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RÉPLICA
O rock gaúcho de volta ao divã
THEDY CORRÊA
ESPECIAL PARA A FOLHA
No último dia 24 a Ilustrada
publicou reportagem que
alimentava a dogmática tese de
que a música gaúcha, em especial
o rock, padecia de um isolamento
em relação à produção musical do
resto do Brasil. Baseado em depoimentos e informações que
apenas ratificam de forma positiva a força da cena roqueira no Rio
Grande do Sul, o texto leva a crer
que o mercado é resistente ao
rock gaúcho. Algumas considerações tornam-se necessárias e
apontam para uma tese nova e,
possivelmente, mais próxima da
realidade.
Primeiramente, é vital que se
afirme que o mercado de shows
dos grupos gaúchos não se restringe maciçamente apenas ao
seu Estado de origem.
Santa Catarina mantém um
grande circuito de shows que requisita as bandas gaúchas em
uma proporção um pouco menor
do que acontece no RS.
O fato é que nunca o rock gaúcho recebeu tão boa acolhida do
resto do país como hoje em dia.
Quando se fala que "público e crítica avalizam" os gaúchos, fica um
tanto imprecisa a definição de
mercado resistente.
O grupo Bidê ou Balde faz
shows no centro do país ancorado
em sua ótima repercussão nas rádios e com o aval de ser empresariado pelo escritório de Manoel
Poladian. A banda Ultramen tem
o clipe da sua canção "Dívida" em
alta rotação no canal por assinatura Country Music, além de já
frequentar o circuito de shows de
Belo Horizonte e São Paulo.
Dudu Marote -que já produziu Skank, Jota Quest e Pato Fu-
produziu também o recém-lançado disco da Comunidade Ninjitsu
(Sony Music). A banda já iniciou
uma tour nacional que incluiu recentemente o Free Jazz Project, no
Rio de Janeiro. O Acústicos &
Valvulados está lançando novo
trabalho produzido por Henrique
Portugal e Haroldo (Skank) e tem
suas músicas executadas em rádios de São Paulo e do Rio.
O Nenhum de Nós voltou à cena
nacional com o recente lançamento do disco "Histórias Reais
Seres Imaginários" (Sony Music),
cuja primeira música de trabalho,
"Amanhã ou Depois", foi uma
das mais executadas nas rádios
brasileiras nos últimos meses.
O Engenheiros do Hawaii
-banda inexplicavelmente omitida na reportagem da semana
passada- segue a tour nacional
do seu lançamento ao vivo (CD e
DVD), já tendo alcançado o disco
de ouro com ele.
Esses são exemplos evidentes de
que o alegado "preconceito" é infundado. O suposto isolamento
em relação ao centro do país é
contrariado pelo forte intercâmbio de nomes "nacionais" com os
artistas gaúchos. Intercâmbio este
expresso por parcerias, participações em discos e regravações.
O Ira! regravou "Bebendo Vinho", de Wander Wildner; Pato
Fu regravou "Eu", de Frank Jorge;
Roberto Frejat participou do mais
recente disco da Bandalheira; Rodolfo (ex-Raimundos) gravou
com Maria do Relento -além da
camaradagem entre Papas da Língua e Cidade Negra, Comunidade
e Planet Hemp, Bidê e Marcelo
Nova-, só para citar alguns...
É correto afirmar que a força e a
estabilidade da cena gaúcha estão
amparadas no apoio das rádios e
num público fiel que alimenta um
sólido circuito de shows, mas isso
não fez, de forma alguma, com
que os artistas virassem as costas
ao resto do país.
Com frequência a imprensa do
centro do país ressuscita o "movimento separatista" -que os próprios gaúchos abominam- e alguns cronistas até mesmo cunham teses paranóicas sobre o
motivo que levou o grito "Ah, eu
tô maluco!" ter sido adaptado para "Ah, eu sou gaúcho!".
Os gaúchos têm uma afetividade com o lugar em que vivem que
em nada difere dos baianos em relação a Salvador ou dos cariocas
em relação a Copacabana. A própria imprensa do RS alimenta,
por vezes, uma espécie de autocomiseração que tenta justificar o
isolamento-preconceito.
Chegou a hora de dizer: "Basta!
Isto é passado!". Na verdade, já
não há mais certeza de que um dia
foi... Seria mais lúcido avaliar o
que acontece com o rock gaúcho
no contexto dos rumos do rock
nacional como um todo. Tragédia, ausência, insucesso, crise
ideológica e artística e até crise de
energia, mas, daqui para a frente,
estamos todos no mesmo barco!
Thedy Corrêa é vocalista da banda Nenhum de Nós
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