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Historiador estuda uso político do episódio
DA REDAÇÃO
Leia abaixo os principais trechos da entrevista do pesquisador
Francisco Doratioto, autor de
"Maldita Guerra", à Folha.
(SC)
Folha - Seu livro é uma resposta à
leitura revisionista que se fez da
Guerra do Paraguai nos anos 60?
Francisco Doratioto - Não procurei fazer o trabalho com esse objetivo, mas a consequência acabou
sendo essa. Quando estava na
universidade, a interpretação dominante era a revisionista, e muito do que se publica em material
didático hoje ainda é. Ao pesquisar fontes primárias sobre as relações entre Brasil e Paraguai no
Império, fiquei surpreso, pois encontrei uma documentação que
dizia exatamente o contrário do
que eu aprendera e do que eu ensinava como professor.
Folha - O revisionismo foi prejudicial aos estudos sobre a Guerra
do Paraguai?
Doratioto - Não totalmente. O
revisionismo teve seu mérito, pois
durante muitos anos a história da
guerra havia ficado esquecida,
cristalizada numa visão personalizada do processo histórico. Mas
seu mérito se esgota nesse resgate.
A interpretação revisionista, na
sua vertente antiimperialista dos
anos 60 e 70, é uma leitura equivocada da teoria da dependência e
está carregada da ideologia do
contexto em que foi gerada.
Folha - Existe documentação inédita sobre o assunto?
Doratioto - Inédita não, mas esquecida há muita. Comecei essa
pesquisa porque tropecei numa
carta do marquês [futuro duque"
de Caxias de dezembro de 1868,
logo depois da batalha de Itororó
[Caxias venceu o Exército do Paraguai em uma série de batalhas
naquele ano, chamada de "dezembrada", entre elas as de Itororó, Avaí e Lomas Valentinas].
Nessa carta, Caxias, que é um
personagem que merecia ser recuperado e mais bem estudado,
descreve para o ministro da Guerra o comportamento dos oficiais
do Império. O texto explica por
que durante tanto tempo Caxias
demorou para fazer operações
militares. Ele foi cauteloso por saber da baixa combatividade dos
soldados brasileiros. Esse era um
dos motivos que o levaram a colocar sempre o dobro de homens
para combater os paraguaios.
Folha - O que você acha ter conseguido explicar melhor ao relativizar as interpretações existentes?
Doratioto - Meu objetivo é recuperar as dimensões esquecidas da
Guerra do Paraguai e explicar melhor sua origem. Há muito para
ser revisto, como a redução que
foi feita pela historiografia brasileira da importância do aliado argentino. Quem lê de forma desavisada o que foi escrito nos livros
tradicionais tem a impressão de
que o Brasil lutou sozinho.
Folha - E na Argentina, como a
história da guerra tem sido escrita?
Doratioto - Lá também houve
interpretações feitas para serem
utilizadas na disputa política. Boa
parte da leitura tradicional da
guerra foi feita por historiadores
peronistas, que tinham interesse
de retratar de forma positiva personagens históricos autoritários
do rio da Prata, para justificar o
autoritarismo de Perón. Nesse
sentido, era mais interessante ressaltar a figura de Solano López do
que a de Bartolomé Mitre. A imagem de Mitre que ficou é a do sujeito vinculado aos interesses estrangeiros e que se aliou ao inimigo tradicional da Argentina, o
Brasil. O mesmo uso da imagem
autoritária de Solano López foi
feito pelo Paraguai sob o comando de Alfredo Stroessner (1954-89), onde ser antilopizta era considerado crime.
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