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MANGUEBEAT
Artistas de vanguarda aderem à internet no lugar das formas tradicionais de divulgação e produção cultural
Pernambuco troca a parabólica pelas fibras óticas
DIEGO ASSIS
DA REDAÇÃO
Passada a primeira onda do
chamado manguebeat, que deu
visibilidade mundial a nomes como Chico Science, da Nação
Zumbi, e Fred 04, do Mundo Livre S/A, a imagem-símbolo de
uma antena parabólica enfiada na
lama está sendo atualizada por
um grupo de DJs, músicos, jornalistas, professores e produtores
culturais do Recife. No lugar do
imenso e desajeitado disco prateado, entram agora fibras óticas,
cabos submarinos, microondas e
células de telefonia móvel.
O projeto Re:Combo, sediado
no pólo de informática da capital
pernambucana, o Porto Digital,
teve início há menos de dois meses com a transmissão do primeiro "Chamado para Ruídos" pela
internet. "Foi uma brincadeira
em cima dos "Call for Papers" do
mundo acadêmico, que avisam o
público que está aberta a temporada de envio de artigos para congressos", explica H.D. Mabuse,
um dos idealizadores.
Todos os ruídos -ou samples- coletados foram então recombinados durante uma série de
apresentações ao vivo do grupo,
no último Abril Pro Rock, em Recife. Além dos dados digitais, retrabalhados usando softwares
simples de edição disponíveis gratuitamente na internet (veja quadro ao lado), as faixas receberam
a adição de guitarras e de vocais e
se transformaram no primeiro
CD-R (com tiragem limitada) do
Re:Combo, batizado informalmente de "Dragão Chinês".
Também disponibilizadas no site do projeto, as músicas -construídas em cima de remixes que
vão do veterano Jackson do Pandeiro a novos nomes da cena do
NE como Chico Corrêa e Mombojó- são produzidas numa espécie de código aberto, em que é
possível a qualquer um baixá-las
para seu computador e refazê-las.
"Essa colaboração rende frutos
bastante interessantes justamente
porque não é uma atividade unilateral, mas sim de produção descentralizada e generosa", afirma.
Introduz-se aí o conceito de
"memes", emprestado do etólogo
Richard Dawkins, autor do livro
"O Gene Egoísta". Mistura de ficção científica e teoria da evolução,
os "memes" funcionariam como
os códigos de DNA, passados de
uma célula a outra numa espécie
de luta pela sobrevivência.
De volta ao mangue: "O que se
conhece hoje como Movimento
Mangue foi, no seu nascimento, o
conjunto dos "memes" que passavam pelas cabeças de seus hospedeiros (pessoas) no início da década de 1990: manguezais, biodiversidade, teoria do caos, ácido lisérgico, batuques & samplers,
quadrinhos & cordéis. Hoje o sistema formado por esses "memes"
(...) parasitou a mente de inúmeros jovens pela cidade, fugindo ao
controle do núcleo produtor dessas idéias", defende o coletivo em
um de seus manifestos.
E, por fim, do mangue à maior
batalha da indústria fonográfica
de hoje: "Nós somos simpatizantes do copyleft. Com ferramentas
libertadoras como a web e o som
digital, a música passa a fluir livremente de um lugar a outro sem
estar armazenada num disco de
plástico. Ou, por outro lado, cada
vez mais pessoas no mundo podem guardar música num disco
de plástico com a mesma qualidade dos discos de plástico lançados
pela grande indústria", opina DJ
Tarzan, outro integrante do
Re:Combo. "Os artistas, exceto os
best-sellers, nunca conseguiram
uma geração de renda satisfatória
que fosse proveniente de direitos
autorais. O mecanismo de copyright acaba fazendo com que eles
sejam menos conhecidos do público pela limitação imposta à circulação livre de seus trabalhos."
Mais do projeto em www.manguebit.com.br/recombo.
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