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CRÍTICA
Em fase de transição, cineasta busca a redenção
SÉRGIO RIZZO
FREE-LANCE PARA A FOLHA
O monólogo que encerra
"Crimes e Pecados", de
Woody Allen, fala das "decisões
penosas" que enfrentamos na vida. "Algumas têm grande peso, a
maioria não tem tanto valor assim, mas definimos a nós mesmos
pelas escolhas morais que fizemos", diz. Poderia ser a epígrafe
de toda a obra de Krzysztof Kieslowski (1941-96), construída em
torno da impossibilidade de sobreviver moralmente sem tomar
partido, e se aplica ao dilema vivido pelo protagonista de "A Paz".
Antek Gralak (Jerzy Stuhr) sai
da prisão disposto a obter um
pouco de paz, definida por ele como "mulher, crianças, lar, ver TV
depois do trabalho". Seu empenho é o de não desperdiçar essa
segunda chance, outro tema recorrente nos filmes do cineasta,
mas a redenção (e a liberdade, traduzida nas imagens de cavalos
selvagens que pontuam a trama)
custará mais caro do que imagina.
Kieslowski vivia na época sua
fase de transição. Insatisfeito com
o documentário, retomava a ficção, que experimentara só na universidade, em curtas. "A Paz"
mantém o rigor documental, mas
agrega uma noção de dramaticidade que se desenvolveria profundamente mais tarde. Esse aspecto híbrido gera interpretações
distintas: enquanto Kieslowski
preferia considerá-lo "a história
de um homem que quer muito
pouco e não consegue", é difícil
negar as implicações políticas de
seu registro do cotidiano de operários da construção civil.
As filmagens coincidiram com
os primeiros sinais do movimento sindicalista que transformaria a
Polônia. Essa inquietação trabalhista envolve também a jornada
de Gralak. A certa altura, estoura
uma greve, ousadia que custou ao
filme anos de interdição. Stuhr assina com Kieslowski os diálogos
de seu personagem, cuja dor é o
ponto forte de "A Paz". Quase 30
anos depois, o ator propicia a
Gralak um tipo de "reencarnação" em "O Tempo de Amanhã",
seu quinto longa como diretor.
Jozef terá, como Gralak, sua segunda chance de pacificar a própria alma. Ácida no retrato da
atual sociedade polonesa, a fábula
é narrada com um humor negro
que suaviza suas limitações e que
sugere, como Kieslowski, buscar a
paz no único lugar onde talvez seja encontrada: dentro de cada um.
A Paz
Spokój
Direção: Krzysztof Kieslowski
Produção: Polônia, 1976
Quando: hoje, às 19h, no Frei Caneca
Unibanco Arteplex (outra sessão dia 2)
O Tempo de Amanhã
Pagoda Na Jutro
Direção: Jerzy Stuhr
Produção: Polônia, 2003
Quando: hoje, às 20h40, no Frei Caneca
Unibanco Arteplex (outras sessões dias
30, 31 e 1º)
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