São Paulo, sábado, 31 de outubro de 1998

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"Folias" fica entre o musical e o proselitismo

da Reportagem Local

O título leva ao cineasta italiano Federico Fellini, bem como a situação da peça: uma filmagem é perturbada pela chegada de um personagem singelo e desmistificador de nome Ninguém, que lembra João Grilo e outros da tradição do teatro popular.
Mas "Folias Fellinianas" está mais para o circo pobre e algo grotesco, próprio da miséria brasileira e já retratado na montagem anterior do diretor Marco Antonio Rodrigues, "O Assassinato do Anão", de Plínio Marcos, do que para o cinema lúdico que se relaciona costumeiramente a Fellini.
O tema de fundo é o Brasil, a identidade nacional, e a palavra-chave, como repete várias vezes o texto, é "resistir".
Em cena, opõem-se dois caminhos: o de Ninguém, que é um carteiro (o qual, aliás, também lembra muito o personagem de Massimo Troisi no filme "O Carteiro e o Poeta"), e o de Brasil, tornado a estrela do filme-dentro-da-peça e que seria, no dizer do cineasta da peça, "o homo brasilis do século 21". Brasil, o personagem, interpretado com vigor e sensualidade por Rogério Bandeira, é uma alegoria semifascista de um tempo de dominação do capital, "um homem novo, um homem que seja um produto vendável". É preciso "resistir", assim, a este novo "homo brasilis".
A mensagem política carregada e a estética grotesca tornam "Folias Fellinianas" um espetáculo, por vezes, discursivo e mesmo desagradável. Mas é flagrante que a encenação faz o possível para erguer um espetáculo também de prazer, até de entretenimento.
E não tem poucos trunfos para isso, a começar dos vários talentos de Renata Zhaneta, que faz Ninguém com grande empatia e chega a cantar, com afinação e graça -ainda que com uma voz de pouco alcance, o que um simples microfone resolveria, até porque não se trata de show e sim de teatro.
Os vários números musicais, deste que é um musical de fato, são todos bem cuidados e integrados tanto à trama como à própria encenação, com atores instrumentistas e cantores. É uma pena que se percam muitas vezes, na longa apresentação, em meio ao proselitismo, por mais inteligente e bem articulado que este seja. (NS)
˛

Peça: Folias Fellinianas
Texto: Reinaldo Maia
Direção: Marco Antonio Rodrigues
Direção musical: Sérgio Villafranca
Com: Renata Zhaneta, Rogério Bandeira, Guilherme Santánna e outros
Quando: qui. a sáb., às 21h; dom., às 19h
Onde: Teatro Aliança Francesa (r. General Jardim, 182, tel. 011/259-0086)
Quanto: R$ 10 (qui.) e R$ 20 (sex. a dom.)




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