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CINEMA/ESTRÉIAS
"SAMSARA"
Filme conta a história de um monge seduzido pelos desejos
Beleza plástica particulariza drama indiano minimalista
INÁCIO ARAUJO
CRÍTICO DA FOLHA
"Samsara" narra a história
do monge Tashi, que depois de três anos, três meses e três
dias de meditação solitária descobre que, ao contrário do que poderia esperar, não está no caminho do nirvana.
O mundo dos desejos o chama.
Ou, mais precisamente, a bela Pema, a quem vê certo dia e que,
desde então, frequenta seus sonhos. Tashi argumenta com os
demais monges que, se até o Buda
em pessoa conheceu o mundo antes de buscar a iluminação, por
que outro deveria ser o seu caminho? Seguem-se as aventuras
mundanas de Tashi.
Como se vê, o que oferece como
história este filme indiano não é
muita coisa. Mas como nem sempre o que se oferece no cinema
vem da história, convém prestar
atenção a outros valores.
Ou antes, é justamente por ser a
história rala que o realizador Pan
Nalin pode se deter em certos aspectos plásticos capazes de reter a
atenção do espectador. Nalin foi,
antes de cineasta, um estudante
de artes -aspecto a não negligenciar. E, a acreditar na biografia do
diretor publicada pelo site "The
Internet Movie Database"
(www.imdb.com), depois de uma
viagem à Europa, subiu ao Himalaia, à maneira de seus monges,
em busca de luz espiritual.
Esse último item -aliado ao fato de ser indiano- lhe dá uma intimidade com aquilo que descreve infinitamente superior à manifestada pelos inúmeros realizadores (inclusive Martin Scorsese e
Bernardo Bertolucci) que andaram por lá e ajudaram a transformar essa parte do mundo em duvidosa moda cinematográfica.
Isso, além de um sentido plástico privilegiado e de uma atenção
notável aos detalhes -no que se
assemelha a Satiyajit Ray, o mais
ilustre realizador indiano-, particulariza "Samsara", que parece
seguir um princípio minimalista,
jogando, admiravelmente, com a
percepção do espectador diante
das imagens.
Como exemplo, o magnífico
uso que faz de uma trouxinha que
Pema dá a Tashi inúmeras vezes,
como sinal de boa viagem, mas
que pode adquirir significados
bem diferentes, conforme o momento em que lhe é entregue.
Ou ainda uns tantos panos coloridos, que se introduzem na paisagem quase monocromática, como que nos chamando a participar do desejo de Tashi. Ou, mais
ainda, os desenhos que um monge mostra a Tashi representando
o ato sexual, mas que, conforme a
incidência de luz sobre eles, podem representar os conflitos e as
dores que reserva a vida.
Esse tipo de notação, a partir
das quais a trajetória do monge e
o conflito entre a carne e o espírito
se transmitem a nós, ajudam o espectador a atravessar com interesse e sem aborrecimento as
duas horas e meia de "Samsara".
É bem mais do que nada.
Samsara
Idem
Direção: Pan Nalin
Produção: Alemanha/Índia, 2001
Com: Shawn Ku, Christy Chung e
Neelesha Bavora
Quando: a partir de hoje nos cines
Cinesesc, Espaço Unibanco 1, Lumière 1
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