São Paulo, domingo, 29 de agosto de 2004

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Vídeos (i)legais

Emissoras usam brecha na lei para exibir conteúdo audiovisual da internet sem pagar direitos

DIEGO ASSIS
DA REPORTAGEM LOCAL

DANIEL CASTRO
COLUNISTA DA FOLHA

Levante a mão quem nunca recebeu e assistiu a um vídeo pela internet! Batata. Apesar de estar possivelmente infringindo certos direitos de terceiros, sempre é possível alegar que o uso é pessoal. Mas daí a escancarar sua caixa postal em rede nacional de televisão há uma grande diferença.
É justamente isso que vêm fazendo algumas emissoras de TV brasileiras. Interpretando que tudo o que está na rede é de domínio público, programas como o "Domingo Legal", do SBT, o "Late Show", da Rede TV!, e o "A Noite É uma Criança", da Band, têm explorado os vídeos capturados da internet como atrações que ajudem a alavancar sua audiência.
Há seis semanas no ar, o quadro "Rola na Rede", de Gugu Liberato, alcançou picos de 24 pontos no último domingo, deixando-o na liderança do Ibope durante 12 minutos (cada ponto na Grande SP equivale a 49,5 mil domicílios).
Fornecidos pelo site Vídeos Legais (www.videoslegais.com.br) e divulgados como "os flagras, as cenas engraçadas e as "figuras" surpreendentes da internet", os vídeos, muitas vezes semelhantes às tradicionais videocassetadas, são obtidos em listas de e-mails e outros sites na rede, de graça.
Grande parte dos vídeos exibidos no quadro, no entanto, são originários de campanhas publicitárias de teor cômico, exibidas em canais de televisão de diversos países do mundo. Propagandas brasileiras não são exibidas.
Mesmo no caso de publicidade, a lei brasileira protege criadores e seus respectivos conteúdos audiovisuais de maneira igual. "Toda obra audiovisual é protegida pelo direito de autor. Se contiver interpretações de artistas e trilhas sonoras, a utilização desse conteúdo dependerá da autorização dos titulares dos direitos conexos e autores das músicas", esclarece o advogado Marcos Bitelli. E completa: "O Brasil confere aos estrangeiros a mesma proteção dada aos brasileiros. Mesmo nos conteúdos estrangeiros, as autorizações são necessárias".
Procurada pela Folha, a assessoria de imprensa do SBT disse que a responsabilidade pelas imagens é de Ermelino Robson Lima Ramos, proprietário do site, que recebe um cachê de R$ 300 por semana (mais passagens aéreas) para apresentá-las no programa.
"Esse tipo de vídeo circula livremente pela internet nas listas de e-mails e estão postados em sites de todo o mundo e, por isso, são tidos como de "domínio público'", declarou Ramos por e-mail. "Em relação à exibição desses vídeos no SBT, as perguntas deveriam ser respondidas pela equipe do "Domingo Legal'", completou.
Já explorado, ainda que em menor grau, por outros programas, como o "Programa do Jô", na Globo, e o "Repórter Cidadão", na Rede TV!, o uso de vídeos retirados da internet sem autorização dos autores pode ser enquadrado em uma brecha legal sob a alegação de "fair use" (uso justo), quer permite "a citação em (...) qualquer (...) meio de comunicação de passagens de qualquer obra para fins de estudo, crítica ou polêmica, indicando-se o nome do autor e a origem da obra".
"Essa tem sido uma saída legal e legítima para utilização eventual de obras audiovisuais de terceiros, sem que se tenha que obter licença prévia", afirma Bitelli, especialista em direitos autorais.
Para Mel Giniger, da companhia inglesa Iskra Television, que tem entre seus clientes Globo e SBT, a facilidade de acesso a vídeos caseiros na internet ainda não teve reflexo na venda de seus produtos. Só a Globo gasta de US$ 1 milhão a US$ 2 milhões ao ano na compra de videocassetadas.
"Não fazemos auditoria. Acreditamos lidar com pessoas honradas", diz Giniger. "Mas, se há emissoras baixando nossos vídeos pela internet e os transmitindo pela TV, isso é ilegal."


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