|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
Comentário/"Os Simpsons - O Filme"
Simpsons continuam bons no cinema
"Os Simpsons - O Filme" não tenta ser melhor nem resumir seriado; por isso mesmo, diverte fanáticos e fãs ocasionais
A. O. SCOTT
DO "NEW YORK TIMES"
Sou há muito tempo da opinião de que a história da cultura popular americana -talvez
até da civilização ocidental- é
pouco mais que um longo prelúdio para "Os Simpsons". Não
significa que "Os Simpsons - O
Filme" (que estréia no Brasil
dia 17 de agosto) represente um
pico criativo rumo ao qual as 18
temporadas do seriado tenham
feito uma longa ascensão.
Mantenhamos as coisas em
perspectiva. "Os Simpsons" é
um arquivo inesgotável de humor e criatividade, uma realização sem precedentes ou pares na história da TV -talvez a
mais pura destilação já concebida de nossas glórias e falhas
como nação. "Os Simpsons - O
Filme" é... Bem, é um filme.
Não me entenda mal. É um
filme divertido, com piadas tão
engraçadas quanto inteligentes, repleto do humor anárquico que marca o seriado. Desde o
início, quando Ralph Wiggum
se posiciona no logotipo da
20th Century Fox e canta ao lado da fanfarra da empresa, até
os créditos finais, "Os Simpsons - O Filme" tem diversão
para fãs ocasionais e fanáticos.
Não é melhor que os melhores episódios do seriado -não é
nenhum "22 Curtas sobre
Springfield", "O Inimigo de Homer", "Krusty se Machuca" ou
"Lisa, a Vegetari ana"- nem se
esforça para sê-lo. Eu o situaria
no nível de "Empate de Titãs",
o 200º episódio, com o qual
compartilha o tema ambiental.
Em vez de tentar superar ou
resumir "Os Simpsons", o diretor do filme, David Silverman, e
os roteiristas aproveitam para
produzir algo mais longo e amplo. O formato de tela larga CinemaScope, desenvolvido pela
Fox nos anos 50 para combater
a ascensão da TV, revela ser a
forma ideal de apreciar o paraíso que é Springfield. Numa variação sobre a sequência de
abertura do seriado, vemos a cidade por novos ângulos e apreciamos sua história e beleza.
Também há cenas de multidões numa escala raramente
tentada na TV, espetáculos que
compensam o pouco tempo
concedido a personagens secundários. Todos têm algum
espaço, mas, para meu gosto, há
Ned Flanders demais e Krusty
de menos. Menos Cletus, por
favor, e mais Willie! E onde foram parar Patty e Selma? Mas
devo admitir que o filme "Comichão&Coçadinha", no início,
é um toque de pura genialidade.
Neste ponto, sinto a tentação
de repetir minhas piadas favoritas -de falar sobre a nudez
frontal de Bart, a cena de Homer e Marge no quarto, o robô
que desativa bombas e os atos
de auto-homenagem que levaram meu fã de quadrinhos interior a dizer: "Eu me lembro disso". Mas prefiro dar uma de estraga-prazeres e revelar a trama: Homer faz algo bastante
estúpido, Lisa se apaixona, Bart
se mete numa enrascada e
Marge expressa preocupação e
desaprovação. Sinto muito!
A trapalhada principal de
Homer não é mais ou menos
idiota que qualquer coisa que
ele já tenha feito (direi só que
envolve um porco). As consequências, porém, são proporcionais ao que se poderia esperar de um blockbuster da temporada do verão americano.
Envolvem Arnold Schwarzenegger eleito presidente dos
EUA, as forças de ataque de elite da Agência de Proteção ao
Meio Ambiente (EPA) e a quase
destruição de Springfield.
O diretor da EPA é dublado
por Albert Brooks, um dos colaboradores fiéis de "Simpsons".
Há poucas figurações e dublagens de celebridades: o filme
opta, corretamente, por destacar participantes regulares do
seriado. Há o Green Day numa
ótima versão da canção-tema
de Danny Elfman, mas, com essa exceção, o filme se mantém
fiel ao núcleo sólido da cidade,
da família e do misto de irreverência e sentimento que garante a longevidade do seriado.
Trabalho coletivo
Uma comédia de TV geralmente é fruto do trabalho coletivo e às vezes antagônico de
um grupo de roteiristas. É fácil
identificar o estilo gráfico e a
sensibilidade popular de Matt
Groening e intuir o humanismo aguçado e difuso de James
L. Brooks. Ao longo dos anos,
porém, dezenas de roteiristas
deixaram sua influência no seriado. Como grupo, são responsáveis pela diversidade e coerência, por pontos altos e ocasionais fases de estagnação.
Várias figuras célebres de
"Os Simpsons" aparecem nos
créditos do filme: o roteiro é
atribuído a Groening, Brooks,
Al Jean, Ian Maxtone-Graham
e George Meyer, entre outros.
Vários cumpriram o papel crucial de "diretor do show" -sinal
de que o filme significa mais para seus criadores que simples
subproduto ou reflexão tardia.
Só que, é claro, é isso o que ele
é. Dez ou 15 anos atrás, "Os
Simpsons - O Filme" poderia
ter sido visto como algo mais
ousado. Mas, apesar de toda sua
malícia e iconoclasia, "Os
Simpsons" virou uma instituição, e esse status impediu o filme de arriscar demais. Por que
mexer na fórmula quando se
pode fazer a marca crescer?
Dou a impressão de estar decepcionado? Não estou, realmente. Ou estou, sim, mas só
um pouco. Em última análise,
"O Filme" é tão bom quando
um episódio mediano de "Os
Simpsons". Em outras palavras, eu estaria disposto a vê-lo
mais umas 20 ou 30 vezes.
Tradução de CLARA ALLAIN
Texto Anterior: Rezende quer levar "medo coletivo" do PCC ao cinema Próximo Texto: Filme doi maior bilheteria das adaptações de TV Índice
|