São Paulo, sexta-feira, 29 de junho de 2001

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

CRÍTICA

Ludismo encontra violência

TIAGO MATA MACHADO
CRÍTICO DA FOLHA

Em seus melhores momentos, os filmes de Takeshi Kitano abrem uma linha de fuga, deixando de lado a violência para contemplar, num espaço idílico, um instante de ludismo. Brincando, ele pode enfim fazer de seus filmes a celebração de um encontro.
Em "Brother", o momento lúdico surge para consolidar um encontro nipo-afro-americano. Tornado persona non grata na fraternidade mafiosa a que pertence (a Yakuza japonesa), "Beat" Takeshi foge de Tóquio para Los Angeles, onde mora seu irmão mais novo, um pequeno traficante. Ensinando aos novos amigos as "boas maneiras" da máfia japonesa, ganham território e fortuna.
O mote reside no fato de que a confraternização deve prevalecer até sobre as relações consanguíneas: o "brother" do título não se refere ao irmão mais novo que "Beat" reencontra, mas ao novo amigo que ele faz na América. Tal como seus mafiosos, Kitano parece querer flertar aqui com o mercado americano. Pena que um namoro assim só possa ser consumado em sangue e violência.
O grupo logo deixa as brincadeiras de lado para voltar a uma nova carga de violência. Kitano talvez veja algo de lúdico na sua maneira de encenar a violência. Nesse sentido, ele é mais bem-sucedido como ator: alternando momentos vegetativos de acumulação impassível com momentos de explosão animal, não deixa de ser uma inusitada variação (na linha de Robert de Niro, inclusive pelos tiques nervosos) do estilo de "violência contida".
Como cineasta, Kitano esteve sempre ameaçado (inclusive por seu inerente mau gosto) de ver sua arte de reciclador confundida com a produção de telefilmes policiais (baratos) que lhe servia de manancial. Mas a tendência do cineasta a substituir o movimento pela postura, a motivação pelo niilismo parecia garantir uma certa aura minimalista que os distinguia do lixo cultural.
Em Los Angeles, nicho dos telefilmes policiais, Kitano afoga-se nesse manancial, igualando-se, em violência e despropósito, ao pior da produção americana. Reverente, parece pretender legitimar, junto aos donos da patente dos filmes de gângsteres, o subgênero que criou pela reciclagem: o dos filmes da Yakuza.


Brother
Brother
 
Direção: Takeshi Kitano Produção: Japão/Inglaterra, 2000 Com: "Beat" Takeshi, Omar Epps Quando: a partir de hoje nos cines Lumière, Iguatemi, Tamboré e circuito




Texto Anterior: Cinema/Estréia: Takeshi Kitano de caso com a máfia
Próximo Texto: Frases
Índice


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.