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LITERATURA
Escritor angolano, autor de 14 livros e admirador de Graciliano Ramos, lança novo romance no Brasil em 2003
"Guerra foi o melhor tempo da minha vida", diz Pepetela
CARLOS BRAZIL
FREE-LANCE PARA A FOLHA
"Eu costumo dizer que deve ter
sido o melhor tempo da minha vida." O leitor é desafiado a adivinhar a qual período da vida se refere o autor dessa frase. Talvez fale
da infância? O período universitário? Ou poderia estar pensando
na época em que viveu fora de seu
país? Muitas suposições podem
ser feitas, mas, dificilmente, o leitor irá pensar no fato histórico
que suscitou tal frase: a guerra.
O melhor período da vida de
um dos expoentes da literatura de
língua portuguesa, o escritor angolano Artur Carlos Maurício
Pestana dos Santos, conhecido
como Pepetela, foi justamente, segundo suas palavras, durante sua
atuação como guerrilheiro pela libertação de Angola do colonialismo português, nos anos 60 e 70.
Difícil acreditar? "Tem gente
que fica muito admirada quando
eu digo isso, mas é verdade. Quer
dizer, foi talvez o único momento
em que eu estava tranquilo. Tranquilo neste sentido: é claro que estava em uma situação de guerra,
situação de perigo, temendo pela
vida, mas estava tranquilo, pois
sabia que fazia aquilo que era preciso ser feito", explica.
Curioso ouvir tais palavras desse homem que demonstra serenidade em seus 61 anos, com sua
barba grisalha, baixa estatura,
sorriso tímido e que é um dos
grandes nomes da literatura lusófona, consagrado com o Prêmio
Camões de 1997. Hoje, porém,
suas armas são as palavras.
Pepetela -que chegou a ser vice-ministro da Educação em seu
país- é um homem de oposição
ao atual governo angolano, liderado pelo mesmo MPLA (Movimento Popular para a Libertação
de Angola) do qual participou da
gênese. Diz não acreditar que "a
política neoliberal e globalizante
adotada sob a supervisão do FMI"
por Angola solucione as mazelas
de sua população.
Mas, segundo o autor, há esperança para o país após o fim da
guerra civil -que durou 27 anos
e terminou em 2002. "Hoje está
evidente para todo o mundo que a
presença de Jonas Savimbi [líder
rebelde da Unita, União Nacional
pela Independência Total de Angola" impedia Angola de chegar à
paz. E tudo indica que com a morte dele, essa paz veio para ficar. A
partir de então, tudo é possível."
Por outro lado, há o fantasma
do isolamento internacional.
Mesmo assim, não deixa de criticar o que afirma ser um dos males
da atualidade: "O mundo está cada vez mais adepto da divisa "cada
um por si, a globalização por todos" -e essa globalização é apenas a internacionalização desenfreada da luta pelo lucro".
Sobre a eleição de Luiz Inácio
Lula da Silva como presidente do
Brasil, Pepetela diz esperar uma
aproximação maior com Angola,
principalmente na área cultural.
"Normalmente pensamos que os
poderes de esquerda são mais receptivos à atividade cultural e ao
intercâmbio."
Autor de 14 livros, Pepetela se
diz influenciado por brasileiros
como Jorge Amado, Erico Veríssimo e Graciliano Ramos, entre
outros. Desses títulos, apenas "A
Geração da Utopia" e "A Gloriosa
Família" seguem em catálogo no
país, ambos pela Nova Fronteira.
Pepetela planeja lançar aqui, em
março de 2003, pela editora Record, seu mais recente trabalho,
"Jaime Bunda, Agente Secreto",
romance policial que conta com
humor aventuras de uma espécie
de "James Bond" angolano.
E os novos trabalhos? "Neste
momento estou trabalhando em
um novo livro, mas ainda não está
suficientemente avançado para
falar sobre ele. Apesar de não
acreditar em feitiços, devo reconhecer que falar antes do tempo
sobre um livro em que se trabalha
pode dar azar...", diz.
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