São Paulo, sexta-feira, 29 de setembro de 2000

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Latinidade prepara reação em encontro no México

A REAÇÃO DA LATINIDADE
Fórum Ibéria e América Latina, em novembro, terá García Márquez, Carlos Fuentes e outros
Encontro quer criar "conteúdos genuínos"

Reuters
O escritor Carlos Fuentes, um dos idealizadores do 1º Fórum Ibéria e América Latina, que acontece em novembro, no México


CYNARA MENEZES
ESPECIAL PARA A FOLHA

As cabeças pensantes ibero-americanas preparam uma reação ao domínio dos produtos culturais do "império" norte-americano: um fórum inédito reunindo intelectuais, megaempresários e políticos acontece na Cidade do México com a intenção de fortalecer os conteúdos próprios, na indústria do entretenimento e na Internet, da chamada "latinidade".
O 1º Fórum Ibéria e América Latina, com abertura prevista para o dia 29 de novembro, foi convocado por um dos maiores escritores hispano-americanos em atividade, o mexicano Carlos Fuentes, em colaboração com o empresário argentino do ramo financeiro Ricardo Esteves, do grupo Velox, e deve acontecer anualmente em uma das capitais dos países que compõem o grupo.

Personalidades
Para este primeiro encontro, já confirmaram presença (veja lista completa no quadro ao lado) alguns nomes estelares, como o escritor Gabriel García Márquez, Prêmio Nobel de Literatura (1982), que fará uma de suas raras aparições públicas desde que recebeu o diagnóstico de câncer no sistema linfático, no ano passado.
Entre os políticos -escolhidos entre os que se encaixam no conceito de "gente de Estado" ou "estadistas"-, o ex-premiê Felipe González (Espanha) e o ex-presidente Julio María Sanguinetti (Uruguai).
Como o fórum coincide com a posse do novo presidente do México, Vicente Fox, também ele estará presente, ao lado do atual chefe de Estado do país, Ernesto Zedillo.
No grupo dos empresários, que abrange principalmente as finanças e as comunicações, o destaque é o mexicano Carlos Slim, presidente da Telmex (Teléfonos de Mexico) e considerado pela revista "Forbes" um dos cem homens mais ricos do mundo.
"O tema central do fórum é a defesa e criação de conteúdos genuínos da civilização ibero-americana, para que não nos transformemos, no ano 2010 ou 2020, em países legendados", informou Ricardo Esteves à Folha, por telefone, de Buenos Aires.
"Ou seja, para que, quando formos ligar a televisão, por exemplo, tudo o que se pense ou que se diga não seja criado pela CNN ou por Hollywood e seja legendado em português ou espanhol", explica Esteves.

Sem ideologia
Os organizadores descartam qualquer aspecto ideológico na iniciativa.
"A ideologia é zero neste encontro", diz Esteves. "Felipe González tem origem socialista, mas é um dirigente moderno e um estadista indiscutível, e Sanguinetti é um ex-presidente de direita. O que vai estar em discussão são os interesses culturais de nossas sociedades."
O tripé empresários-gente de Estado-intelectuais foi escolhido por razões específicas: os primeiros entram com a experiência prática sobre o que se pode conseguir a partir da iniciativa privada; os políticos, com o conhecimento do alcance das ações governamentais; e os intelectuais entram com as idéias.
"O mais importante é definir a importância da matéria para nossos países e para nosso futuro. Não é fácil, mas devemos tentar ou estamos fritos. O mundo do futuro é um mundo de conteúdos, e o gerador de conteúdos será o dono da bola, o que diz a que hora se joga", diz Esteves.
Como fazer isso objetivamente é o que o fórum mexicano pretende discutir.
O escritor Carlos Fuentes reconhece a dificuldade de, a partir de uma reunião, tentar mudar a mentalidade dos consumidores de produtos culturais nestes países.
"Não sou profeta, não sei se isso irá funcionar", disse o escritor, também por telefone, de Barcelona, na Espanha. "Nós vamos experimentar. Pode ser que funcione ou não, mas é a primeira vez que se reúnem personalidades do ramo empresarial, da política e da cultura da Ibero-América para pensar sobre a geração de conteúdos em nossos países, e isso é muito interessante."
Para Fuentes, o grupo que irá se encontrar no México, inclusive os empresários, tem "uma qualidade representativa muito alta" e pode dar uma direção a essa idéia da criação de conteúdos próprios em produtos culturais que possam "competir mundialmente" com o que é feito nos Estados Unidos, atual "dono da bola" no tema.
Um dos empresários brasileiros presentes, Roberto Teixeira da Costa, vice-presidente do conselho do banco Sul-América, também chama a atenção para a integração do país aos vizinhos, depois de tanto tempo afastado devido sobretudo à economia fechada que veio com os governos militares.
"Para os empresários, um fórum que privilegia os laços culturais e humanistas é importante ainda porque os faz tomar consciência, se solidarizar com esse processo", diz.
A programação do fórum e a lista completa de participantes só estarão definidas dentro de um mês, mas estão planejadas conferências -a de abertura será feita por Felipe González- e debates, além de um jantar com o presidente Zedillo, que deixa o poder. No final, deverá ser elaborado um documento com as principais idéias surgidas no encontro.


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