São Paulo, segunda-feira, 31 de outubro de 2005

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"O FATALISTA"

Diretor comparece ao evento com filme e como júri para fazer defesa do cinema autoral

Botelho explica "marca poética" portuguesa

PAULO SANTOS LIMA
COLABORAÇÃO PARA A FOLHA

João Botelho é, ao lado de Manoel de Oliveira, João César Monteiro e meia dúzia de outros, uma das raríssimas naus da esquadra de cineastas portugueses que consegue atracar em festivais de cinema internacionais. A mesma, também, que cruza o Atlântico, repetindo Pedro Álvares Cabral, e chega ao Brasil com filmes ou integrando o júri da 29ª Mostra Internacional de Cinema de SP.
Caso de Botelho, que traz ao festival o seu mais recente filme, "O Fatalista", baseado livremente no livro homônimo de Diderot, falando sobre um chofer que relata ao seu patrão suas aventuras amorosas, entre parada e outra na estrada. A grande questão, aqui, é discutir sobre o papel do narrador e sobre o cinema.
"Diderot é o pai da narrativa moderna, seu fatalismo é libertário. Meu filme celebra, sobretudo, a liberdade", conta Botelho. Sobre os textos clássicos que habitam sua filmografia, que conta até com releitura homônima de "Tempos Difíceis", de Charles Dickens, ele diz que são "pré-textos" para falar sobre coisas que o interessam, como nos cutucar sobre a condição atual de seu país.
Sobre o mito de dom Sebastião, item freqüente nas artes lusitanas e presente em "Quem És Tu" (01), Botelho diz que "o mito interessa, mas não a solução deste mito, e a pergunta do filme é "o que é Portugal hoje?'". Seus filmes, feitos sob total liberdade, têm mais a ver com outra tradição portuguesa, a poesia. "O nosso cinema tem muita marca poética, mais do que de prosa, portanto menos narrativa e mais contemplação." Isso se pronuncia desde seu primeiro longa, "Conversa Acabada" (82), e trespassa obras como o radical "Três Palmeiras" (94), o distópico "Tráfico" (98) e o besteirol "A Mulher que Acreditava Ser Presidente dos Estados Unidos" (03).
"Só podemos nos firmar neste mundo globalizado impondo nossa diferença", brada. Que está numa similitude do modo de produção, que é artesanal e permite "autoralidades". O custo médio de um filme, nos diz Botelho, fica em US$ 750 mil (R$ 1,7 milhão), levando uma média de 35 mil espectadores às salas. Uma superprodução, algo escasso nos últimos anos, após uma década que se tentou uma indústria cinematográfica, custa por volta de US$ 1,5 milhão (R$ 3,4 milhões), mas resulta em trabalhos menos atraentes ao gosto popular do que os longas norte-americanos, que ocupam hoje 89% das salas.
"O cinema mais comercial de Portugal é o de Manoel de Oliveira, porque vai aos festivais internacionais e é exibido nas TVs, fazendo 40 mil espectadores no país e o triplo no estrangeiro", conclui Botelho, cujo próximo projeto é fundir os escritos do "Evangelho Segundo São Marcos" e Machado de Assis.


O Fatalista
Direção: João Botelho Quando: hoje, às 15h50, no Frei Caneca Arteplex


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