São Paulo, sábado, 30 de dezembro de 2006

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Crítica/jornalismo

Reportagens premiadas de José Hamilton Ribeiro são reeditadas

CARLOS EDUARDO LINS DA SILVA
ESPECIAL PARA A FOLHA

José Hamilton Ribeiro é, certamente, um dos principais repórteres que atuaram no Brasil no século 20. Mas o título da antologia de seus sete textos contemplados com o Prêmio Esso -mais o famoso relato de sua aventura no Vietnã, que não foi premiado- , "O Repórter do Século", sugere um cabotinismo que não é próprio dele nem lhe faz justiça.
Ele não é disso, como comprova o reconhecimento honesto no capítulo final (intitulado "As Dez Perguntas que Mais me Fazem"), ao responder à questão "o que leva um jornalista a correr o risco de cobrir uma guerra?". Se fosse cabotino, ficaria apenas na segunda parte de sua resposta ("esse compromisso entre romântico e missionário que todo jornalista leva consigo de estar onde a notícia estiver, para denunciar a injustiça, a iniqüidade, o preconceito").
Como José Hamilton não é cabotino, sua resposta começa com a admissão de que outros motivos para correr esse risco são: "um pouco, vaidade, um pouco, espírito de aventura, um pouco, ambição profissional". Melhor assim.

Safra de edições
Apesar do desconforto inicial que o título infeliz possa provocar, este é mais um volume importante na bem-vinda safra de edições de textos importantes na história do jornalismo brasileiro e mundial que têm aparecido no mercado nos últimos seis anos.
A edição é bem cuidada. Cada reportagem é precedida de duas páginas que oferecem o contexto da época em que ela foi originalmente publicada e desdobramentos do tema nos anos seguintes; fotos dos personagens da matéria são reproduzidas bem como das capas dos veículos em que saíram pela primeira vez.
Das oito reportagens reproduzidas no livro, cinco foram da revista "Realidade". Quem nasceu depois dos anos 1960 não teve a chance de conviver com aquele veículo, que foi, como diz José Hamilton Ribeiro em sua nota introdutória, "um avanço no jornalismo deste país, principalmente no jornalismo de "longo-curso", de profundidade, o jornalismo de texto e de autor".

Jornalismo de hoje
O autor pergunta se "Realidade" e seus textos "gordos" ainda caberiam no jornalismo de hoje. A pergunta já embute a resposta de que, na opinião dele, não. É discutível.
Se é verdade que não parece haver atualmente grande quantidade de consumidores dispostos a pagar por uma revista ou jornal do tipo "Realidade", o simples fato de tantos livros com reproduções de matérias desse tipo estarem sendo publicados parece ser uma indicação de que algum público para elas deve existir.
Talvez o problema esteja no grau de expectativa de popularidade que os apreciadores dessa espécie de jornalismo têm.
Assim como o rádio, após a disseminação da TV, deixou de ser o veículo das multidões, mas nem por isso desapareceu ou deixou de produzir programas de bom nível, pode ser que as chamadas "grandes reportagens" possam sobreviver em publicações com pequena tiragem, dirigidas para um nicho de leitores sofisticados e de alto poder aquisitivo. É possível se satisfazer com isso?
De qualquer modo, ainda que José Hamilton esteja certo e não haja mais lugar para periódicos como "Realidade", vale a pena ler ou reler os textos que ele produziu. Eles mostram como um jornalista pode ser preciso, correto, atrativo, inteligente e compreensível ao tratar de temas científicos de alta complexidade -como um transplante de rim- ou de grande interesse humano, como os combates no Vietnã.


CARLOS EDUARDO LINS DA SILVA é diretor de relações institucionais da Patri Relações Governamentais & Políticas Públicas. É membro do Grupo de Análise de Conjuntura Internacional da USP, do Centro Brasileiro de Relações Internacionais e do conselho editorial da "Revista de Política Externa"

O REPÓRTER DO SÉCULO    
Autor: José Hamilton Ribeiro
Editora: Geração Editorial
Quanto: R$ 34,90 (238 págs.)


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