A invasão francesa

Franceses trocam Paris por São Paulo e trazem grifes européias ao Brasil

Duas grifes francesas abriram filiais na alameda Lorena, nos Jardins, nos últimos meses deste ano. As lojas ficam a poucos passos uma da outra e são comandadas por dois diferentes casais que trocaram as delícias de Paris pela vida turbulenta de São Paulo.
Os franceses Marike e Michael Magnin inauguraram em novembro, no número 1.908 da Lorena, a filial da grife infantil de luxo Bonpoint. O francês Sébastien Orth e a paulistana Karina Mota escolheram o número 1.989 da mesma rua para instalar, em outubro, a Surface to Air, uma das marcas jovens mais descoladas da França.
Os dois casais, que mal se conhecem, mudaram neste ano para São Paulo. Marike, formada em marketing e especializada em história da arte, conta que chegou com "uma mala, o marido e a filha de três anos".
Seu marido era produtor da rede de televisão TF1 e, em Paris, o casal morava perto do Palais Royal. Hoje, ocupa um apartamento na Oscar Freire, freqüenta o clube Paulistano e passa finais de semana na casa que comprou no litoral norte.
"O Brasil é ótimo para crianças, como a minha filha, por causa do sol", diz Marike, 40, com um português quase perfeito, que adquiriu após várias viagens ao país -sua mãe mora aqui há 30 anos. "Não me sinto numa terra estrangeira. São Paulo hoje é uma cidade internacional, luxuosa e moderna."
Por isso mesmo, ao decidir mudar-se para o Brasil, Marike resolveu bancar a idéia de abrir uma Bonpoint paulistana. "Provamos à matriz que a cidade tinha um forte poder de compra e que iria gostar do estilo casual-chique da grife", conta. A Bonpoint não pestanejou, empenhada que está num projeto de expansão mundial.
Exceto a lentidão da alfândega, Marike não tem ainda o que reclamar dos negócios à brasileira. E já se acostumou até com a venda à prestação, que não é comum na França. "Já sei que, aqui, até os clientes ricos gostam de parcelar", observa.
Sébastien, 26, e Karina, 26, se conheceram em 2000, na Sorbone 6, onde estudavam comunicação e relações públicas. Durante o namoro, ele veio duas vezes ao Brasil e espantou-se ao encontrar uma terra bem diferente dos clichês que tinha na cabeça. "É um país jovem, com mais liberdade e receptivo às novas culturas. Fiquei apaixonado", conta Sébastien, que nasceu na Córsega, ilha que faz parte da França.
Em 2005, eles começaram a planejar sua mudança para São Paulo. Karina era da equipe do estilista Martin Margiela e fazia frilas para a Surface to Air, onde Sébastien trabalhava. Foi o próprio diretor da Surface, Jéremy Rozan, quem sugeriu que criassem uma filial da grife.
A Surface francesa entrou com 70% do capital, e já mandou seis pessoas a São Paulo para acompanhar o lançamento da loja. "Agora, a equipe inteira de Paris está querendo vir morar aqui", conta Karina. "Em São Paulo, temos o melhor da vida moderna e, a poucas horas da cidade, a praia", exclama Sebastien, em português escorreito, que diz ter aprendido durante as obras da loja.
Para ele, o mercado brasileiro é mais aberto a novos negócios que o europeu. "Para quem está começando, Paris não é fácil, é um ambiente de muita competição", diz. E, por enquanto, Sébastien só tem uma coisa a reclamar dos brasileiros: "Eles são felizes demais".

Bonpoint

Luxo para crianças

A Bonpoint está para as crianças como a Dior ou a Hermès estão para os adultos. É uma das marcas exclusivamente infantis mais prestigiadas pelas mamães ricas e famosas, como a diretora Sofia Coppola e a atriz Gwyneth Paltrow. A grife também costuma fazer alta-costura para filhos da nobreza européia.
A primeira loja da Bonpoint foi inaugurada em Paris em 1975. Hoje, são mais de 40 no mundo -a principal fica num palacete na rue Tournon, em Saint-Germain-des-Près. As coleções seguem as tendências das grandes maisons, mas adaptadas ao estilo da grife, com sua imagem muito lírica e parisiense da infância. "É um estilo atemporal, que mescla o aristocrático e o casual, o clássico e o moderno", define Marike Magnin.
A loja em SP -desenhada pela Tryptique, sociedade de arquitetos franceses que atuam em São Paulo- é a primeira da grife na América Latina. Além das roupas, a loja importa da França brinquedos e acessórios, inclusive para bebês. Os preços chegam a se equiparar aos das roupas de adultos -de R$ 350 a R$ 750 por um vestidinho, por exemplo.

Criada em 2000 em Paris, a Surface to Air é uma das grifes jovens em ascensão na indústria da moda. Começou como um coletivo de criação, produzindo roupas masculinas. Desde 2002, suas coleções passaram a ser desenhadas pelo canadense Nicolas Andreas, que trabalhou com Hedi Slimane na Dior Homme.
Foi a brasileira Karina Mota quem idealizou as primeiras roupas femininas da grife. A central parisiense, que elaborou as peças, acabou gostando da idéia de criar também para as garotas, e hoje as roupas para mulheres representam quase 40% da produção da marca. "A Surface to Air busca fazer um mix entre o streetwear e a sofisticação", diz Karina.
A loja brasileira funciona como multimarcas. Além das roupas da Surface -todas importadas-, vende peças exclusivas desenvolvidas por estilistas brasileiros, como Alexandre Herchcovitch e Lorenzo Merlino. "Reunimos grifes que têm uma história forte no Brasil e refletem a cultura do país", diz Sébastien Orth. A loja em São Paulo tem também um bistrô na entrada e promove exposições de fotos e de arte multimídia.