São Paulo, sábado, 31 de dezembro de 2005

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Teatrólogo Gianni Ratto morre aos 89 anos

Italiano radicado no Brasil desde 1954, diretor trabalhou com Maria Della Costa e Fernanda Montenegro

DA REPORTAGEM LOCAL

O teatrólogo Gianni Ratto, um dos mais respeitados cenógrafos e diretores do teatro brasileiro, morreu ontem à tarde, aos 89 anos, em São Paulo, vítima de um câncer na bexiga. Velado ontem, em sua casa, no bairro do Pacaembu, o corpo será cremado na manhã de hoje, na Vila Alpina, segundo informou Kati Almeida Braga, sua ex-mulher.
Ator, diretor, cenógrafo e iluminador, Gianni Ratto nasceu em Milão, na Itália, em 1916. Foi vice-diretor técnico do Scalla de Milão e trabalhou com nomes como Igor Stravinski antes de se transferir para o Brasil, em 1954, a convite da atriz Maria Della Costa, para dirigir "O Canto da Cotovia", um drama do francês Jean Anouilh que inaugurou o teatro que recebeu o nome da atriz, em SP.
No palco, sob a direção de Ratto, Della Costa contracenava com Sérgio Britto, Eugênio Kusnet, Fernanda Montenegro e Fernando Torres, entre outros.
Em entrevista à Folha, em 2004, Della Costa lembrou seu encontro com Ratto. "Fomos à Itália em 1953, com a cara e a coragem, eu e Sandro [Polloni, seu marido]. Dois jovens que não tinham um tostão, praticamente. Chegamos a Milão e nos disseram que o Ratto era um dos sete melhores cenógrafos do mundo. Conversamos com ele, explicamos que estávamos terminando de construir o teatro. Ele aceitou. Chegando aqui, começamos os ensaios da única peça que ele trouxe debaixo dos braços: "O Canto da Cotovia". Calhou comigo no papel de Joana d'Arc, desbravando um teatro ali numa travessa da av. 9 de Julho, onde era tudo mato."
O crítico teatral Sábato Magaldi também destacou a importância que Ratto já tinha adquirido antes de vir ao país. "Em primeiro lugar, temos de lembrar que o Gianni era o mais importante cenógrafo de teatro italiano quando ele veio para o Brasil. (...) Ele se identificou muito com o país", afirmou ontem o crítico.
A diretora Ariela Goldmann, para quem Ratto fez diversos cenários, lembrou a generosidade do teatrólogo. "Estamos perdendo uma pessoa muito generosa. Ele teve uma importância crucial na cultura brasileira, pois ensinava gerações. Estava interessado no porvir. Aprendi com ele que a primeira pessoa que tinha de ficar satisfeita com o meu trabalho era eu mesma", disse.
Gianni Ratto também trabalhou em diversas óperas, colaborando com os teatros municipais de São Paulo e do Rio de Janeiro. Criou figurinos para cerca de 50 produções e, para muitas delas (como "Elixir" e "Suor Angelica"), assinou também cenários e direção de cena. Em outubro passado, teve uma exposição de seus figurinos no Teatro Municipal de SP.
Em setembro de 2004, Ratto recebeu o título de cidadão paulistano, concedido pela Câmara Municipal de São Paulo em reconhecimento a seu trabalho no teatro nacional. Em outubro do mesmo ano, foi homenageado pela Associação dos Produtores de Espetáculos Teatrais do Estado de São Paulo com o Prêmio Apetesp, por sua contribuição para o desenvolvimento do teatro paulista nos últimos 50 anos.

Documentário
"A beleza é uma meretriz que se entrega facilmente a santos e assassinos", escreveu Ratto no livro de memórias "A Mochila do Mascate" (ed. Hucitec, 1996). A obra inspirou documentário de mesmo nome exibido na última Mostra Internacional de Cinema de São Paulo -deve estrear no primeiro semestre de 2006-, com roteiro de sua filha, Antonia Ratto, 29, em parceria com a diretora Gabriela Greeb. No filme, acompanhado de Antonia, Ratto refaz o percurso de sua vida, passando por Gênova, Milão, Florença, São Paulo e Rio de Janeiro.
Além das memórias, Ratto tangenciou a ficção em "Noturnos" e "Crônicas Improváveis" (ambos da ed. Códex), discorreu sobre ofício em "Antitratado da Cenografia" (ed. Senac) e "Hipocritando - Fragmentos e Páginas Soltas" (ed. Bem-Te-Vi).


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