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BIA ABRAMO
As distâncias entre periferia e centro
Mesmo que conduzida por olhar externo, as histórias de "Antônia" se dão num regime de mão dupla
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"ANTÔNIA" VOLTOU à TV, depois de uma passagem intrigante pelo cinema.
Quando o longa de Tata Amaral chegou aos cinemas, depois de uma
temporada bem-sucedida na TV, a
expectativa era a de que houvesse
uma confluência de públicos, o que
não se confirmou.
É claro que a primeira especulação
explicativa seja a da existência de
um divórcio entre os dois públicos, o
de cinema e o de TV. De acordo com
ela, os espectadores que se interessariam pelo universo de "Antônia"
-feminino, da periferia- teriam se
contentado com a série na TV e não
teriam ou o hábito ou as condições
para ir ao cinema; e, por sua vez, o
público de classe média, que vai ao
cinema, só teria interesse na periferia quando ela promete as emoções
fortes do confronto e da violência.
Pode ser, mas talvez haja algo que
escape a essa explicação publicitário-demográfica: mais do que um divórcio, há um abismo de comunicação entre a periferia e o centro que
torna os diálogos quase impossíveis.
Sintoma dessa impossibilidade foi
o que se viu no "Roda Viva" com Mano Brown: os entrevistados, cada um
à sua maneira, desconfortáveis e
postiços seja no papel "compreensivo", seja no da "proximidade", o entrevistado sem ter lá muito o que dizer, tanto por conta da própria falta
de eloqüência como diante de algo
que parecia ser uma não-compreensão do propósito das perguntas.
Ainda assim, foi um dos programas mais importantes da história do
"Roda Viva", justamente por ter tornado explícita, quase dolorosa, a dificuldade gigantesca do diálogo. As ferramentas tradicionais fornecidas
pelas ciências sociais, pela cultura e
mesmo pelo jornalismo, não são
mais suficientes para fazer a ponte
sobre esse abismo que nos funda.
Ou, pelo menos, não da forma como
ainda empregamos esses instrumentos a partir do centro.
Pois bem, e "Antônia" nisso tudo?
Minissérie e filme são, em tudo, mais
positivos do que, digamos, o rap dos
Racionais MC's, e apostam numa
possibilidade, se não de diálogo, pelo
menos de trânsito. Só que, como sugerem os roteiros dessa segunda
temporada, essa circulação está, a
todo momento, marcada, definida e,
por vezes, truncada pelas distâncias.
Mesmo que conduzida por um olhar
mais ou menos externo, portanto,
também afetado pela distância, as
histórias de "Antônia" se dão num
regime de mão dupla.
A ficção, entretanto, tem lá seus
truques para fazer as coisas acontecerem -ainda por cima se é boa, como é o caso de "Antônia". De qualquer maneira, esses abismos, silêncios e distâncias têm informado algo
que parece vital entender.
biabramo.tv@uol.com.br
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