São Paulo, quinta-feira, 29 de setembro de 2011

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice | Comunicar Erros

CRÍTICA DRAMA

Peça fica aquém da densidade poética de Lúcio Cardoso

CRÍTICO DA FOLHA

O teatro devendo à literatura. "Crônica da Casa Assassinada", espetáculo dirigido por Gabriel Villela a partir do romance de Lúcio Cardoso (1912-1968), não se mostra à altura da obra-prima do escritor mineiro.
A adaptação de Dib Carneiro Neto sintetiza o livro de forma aberta, evitando artifícios dramáticos.
Respeita a sua estrutura sem ordenação cronológica, tecida à base de cartas, diários e confissões dos atormentados personagens do clã Meneses e dos que orbitam em seu entorno, numa cidade do interior de Minas.
O encenador conta assim, apenas, com vozes isoladas, além de recursos como um coro que organiza os relatos, para contar principalmente a história da personagem Nina, carioca que veio morar com um dos três irmãos no decaído casarão da família, e de seu amor incestuoso por um suposto filho que abandonara no nascimento.
Escrito por Lúcio Cardoso em 1959, o romance sonda as regiões do inconsciente e é reconhecida como o auge de sua obra.
Villela serve-se do ambiente cenográfico, dos figurinos e de toda sorte de recursos performativos na dramatização, dialogando com a tradição simbolista e apostando na força alegórica dos elementos visuais. A tentativa é honesta, mas não traduz, de fato, as complexidades do livro.
Nem a narrativa à base de solilóquios e pontuais diálogos diretos clarifica a densa e atormentada psique de um núcleo familiar disfuncional e introspectivo, nem os elementos cênicos constituem uma atmosfera onírica que se imponha por si.
Há ênfase nas pulsões sexuais que assombram os personagens de Cardoso -ele próprio homossexual assumido em conflito com a fé católica- e na iminência do incesto. No entanto, o elenco é mediano, e só Xuxa Lopes, como a mãe que seduz o próprio filho, é convincente.
Mas o problema central é mesmo de dramaturgia, já que a dimensão mais interessante do romance, os conflitos subterrâneos no imaginário de personagens cindidos, não aflora.
Como as alegorias visuais propostas se mostram superficiais, aquém da densidade poética que Cardoso tangencia, o vínculo ao projeto simbolista também se frustra.
Se hoje tornou-se comum adaptar romances à cena, nem sempre a transposição é bem-sucedida. É o caso dessa montagem, em que o mistério, para Lúcio Cardoso "a única realidade deste mundo", permaneceu latente.
(LUIZ FERNANDO RAMOS)

CRÔNICA DA CASA ASSASSINADA
QUANDO sex. e sáb., às 21h; dom., às 18h; até 16/10
ONDE Sesc Vila Mariana (rua Pelotas, 141; tel. 0/xx/11/5080-3000)
QUANTO R$ 6 a R$ 24
CLASSIFICAÇÃO 16 anos
AVALIAÇÃO regular



Texto Anterior: Foco: Em busca de viabilidade, grupo adota conselheiros de prestígio
Próximo Texto: Rubricas
Índice | Comunicar Erros



Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.