São Paulo, sábado, 31 de outubro de 1998

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"Lulu" é filme de (auto) referências

CECÍLIA SAYAD
da Redação

"Lulu sobre a Ponte", primeiro longa dirigido exclusivamente pelo escritor norte-americano Paul Auster (que dividiu a direção de "Sem Fôlego" com Wayne Wang e assinou o roteiro de "Cortina de Fumaça"), é antes de tudo um filme cheio de referências.
O longa, que será exibido na programação extra da Mostra hoje, trata da história de Izzy (Harvey Keitel), um saxofonista famoso que é baleado e precisa deixar de tocar. A vida, para ele, passa a não fazer mais sentido.
Até que Izzy vê na rua um cadáver e remexe seus pertences; entre eles, uma caixa com uma pedra. Intrigado, leva a pedra para casa e nota que ela tem dons misteriosos.
Junto à pedra há um guardanapo com um número de telefone. Buscando uma conexão com o objeto, Izzy telefona e descobre que o número pertence a Celia (Mira Sorvino), uma jovem atriz.
É então que sua vida dá uma reviravolta -e que começam as citações. A começar pela auto-referência. A obra de literária de Auster é permeada de personagens que têm suas vidas transformadas por eventos que, de tão abruptos, parecem casuais, mas são de tal forma determinantes e inevitáveis que assumem caráter de obra do destino, quando não de fantástico.
Em "Palácio da Lua" e "A Música do Acaso", por exemplo, o elemento transformador é uma herança. Não é muito diferente nesse "Lulu", em que a pedra encontrada pelo músico surge como uma bênção num momento de desespero -Izzy apaixona-se por Celia e encontra na atriz um novo sentido para sua vida, "destruída" pelo fato de ter que abandonar a música.
Mas a posse do objeto tem um preço. Celia é chamada para interpretar Lulu no cinema -papel que faz referência à peça "Lulu - O Espírito da Terra", de Paul Wedekind, e ao filme de Pabst, "Lulu - A Caixa de Pandora". As gravações são em outra cidade, Izzy lhe confia a pedra e tudo muda para pior.
É a vez de o mito de Pandora entrar em jogo -de acordo com a tradição grega, foi ela que, desafiando ordens divinas, abriu a caixa que lhe fora confiada, transformando o destino da humanidade.
O filme é envolto numa atmosfera onírica que dá a sensação de que nada é o que parece ser. Auster parece pouco se importar. Do mito, afinal, o importante é o que se conta, e não se realmente existiu.
˛

Quando: hoje, às 12h, no Masp (grande auditório)



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