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Dip exalta o cotidiano em "Por Água Abaixo"
da Reportagem Local
"Por Água Abaixo" não chega a
uma hora de apresentação. Também não conta bem uma história,
embora tenha a sua inspiração em
fato real. É um monólogo à primeira vista despretensioso, leve, passageiro. Mas é um momento de felicidade no teatro.
Naquele tempo tomado por um
balé de contorcionismo e por pensamentos sobre o cotidiano, sobre
a cozinha, o guarda-roupa, descobre-se sob a própria falta de crédito na existência, sob o próprio niilismo do espectador, um pequeno
sinal de esperança.
Ângela Dip, autora e intérprete
de "Por Água Abaixo", não economiza criação para conseguir tanto
com tão pouco. Não economiza
criação, aliás, para tão pouco de
material. Em cena, um barril aberto dos dois lados e com alguns furos é quase tudo, no cenário.
Em tempo, a sinopse: uma mulher acorda e se prepara, em casa,
para algo que não fica muito claro,
mas que a própria autora, em entrevistas, adiantou ser a descida
das cataratas de Niágara num barril. É inspirado na história de Annie Taylor, que alcançou a façanha
aos 63 anos.
Mas a peça é o que acontece antes, o que se passa na cabeça dessa
mulher nas horas anteriores ao salto. Ou ainda, na cabeça de Dip. Na
verdade, é o que se passa na cabeça
de quase toda mulher ou homem,
hoje, nos tempos que correm. São
os questionamentos que se fazem,
cotidianamente, diante de uma escova de dente ou de um espelho.
Não há nada de gratuito, em "Por
Água Abaixo". Cada palavra ou
imagem que a atriz interpreta parece ganhar um significado imenso, como se fosse, cada palavra ou
imagem ou mesmo objeto mencionado, uma pequena celebração da
vida, às portas do que se avizinha
como a morte num barril.
Um pensamento leva a outro, a
partir de quase nada; por exemplo,
a partir da constatação que "o meu
tênis se suicidou", saltando da janela onde secava. Uma imagem leva a outra, da "panela de pressão"
se passa à lembrança de que "mamãe foi cremada".
A morte está ali, à espreita. Mas
não faltam pequenas piadas, nesta
que é, afinal, uma comédia. Observações como "não há vagas para
moças de fino trato... Não há mais
moças de fino trato!". Em tudo, do
texto à "coreografia", às músicas,
vê-se um esforço de perfeição que
exalta a vida.
(NS)
˛
Peça: Por Água Abaixo
Texto: Ângela Dip
Direção: Vivien Buckup
Com: Ângela Dip
Quando: sex. e sáb., às 24h. Até janeiro
Onde: Teatro Crowne Plaza (r. Frei Caneca,
1.360, tel. 011/289-0985)
Quanto: R$ 15
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