São Paulo, terça-feira, 29 de agosto de 2000


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LIVRO/LANÇAMENTO
"Catástrofe e Representação" não é um livro de respostas

NELSON ASCHER
DA EQUIPE DE ARTICULISTAS

O volume organizado por Arthur Nestrovski e Márcio Seligmann-Silva dificilmente poderia ser mais fiel ao próprio título. A maioria dos dez ensaios que, com dois breves contos escritos por Bernardo Carvalho e Modesto Carone (leia íntegra abaixo), compõem "Catástrofe e Representação" foi originalmente apresentada em dois ciclos de palestras na PUC-SP, enquanto os três restantes são traduzidos do inglês. E, apesar dos diferentes pontos de partida de cada autor, de seus interesses diversos, dos distintos materiais com os quais cada qual lida, os textos convergem sobre a questão central.
É importante frisar que este não é um livro de respostas. Ele constitui, isto sim, parte integrante de um movimento mais geral cujo esforço poderia ser resumido na tentativa de formular as perguntas. A respeito do quê? Bom, a catástrofe do título não é uma abstração, mas sim, sobretudo (se bem que não só), um evento histórico específico, aquilo que o grande historiador Raul Hilberg chamou de "a destruição dos judeus europeus", ou seja, o acontecimento que leva os nomes: "holocausto", "shoah", "khurbn". A indagação acerca da possibilidade de representar um evento assim é algo que começa pondo em questão os alicerces mesmos, seja das artes, seja da cultura de massas, para, afinal, transformar-se numa grande pergunta a propósito dos limites da linguagem, do pensamento e da imaginação.
A importância da presente coletânea é, porém, maior que a da soma dos textos nela reunidos. Durante pelo menos duas décadas depois do fim da Segunda Guerra, a discussão sobre o genocídio dos judeus europeus perpetrado pelos alemães (com o auxílio ou conivência de parcelas significativas da população do continente) manteve-se confinada a círculos restritos de especialistas e/ou de sobreviventes. Quem quer que consultasse a historiografia dessa época, a literatura escrita ou os filmes produzidos então, se obtivesse alguma informação relativa ao Holocausto, concluiria que este não passava de um detalhe não muito relevante no âmbito de acontecimentos infinitamente mais significativos.
Não é o caso de esmiuçar agora o porquê disso, mas, desde o começo dos anos 60, e com intensidade aceleradamente crescente nos últimos 20 anos, os eventos transcorridos na Europa da primeira metade dos anos 40 vêm sendo considerados absolutamente centrais para a compreensão da história contemporânea. Ainda assim, um assunto que tem sido exaustivamente discutido por pessoas ligadas às mais variadas áreas do conhecimento, tanto na Europa quanto nos Estados Unidos, continua ocupando uma parcela reduzidíssima do interesse da intelectualidade brasileira. "Catástrofe e Representação", embora longe de recobrir todas as ramificações do tema, é um esforço notável no sentido de criar uma sintonia maior entre a produção teórica brasileira e as discussões internacionais.


Catástrofe e Representação      Organização: Arthur Nestrovski e Márcio Seligmann-Silva Editora: Escuta Quanto: R$ 30 (264 págs.)



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