São Paulo, sábado, 29 de outubro de 2011

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'Descompressão' norteia Patrícia Melo em nova obra

Livro de contos mantém universo da violência, mas de forma mais diluída

Morte e crise de valores são os eixos principais das histórias; escritora trocou SP por imóvel de frente para lago suíço

MORRIS KACHANI
DE SÃO PAULO

O novo livro de Patrícia Melo, "Escrevendo no Escuro", é uma espécie de ponto de mutação em uma carreira que já soma outros oito títulos.
Primeiro, por se tratar de sua estreia no gênero de contos (são 15 no total). "É um suporte narrativo difícil, que muitas vezes funciona como uma camisa de força, pois tudo tem que caber ali. Mas me senti mais madura tecnicamente, foi a conquista deste livro", diz Melo, 49, à Folha.
O universo da autora continua o mesmo: a violência, o caos urbano, o acaso, a velocidade dos acontecimentos, o moralismo. Mas desta vez há algo de diferente em sua prosa, que ela chama de "descompressão" -e que atribui a uma mudança de ares.
Depois de anos vivendo sobretudo em São Paulo, Melo fixou residência em um apartamento de frente para o lago de Lugano, na Suíça, ao lado de John Neschling, ex-diretor artístico e ex-regente titular da Osesp, com quem é casada há quase dez anos.
Também mudou de editora, em 2009. Trocou a Companhia das Letras, depois de quase 16 anos, pela Rocco.
"Os últimos anos no Brasil foram muito difíceis", lembra ela. "E São Paulo é uma cidade muito opressiva, é preciso estar sempre na ponta dos cascos. Não dou mais conta", diz. "Fui para um lugar que é o oposto. Que preza sobretudo a liberdade e com menos contrastes sociais."
São Paulo e Rio de Janeiro sempre tiveram protagonismo nas suas histórias. Em "Escrevendo no Escuro", também. Mas a observação à distância parece fazer a diferença, tornando a percepção da violência mais diluída.
Há dois eixos costurando as histórias. A morte -que, quando não é consumada, aparece simbolicamente como esgotamento, descontrole, ausência de amor- e a crise de valores. "Para mim, a falta de um modelo ético é uma questão contemporânea", explica.
No conto que dá título ao livro, Patrícia narra a história de um editor e crítico literário viciado em soníferos e que, como efeito colateral, sofre de surtos amnésicos.
Aos trancos, concebe um livro, sua "obra-prima gótica". Ele tenta se valer de sua influência, mas não consegue publicá-lo, e acaba virando joguete na mão dos editores.
A amizade de Melo com o escritor Rubem Fonseca, alimentada pelas conversas por Skype, e a inegável afinidade temática vêm à tona.
Pelas páginas de "Escrevendo no Escuro" desfilam a garota de programa que troca SMS com amigas na balada enquanto faz o papel de amante de um ex-hippie diante da mulher, o artista com câncer que desperdiça fortunas em tratamentos alternativos, o investigador policial com síndrome do pânico. Ou o seu vizinho ao lado.

ESCREVENDO NO ESCURO
AUTOR Patrícia Melo
EDITORA Rocco
QUANTO R$ 27 (192 págs.)


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