São Paulo, sábado, 30 de abril de 2005

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INTERVENÇÃO

Coletivo Os Bigodistas participa de cruzada "antipublicidade abusiva" e propõe transformar cartazes em arte

Grupo põe bigodinho em outdoors de SP

Matuiti Mayezo/Folha Imagem
Outdoor da Hering, na av. Heitor Penteado, em São Paulo, atacado pelo coletivo Os Bigodistas


DIEGO ASSIS
DA REPORTAGEM LOCAL

Na última segunda-feira, 15 outdoors da região oeste de São Paulo amanheceram diferentes. Sobre a face sorridente de seus garotos-propagandas, nasceram "bigodinhos" pintados com tinta preta. Obra d'Os Bigodistas.
Iniciada em dezembro de 2003, quando integrantes do grupo colocaram o primeiro bigode em um outdoor em frente ao prédio que abrigou a mostra Arte Contemporânea no Movimento dos Sem Teto do Centro, na av. Prestes Maia, em SP, a ação remete ao artista dadaísta Marcel Duchamp, que em sua obra "L.H.O.O.Q.", fez o mesmo em uma reprodução da "Monalisa", de Da Vinci.
A principal diferença, mais de um século depois, são os alvos. Se Duchamp visava provocar as instituições de arte, para Os Bigodistas o principal inimigo é "a propaganda abusiva".
"São Paulo tem que ser rediagramada. Um outdoor, acima de tudo, é uma enorme construção de valores, que lhe empurra o que comer, o que beber, onde ir", afirma um integrante do grupo que se identifica como Menossão.
Cartazes da Hering, das lojas Pernambucanas, de apresentações dos cantores Leonardo e Frank Aguiar, do filme "O Filho do Máscara", entre outros, ganharam bigodes. Nem o novo papa escapou: num anúncio da revista "Veja", colocado no encontro da av. Heitor Penteado com a av. Dr. Arnaldo, Bento 16 portava um bigodinho à Adolf Hitler, por cortesia d'Os Bigodistas.
"Mais que a política, o foco de nossas ações é a ironia", defende Menossão. "Pintar um bigode é algo muito sutil, mas que transforma totalmente o outdoor. Algo que tem uma função de venda, de repente, passa à função de arte."
Além de prometerem novas intervenções para os próximos dias, Os Bigodistas não estão sozinhos. Parte de um grupo maior que se autodenomina Gapa (Grupo Anti Publicidade Abusiva), há também o Esqueleto Coletivo, que em março deste ano espalhou faixas com slogans políticos ("Quem ganha com a propaganda?", "Odeio muito tudo isso", "Isso não foi feito para mim" etc.) por cartazes de empresas como a Coca-Cola.
"Nós do Esqueleto Coletivo achamos preocupante a quantidade de marcas expostas de forma abusiva, pois, para além da mera poluição visual, a propaganda faz com que nosso olhar valorize determinado produto de forma involuntária", escreveu em e-mail à reportagem um dos integrantes do grupo, que "luta para que o poder público tome conhecimento de nosso descontentamento, e principalmente para que a população como um todo deixe de ver a propaganda como algo normal, e [a] perceba como aquilo que ela é: algo imposto em suas vidas".

Antecedentes
Antes disso ainda, um outdoor do Itaú -"Baladeiros - o Itaú foi feito pra você"- também já havia sido alvejado por grafiteiros. Durante as eleições de 2004, diversos objetos de propaganda eleitoral ganharam adesivos com os dizeres "Sujou a cidade" e, em alguns casos, inclusive os bigodinhos de Hitler.
Procurados pela Folha, departamentos de marketing e assessoria de imprensa de empresas atingidas pelas ações d'Os Bigodistas não responderam ao pedido de entrevista.
De acordo com o Código Penal brasileiro, as intervenções podem ser classificadas como dano, que consiste em "destruir, inutilizar ou deteriorar coisa alheia". A pena prevista é de um a seis meses de detenção e multa.


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