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TEATRO
Zé Celso e Uzyna Uzona encenam espetáculo na virada do ano e público faz o Coro
"Bacantes" cria o "bug do teatro"
VALMIR SANTOS
free-lance para a Folha
O diretor José Celso Martinez
Corrêa, 62, volta a passar a virada
do ano em cena, literalmente. Como no início da década de 70, em
"As Três Irmãs", de Tchecov, ele
vira a meia-noite de hoje no "corredor" do teatro Oficina. Desta
vez, revisitando "As Bacantes", de
Eurípedes.
O "bug do teatro do milênio",
como define Zé Celso, num dos
lampejos de praxe, serve de contraponto, sobretudo na cidade de
São Paulo, ao estresse milenarista
que se criou em torno da chegada
do ano 2000 (o novo século, como
se sabe, só virá em 2001).
"A melhor maneira de transformar a ansiedade coletiva é celebrar o comunismo, no sentido do
encontro comum, da festa", explica o diretor. À encenação original
de "As Bacantes" (95), ele agrega
um "grande elenco". Trata-se da
participação especial do público
no papel de Coro, o mesmo público que lotou as sessões natalinas
de "Boca de Ouro", de Nelson Rodrigues.
Como no teatro grego -e o
poeta Eurípedes (486-406 a.C.) está em sua gênese-, a multidão
surge com poder de interferência
concreta no ritmo da peça. Os espectadores vão interpretar ditirambos, os cânticos rituais que
pontuam o espetáculo (leia quadro ao lado). "São cantos quebrados na nuca e nos quadris, precursores milenares do samba, do
rap, dos coros de Dionísio, o deus
do teatro", explica Zé Celso.
A poeta e dramaturga Beatriz
Azevedo prepara a música com
sua banda há duas semanas.
Aconteceram até ensaios para os
ditirambos.
Além da "multidão" anunciada,
"As Bacantes" do réveillon promove o encontro de parte do elenco original, "os dinossauros", como brinca o diretor, com os novos atores de "Boca de Ouro". É a
chance de rever, por exemplo,
Leona Cavalli, Denise Assunção,
Fransérgio Araújo e Vera Barreto
Leite. A octogenária Renée Gumiel também faz participação especial.
"Num momento em que só se
fala em alta tecnologia, é fundamental incorporar a energia do
teatro a esse novo tempo", argumenta Leona, 28. O ator Marcelo
Drummond, 37, no papel-título
em "Boca de Ouro" e deus Dionísio em "As Bacantes", confessa
que "está a fim de festa", pura e
simplesmente. Diz que ficou empolgado com o ensaio da última
terça, por conta do envolvimento
espontâneo "de um monte de
gente que não tem a menor experiência em teatro".
Zé Celso não sabe estimar o número de pessoas (o elenco fixo soma 20 intérpretes). Mas avisa que
a participação do público é irrestrita. Mesmo quem não ensaiou
poderá engrossar o Coro. "Aqueles que trouxerem um bastão e
uma coroa de Hera estarão perfeitos", dá a dica, citando a mulher
de Zeus.
Apesar do tom de improviso, a
encenação seguirá a "linha dorsal" da história de Eurípedes, com
cerca de quatro horas de duração
na versão Uzyna Uzona. Haverá
uma cena especial minutos antes
da meia-noite. "O texto vai brincar com o eterno retorno, o círculo, a "Roda Viva" dos zeros", diz o
diretor, em uma referência à histórica montagem de 68.
Em tempo: das peças de maior
projeção religiosa do autor grego,
"As Bacantes" narra o conflito entre o deus Dionísio, filho de Zeus,
e Penteu, rei de Tebas. Este, ao renegar a divindade de Dionísio,
também conhecido como Baco
(deus do vinho), é "estraçalhado"
pelas bacantes.
"A gente provoca o mesmo delírio que o padre Marcelo. A cerimônia dele é parecida com a celebração dionisíaca do canto dançado, emocionado. Só que o nosso Marcelo pode rebolar à vontade", compara Zé Celso.
Peça: As Bacantes
Autor: Eurípedes
Quando: hoje, 22h
Onde: teatro Oficina (r. Jaceguai, 520,
Bela Vista, tel. 0/xx/11/ 3106-2818)
Quanto: R$ 20
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