibe priápico no livro. Vai enfileirando detalhes de suas cópulas, desde a primeira, aos 6 anos, mais tarde a primeira com uma branca, até o dia que dormiu com Tina. "Quando acordei na manhã seguinte, Tina ainda estava na cama comigo. Senti-me embaraçado e envergonhado. Foi como se tivesse transado com minha irmã."
Mas Ike nega que batesse sistematicamente em Tina, exceto por uns "tapas" e alguns "socos" impensados. Rebate com a importância de ter alertado Tina para a "covardia" que eram suas tentativas de suicídio.
Nascido no Mississippi, Ike, aos 5, perdeu o pai, que não resistiu aos ferimentos de uma surra que levou de um grupo de brancos. Depois de passar fome etc., veio a fama de arruaceiro. Em seus shows, mantinha um ferro na cintura.
Ike tenta fazer força para passar uma imagem "ainda gosto dessa neguinha", dedicando o livro a Tina e selecionando uma foto dos dois, "good times", para a capa. Mas, em dado momento, escorrega: diz não falar com Tina desde 86, quando pensou num musical-reconciliação para os dois. Mais algumas páginas e acusa a ex-mulher de "não gostar mais de negros", pois desde então nunca mais teve um único em sua banda.
Mas Ike também não é autocondescendente. Dá detalhes de como se tornou viciado em cocaína, substância sobre a qual não tinha qualquer "informação" e o ajudava a passar madrugadas compondo, e fala de suas passagens pela prisão. Relembra os tempos em que construiu e manteve um luxuoso estúdio, com um aposento ornado com uma banheira onde costumava "relaxar".
Provavelmente por contar com o auxílio de um biógrafo profissional, Ike decidiu incluir histórias e "pensamentos" que farão a festa dos fanzines. Diz como dispensou Jimi Hendrix, de sua surpresa ao ver um branco -Eric Clapton- tocar blues ("Eu o vi fazer a guitarra chorar, cara") e da sua total incompreensão por chamarem Bruce Springsteen de "chefe".
Ike esteve em Oxford Circus, centro de Londres, para autografar seu livro. Na fila, os fãs pediam que assinasse capas de velhos discos, em que aparecia com Tina. O mito não se fez de rogado.


Avaliação:


Livro: Taking Back My Name
Autor: Ike Turner (com Nigel Cawthorne)
Lançamento: Virgin (0044 171 386-3300)
Quanto: US$ 30 (em média)



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