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CINEMA/ESTREIAS
Crítica/"À Deriva"
Novo longa evidencia salto de Heitor Dhalia
Diretor cresce com filme "tateante", mas de dramaturgia convencional
RICARDO CALIL
COLABORAÇÃO PARA A FOLHA
No campeonato norte-americano de basquete da NBA (National
Basketball Association), existe
uma premiação que reconhece
o jogador que mais evoluiu na
temporada. Não o melhor, nem
o maior pontuador, mas aquele
que progrediu de maneira mais
evidente. Se houvesse distinção
semelhante no cinema brasileiro, Heitor Dhalia mereceria
o prêmio.
De "Nina" (2004), a equivocada estreia de Dhalia em longa-metragem, houve um salto
para "O Cheiro do Ralo"
(2007), que tinha virtudes e
problemas de tamanhos equivalentes. Deste último para "À
Deriva", seu novo trabalho, há
um salto ainda maior.
Dhalia é um diretor que parecer absorver os pontos de vista
de seus protagonistas. Em "Nina" e "O Cheiro do Ralo", adaptações do russo Fiódor Dostoiévski e do brasileiro Lourenço Mutarelli respectivamente,
eles eram misantropos, pessoas
que odeiam a humanidade. Deles, Dhalia herdou uma certa
aversão por seus personagens e
uma visão pronta -e bastante
negativa- do mundo.
Em "À Deriva", a protagonista é a adolescente Filipa (Laura
Neiva, em estreia luminosa),
que, durante férias de verão em
Búzios, se vê às voltas com a
descoberta do sexo e de uma
crise na relação dos pais. Enquanto tenta entender o que
sente pelos meninos da praia,
ela flagra seu pai (o francês Vincent Cassel, pouco à vontade
interpretando em português)
traindo a mãe (Débora Bloch,
que nos lembra ser uma bela
atriz de cinema) com uma turista americana (Camilla Belle). De uma hora para outra,
Filipa precisa recompor seu
mundo fora da zona de conforto e de certezas da infância.
Algo parecido acontece com
a direção de Dhalia, que trabalha pela primeira vez longe do
registro do cinismo e do distanciamento dos personagens. "À
Deriva" é um filme tateante,
tanto por buscar algo que não
sabe exatamente onde está
quanto por ter uma câmera que
acarinha a todo momento sua
protagonista. Essa indefinição
e essa ternura fazem muito
bem a Dhalia.
Nesse sentido "tátil", "À Deriva" parece tentar se aproximar do cinema sensorial da argentina Lucrécia Martel ("O
Pântano", "A Menina Santa"),
mas fica no meio do caminho
por conta de uma dramaturgia
bastante convencional, que sublinha com palavras sentimentos já devidamente sugeridos
pelas imagens. Se tivesse metade dos diálogos, o filme seria
melhor. Mas seria injusto não
notar que Dhalia deu mais um
passo largo para se tornar um
bom cineasta.
Ele já demonstra
a virtude da compaixão pelos
personagens. Agora falta o da
rarefação da narrativa.
À DERIVA
Direção: Heitor Dhalia
Produção: Brasil, 2009
Com: Debora Bloch, Laura Neiva, Vincent Cassel
Onde: em cartaz no Espaço Unibanco
Pompeia, Reserva Cultural e circuito
Classificação: 14 anos
Avaliação: bom
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