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Gal confunde mensagem e cria imagens para cantar

Novo disco tem letras herméticas e bases instrumentais eletrônicas

Show, que terá direção de Caetano Veloso e poucos músicos no palco, vai estrear em março de 2012 no Rio

DO ENVIADO AO RIO

Sempre foi assim. Desde os tempos tropicalistas, e mesmo antes deles, Gal Costa esteve vinculada a pessoas que lhe deram os empurrões de que ela precisava para ir além de sua escola inicial: a do canto puro de João Gilberto.

Caetano e Gil foram exemplares disso nos anos 1960. O poeta Waly Salomão fez o mesmo em "Fa-Tal", o emblemático show de 1971, e de novo em "Plural", de 1990. O empresário Guilherme Araújo (1937-2007) a alçou a sucesso comercial no final dos 70.

"Minha voz está a serviço dos meus amigos, das boas canções, das coisas com que estou conectada. Sempre esteve", diz. "Quando eles [Caetano e Gil] ficaram exilados [no final dos 1960], eu fiquei aqui cantando suas canções. Pouca gente tem essa capacidade de expressar a palavra musicada através da voz. Essa é a minha função."

Gal fala do assunto com serenidade. Parece acostumada à cobrança por constante renovação, por ter de novo a "atitude" que um dia teve.

Vê conexões claras entre essa sua característica e os versos de "Recanto Escuro", canção do novo álbum: "Não salto, mas sou carregada/ Por asas que a gente não tem".

"Caetano decifrou isso muito bem nessa canção", diz. E ele rebate: "Mas não foi isso o que eu quis dizer. Foi justamente o contrário. Você, quando canta, parece que é carregada por asas que a gente não tem, que mais ninguém no mundo tem".

A maior parte das letras, conforme planejado pelo compositor, são mesmo bem herméticas, enigmáticas.

"Cara do Mundo" chega ao máximo da complexidade. "Cara do mundo/ Cara de peixe-boi/ Cara de tudo/ Cara do que já foi/ Pássaro azul/ Deserto-jardim/ Presunto."

É possível cantar uma música com propriedade sem entender o que ela quer dizer?

"São imagens", ela rebate. "Você vai cantando e vendo as imagens, sem muita complicação. É som. É simples."

RIO-BAHIA

A criação de "Recanto" exigiu uma equipe no Rio e outra em Salvador.

Filho de Caetano, Moreno dirigiu Gal na Bahia. Seu pai guiou o time de músicos cariocas: Kassin, Pedro Sá, Donatinho, Davi Morais, Bartolo, Léo Monteiro e outros nomes da nova geração.

Os arranjos e as bases instrumentais foram feitos no Rio. Gal nem sequer teve contato com os músicos (chegou a confundir o repórter da Folha com Kassin, o arranjador da maior parte das faixas do disco, que ainda não conhece pessoalmente). Recebia tudo pronto em Salvador e só colocava a voz por cima.

Lembra-se, rindo, de quando recebeu as primeiras versões das bases instrumentais. "Era um tum tum tum, um booooo, um pfuuuuu", imita com a voz sons toscos de videogame.

"Perguntava: 'Moreno, mas o que é isso?'. E ele: 'Calma que ainda vai piorar'. O jeito foi abstrair do arranjo e cantar em cima do clique [espécie de tic tac que marca o andamento da música]."

Caetano promete -e Gal concorda- que o show vai ter a mesma sonoridade. Poucos músicos e muitas programações eletrônicas.

Gal não poderia imaginar que daria tamanho salto.

(MP)

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