São Paulo, quinta-feira, 31 de maio de 2001

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MÚSICA ERUDITA

Graves agrava caso agudo da Sinfônica

ARTHUR NESTROVSKI
ARTICULISTA DA FOLHA

Denyce Graves não barateia. Julius Rudel é um grande regente. A Orquestra Sinfônica Municipal deu o máximo de si. Mesmo assim, ficou faltando alguma coisa no concerto de anteontem, em São Paulo, embora não seja fácil dizer o quê.
O nome é Graves, mas ela é boa de agudos. Equilíbrio é um de seus pontos fortes. O principal é o timbre: uma soprano com timbre de contralto. Canta tudo com domínio de tudo, embora não tenha dado tudo no Municipal.
Ensina-se às crianças que não se deve dizer "show" de música clássica. Mas o repertório de terça era de show: 16 peças, alternando solista e orquestra, mais o Coral Lírico nos excertos de "Carmen". E Denyce e seus quatro vestidos encenam as árias na melhor tradição do entretenimento americano. Sem ironia: ela é uma artista consciente e generosa. Sublinhe-se "melhor" na frase acima.
O verdadeiro show foi do maestro Julius Rudel, diretor da City Opera há 37 anos. Que prazer ver um regente desses, tocando a orquestra como um violão e tratando o pódio como um banquinho. Já regeu tudo, sabe tudo e continua fazendo música -sem espanto, sem cansaço, sem agonia.
Arrancou vinho da pedreira e conseguiu fazer a Sinfônica tocar relativamente bem do início ao fim. Crítico generoso: a orquestra melhorou, não envergonha, acompanha cantores com esmero. Crítico duro: não tem identidade, o desnível de naipes é óbvio, não toca mais do que uma orquestra universitária do interior dos EUA -muito pouco para quem carrega o nome da cidade.
Eis uma idéia para os Patronos: patrocinar a Sinfônica. A orquestra está pronta para crescer. É um verdadeiro privilégio escutar grandes solistas em São Paulo; mas não chega a criar vida musical. E a Sinfônica pode ser outra orquestra, se deixarem, se quiserem, se puderem.
Na soma de tudo, ficou faltando alguma coisa. Graves não cantou agudos impossíveis, nem trinados vertiginosos. Não foi isso. O fato é que a gente mal sai de um concerto desses e já esqueceu. Transcendência relativa do ar: zero. Ficou faltando alguma coisa. Talvez música?


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