São Paulo, terça-feira, 31 de julho de 2007

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Comentário/"Os Simpsons - O Filme"

Simpsons continuam bons no cinema

"Os Simpsons - O Filme" não tenta ser melhor nem resumir seriado; por isso mesmo, diverte fanáticos e fãs ocasionais

A. O. SCOTT
DO "NEW YORK TIMES"

Sou há muito tempo da opinião de que a história da cultura popular americana -talvez até da civilização ocidental- é pouco mais que um longo prelúdio para "Os Simpsons". Não significa que "Os Simpsons - O Filme" (que estréia no Brasil dia 17 de agosto) represente um pico criativo rumo ao qual as 18 temporadas do seriado tenham feito uma longa ascensão.
Mantenhamos as coisas em perspectiva. "Os Simpsons" é um arquivo inesgotável de humor e criatividade, uma realização sem precedentes ou pares na história da TV -talvez a mais pura destilação já concebida de nossas glórias e falhas como nação. "Os Simpsons - O Filme" é... Bem, é um filme.
Não me entenda mal. É um filme divertido, com piadas tão engraçadas quanto inteligentes, repleto do humor anárquico que marca o seriado. Desde o início, quando Ralph Wiggum se posiciona no logotipo da 20th Century Fox e canta ao lado da fanfarra da empresa, até os créditos finais, "Os Simpsons - O Filme" tem diversão para fãs ocasionais e fanáticos.
Não é melhor que os melhores episódios do seriado -não é nenhum "22 Curtas sobre Springfield", "O Inimigo de Homer", "Krusty se Machuca" ou "Lisa, a Vegetari ana"- nem se esforça para sê-lo. Eu o situaria no nível de "Empate de Titãs", o 200º episódio, com o qual compartilha o tema ambiental.
Em vez de tentar superar ou resumir "Os Simpsons", o diretor do filme, David Silverman, e os roteiristas aproveitam para produzir algo mais longo e amplo. O formato de tela larga CinemaScope, desenvolvido pela Fox nos anos 50 para combater a ascensão da TV, revela ser a forma ideal de apreciar o paraíso que é Springfield. Numa variação sobre a sequência de abertura do seriado, vemos a cidade por novos ângulos e apreciamos sua história e beleza.
Também há cenas de multidões numa escala raramente tentada na TV, espetáculos que compensam o pouco tempo concedido a personagens secundários. Todos têm algum espaço, mas, para meu gosto, há Ned Flanders demais e Krusty de menos. Menos Cletus, por favor, e mais Willie! E onde foram parar Patty e Selma? Mas devo admitir que o filme "Comichão&Coçadinha", no início, é um toque de pura genialidade.
Neste ponto, sinto a tentação de repetir minhas piadas favoritas -de falar sobre a nudez frontal de Bart, a cena de Homer e Marge no quarto, o robô que desativa bombas e os atos de auto-homenagem que levaram meu fã de quadrinhos interior a dizer: "Eu me lembro disso". Mas prefiro dar uma de estraga-prazeres e revelar a trama: Homer faz algo bastante estúpido, Lisa se apaixona, Bart se mete numa enrascada e Marge expressa preocupação e desaprovação. Sinto muito!
A trapalhada principal de Homer não é mais ou menos idiota que qualquer coisa que ele já tenha feito (direi só que envolve um porco). As consequências, porém, são proporcionais ao que se poderia esperar de um blockbuster da temporada do verão americano. Envolvem Arnold Schwarzenegger eleito presidente dos EUA, as forças de ataque de elite da Agência de Proteção ao Meio Ambiente (EPA) e a quase destruição de Springfield.
O diretor da EPA é dublado por Albert Brooks, um dos colaboradores fiéis de "Simpsons".
Há poucas figurações e dublagens de celebridades: o filme opta, corretamente, por destacar participantes regulares do seriado. Há o Green Day numa ótima versão da canção-tema de Danny Elfman, mas, com essa exceção, o filme se mantém fiel ao núcleo sólido da cidade, da família e do misto de irreverência e sentimento que garante a longevidade do seriado.

Trabalho coletivo
Uma comédia de TV geralmente é fruto do trabalho coletivo e às vezes antagônico de um grupo de roteiristas. É fácil identificar o estilo gráfico e a sensibilidade popular de Matt Groening e intuir o humanismo aguçado e difuso de James L. Brooks. Ao longo dos anos, porém, dezenas de roteiristas deixaram sua influência no seriado. Como grupo, são responsáveis pela diversidade e coerência, por pontos altos e ocasionais fases de estagnação.
Várias figuras célebres de "Os Simpsons" aparecem nos créditos do filme: o roteiro é atribuído a Groening, Brooks, Al Jean, Ian Maxtone-Graham e George Meyer, entre outros.
Vários cumpriram o papel crucial de "diretor do show" -sinal de que o filme significa mais para seus criadores que simples subproduto ou reflexão tardia.
Só que, é claro, é isso o que ele é. Dez ou 15 anos atrás, "Os Simpsons - O Filme" poderia ter sido visto como algo mais ousado. Mas, apesar de toda sua malícia e iconoclasia, "Os Simpsons" virou uma instituição, e esse status impediu o filme de arriscar demais. Por que mexer na fórmula quando se pode fazer a marca crescer?
Dou a impressão de estar decepcionado? Não estou, realmente. Ou estou, sim, mas só um pouco. Em última análise, "O Filme" é tão bom quando um episódio mediano de "Os Simpsons". Em outras palavras, eu estaria disposto a vê-lo mais umas 20 ou 30 vezes.


Tradução de CLARA ALLAIN


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