São Paulo, domingo, 31 de agosto de 2008

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Mônica Bergamo

bergamo@folhasp.com.br

champanhe? não

Patrícia Stavis/Folha Imagem
Os publicitários Cae Segula, 27, e Renata Decoussau, 26, que participaram da aula de cervejas na associação de sommeliers, repetem a degustação no bar Anhanguera, em SP

Cervejas superpremium, que chegam a custar R$ 280 e são servidas em garrafas de espumante, são incorporadas aos cardápios dos restaurantes estrelados de SP, cujos clientes apreciam sabores com "fino aroma de limão" e "toques frutados"

Noite de degustação na Associação Brasileira de Sommeliers (ABS), um dos centros de estudo do vinho mais respeitados de SP. Um grupo de 35 pessoas gira suas taças no ar, leva o nariz em direção ao líquido para identificar seus aromas. Prova um gole. Arrisca palpites. "Tem um toque "herbal", condimentado", diz um participante. "A espuma é diáfana", fala outro. Ops, espuma? Sim. Trata-se de uma degustação de cervejas especiais e não de uma aula de vinho. À frente da turma, a mestre cervejeira e editora da revista especializada no assunto "Beer Life", Cilene Saorin, explica: "Há mais de 120 estilos de cerveja e mais de 60 variedades de lúpulo", substância que dá "o amargor, a adstringência e algumas notas florais, "herbais", frutadas e cítricas" à bebida. Até o fim da noite serão testados sete rótulos vindos da República Tcheca, Austrália, França, Alemanha e Bélgica.

 

Banidas por muito tempo dos restaurantes estrelados de São Paulo, as cervejas -superpremium, bem entendido - começam a ganhar lugar de destaque nos cardápios. É o caso da "dark ale" belga Gouden Carolus Cuvée van de Keiser 2000, que custa R$ 280 e é a estrela da carta do hotel Emiliano. Produzida uma vez ao ano, em quantidades limitadas, é "ideal para acompanhar carnes de caça". Safrada, fechada com rolha, ela tem "aromas semelhantes ao do vinho do Porto", segundo o sommelier da casa, Benedito Filho. Ele diz que as vendas da bebida subiram 35% neste ano. "Eu mesmo gosto de tomar uma boa cerveja de vez em quando", diz ele, enquanto serve outra marca premium, a Cuvée Prestige Deus 2005, um "vinho de cevada", como diz, com produção anual de 15 mil garrafas e "notas cítricas, de mel e de especiarias", vendida a R$ 210 a garrafa.

 

O sommelier Manoel Beato, do Fasano, por sua vez, já prepara a entrada de alguns rótulos belgas e de microcervejarias nacionais no cardápio do tradicional restaurante. "As pessoas começaram agora a conhecer cervejas sérias e têm se interessado muito. Elas entram como opção de bebida especial", diz. O Rubaiyat, o A Figueira e o Le Petit Trou também reforçaram suas ofertas superpremium.

 

Há pouco mais de um mês, o Barbacoa lançou uma carta de cervejas com 37 variedades cheias de corpo. Entre elas está a canadense Unibroue "16", uma "strong ale de cor rubi" com "fino aroma de limão e toques florais", de R$ 95; a belga Duvel Strong Golden Ale, de R$ 74; e a brasileira Eisenbahn Lust, de R$ 79, "a primeira do Brasil feita pelo método champenoise", o mesmo utilizado para fazer vinho espumante. Ela chega à mesa em garrafa estilo champanhe, com direito a rolha de cortiça a ser espocada na frente do cliente, e é servida em uma flûte "que concentra melhor os aromas", diz Ramon Mosquera, gerente da casa.

 

No bar Frangó, da Freguesia do Ó, pioneiro na oferta de cervejas diferenciadas, em geral importadas, a oferta de marcas superpremium cresceu 16% e já ultrapassa a marca dos 250 rótulos, todos devidamente apresentados ao público por um "beer sommelier". No Anhanguera, na Vila Madalena, o cardápio com 70 rótulos apresenta criações de microcervejarias nacionais. Até mesmo na padaria Tortula, no Brooklin, a geladeira de cervejas gourmet já conta com 220 opções.

 

Segundo o instituto Nielsen, o mercado de cervejas gourmet cresceu duas vezes mais do que o de cervejas normais do ano passado para cá. Com a queda do dólar, houve maior importação de variedades diferenciadas, incremento da produção e distribuição das microcervejarias brasileiras.

 

Assim como acontece com os vinhos, cada tipo de cerveja pede uma determinada temperatura e taça na hora de ser degustada. "O estupidamente gelado é uma estupidez, porque amortece as papilas e não permite que se sinta todo o potencial da cerveja", explica a mestre cervejeira Cilene. Segundo ela, a graduação térmica pode ir de 2ºC, em alguns casos especiais, a 13ºC. "Servir uma "belgian strong ale", por exemplo, abaixo dessa temperatura seria como colocar um Romanée-Conti no congelador", diz ela. No caso das taças, é preciso contar com a ajuda de um especialista. "Há cervejas que pedem uma taça mais longa, outra mais bojuda, outra mais fechada, de acordo com sua personalidade", ensina.

 

"O vinho abriu caminho para esse interesse no Brasil. Na Europa, a harmonização de comida com cerveja acontece tanto quanto com vinho", diz o publicitário Washington Olivetto. No mês passado, ele e mais 50 "formadores de opinião" participaram de um jantar comandado pelo chef Alex Atala, que tinha os diferentes estilos da cerveja Baden Baden como principal ingrediente -um deles, a Tripel. "O residual bem doce da cerveja vai combinar com o adocicado do abacaxi [presente no prato]. E o álcool elevado [14%] vai ajudar a quebrar a gordura do creme de leite", explicava o chef, conduzindo a harmonização.

OS DIFERENTES TIPOS DE CERVEJA

Ale
De alta fermentação. Gera cervejas mais aromáticas, frutadas e condimentadas, como as weiss (de trigo), as stouts e as porters

Larger
De baixa fermentação. Traz notas "herbais", florais e cítricas, além de café e chocolate. Dá origem às bocks e às pilsens

Lambic
Bem ácida. Pode fermentar por até três anos

Tripel
Cerveja feita com três tipos de grãos ou três fermentações. Frutada e condimentada


Reportagem JULIANA BIANCHI


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