São Paulo, quarta-feira, 30 de maio de 2007

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Europa se curva ao kuduro (epa!)

Mistura de eletrônico com percussão angolana, gênero é tocado por DJs famosos, como Diplo, e é atração de festival no Rio

Daniela Mercury vê semelhanças com samba-de-roda; DJ Marlboro diz que parece funk carioca; o significado... é esse mesmo


THIAGO NEY
DA REPORTAGEM LOCAL

O nome é kuduro e quer dizer isso mesmo. Bunda dura. O ritmo nasceu em Angola, país africano de língua portuguesa, e foi batizado como uma piada pronta para ilustrar qual é o alvo de suas batidas. E foi-se o tempo em que o alvo de suas batidas estava apenas nos terrenos improvisados em que são montados shows e festas em Luanda. Há cerca de um ano, o ritmo foi levado à Europa pelos portugueses e fez parada obrigatória nos clubes ingleses.
Chega definitivamente ao Brasil neste sábado, quando o combo português Buraka Som Sistema se apresenta no evento Baile Skol, no Rio, ao lado de nomes tradicionais do funk carioca, como o DJ Marlboro.
A divisão de palco com o funk carioca não é à toa. Não são poucas as semelhanças entre as duas músicas. O kuduro foi criado em Angola há pouco mais de dez anos, mas sua inspiração maior veio de fora: das batidas eletrônicas da house e do tecno. Músicos de Luanda como Tony Amado e Sebem adicionaram tambores e percussão e, em cima de tudo, vocais que lembram os dos rappers norte-americanos. Suas letras podem conter tanto comentários sociais e políticos como histórias sacanas.
"O linguajar é o mesmo, vem do gueto", diz Marlboro, comparando o kuduro com o funk carioca. "As batidas é que são um pouco diferentes. O funk tem mais influências do samba, do funk americano. As do kuduro são mais da dance music, batidas mais retas. Mas, na hora de dançar, é a mesma coisa."
A conexão kuduro-Brasil não acontece apenas pelo funk carioca. Daniela Mercury colocou em seu último disco, "Balé Mulato ao Vivo", a canção "Quero a Felicidade", que traz clara influência de kuduro.
"Eu adoro o kuduro", conta a cantora. "Ele parece muito com o samba-de-roda. A célula do samba-de-roda pode ser tocada em cima do kuduro. É delicioso para dançar." O kuduro não é estranho ao Carnaval de Salvador. Um dos principais artistas angolanos, Dog Murras, já cantou em trios elétricos. "Compus "Quero a Felicidade" ouvindo Dog Murras. Eu e meus bailarinos aprendemos as coreografias que eles fazem com o jogo de pernas", conta Mercury.
"A cadência rítmica, os BPMs [quantidade de batidas por minuto de uma canção] são semelhantes aos do axé. O suingue é bem parecido", explica Dog Murras, por telefone, à Folha.

Popularidade
Apesar de relativamente novo, o kuduro tornou-se bastante popular entre os jovens angolanos e de outros países, como Cabo Verde. "É a maior manifestação cultural de Angola", afirma Dog Murras. "Atende todas as camadas socais."
Se hoje o kuduro é tocado em clubes importantes da Europa (como o Fabric, de Londres), por DJs conhecidos -como o norte-americano Diplo (um dos descobridores do Bonde do Rolê) e o britânico Sinden-, isso acontece muito devido ao esquema de produção e divulgação dessa música.
Sem dinheiro, os produtores e DJs gravam em computadores pessoais. "Muitos fazem kuduro totalmente eletrônico. Eu trabalho com tambores, reco-reco e outros instrumentos tradicionais."
Grava-se uma ou duas músicas. Aí, passa-se para ambulantes, que vendem na rua. O principal meio de divulgação são os candongueiros (táxi para 12 pessoas). "As crianças que vão para a escola, o povo que vai trabalhar, todos usam esse veículo. Então é a melhor forma de divulgação", diz Murras. "Se fizer sucesso, os músicos ganham com os shows." Lembra o tecnobrega do Pará, não?


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