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Análise

Com poucos recursos, filmes não podiam dar margem a erros

INÁCIO ARAUJO CRÍTICO DA FOLHA

Certa vez o contador da Marte Filmes saiu à rua com uma sacola cheia de dinheiro para ir ao banco. Foi assaltado pouco depois. O dono da Marte, Cassiano Esteves, entrou em contato com o chefe dos ladrões e, pouco depois, a sacola estava lá de volta, com todo o dinheiro.

Era meio assim a Boca do Lixo: tinha bandidos e prostitutas, mas também um código de ética que permitia uma convivência pacífica entre comerciantes e a marginália.

O cinema se dava bem com esse espírito. Era, naquela altura, os anos 1970, uma arte marginal, ninguém duvidava. O centro era a rua do Triumpho (grafia da época). Por lá circulavam todo dia diretores, técnicos, produtores e atores coadjuvantes. Atores principais, raramente.

Desde o AI-5 (ato que endureceu a ditadura, em 1968), quando o grupo que primeiro falara em "cinema da Boca" (Rogério Sganzerla à frente) se desfez, quando o espírito de uma geração que não era nem "cinema novo", nem Vera Cruz teve de se retirar, a Boca chamava a atenção pela variedade das pessoas que circulavam por ali.

Candeias, homem-orquestra, autor de filmes personalíssimos, feitos para não ser exibidos comercialmente; Mojica Marins sobrevivendo longe do terror (seus filmes foram censurados), artesãos como Jean Garrett (assistente de Zé do Caixão, o personagem) e Claudio Cunha, cineastas tradicionais, como Walter Hugo Khouri, seu ex-assistente Alfredo Sternheim, remanescentes do "cinema da Boca", como Carlos Reichenbach, críticos como Rubem Biáfora.

Não havia distinção de classe ou categoria. Todos frequentavam mais ou menos os mesmos lugares.

Naquele tempo (do fim dos anos 1960 ao começo dos 1980) não havia "captação". Alguém aparecia com uma ideia. Se o produtor gostasse, pedia financiamento a algum exibidor. Vinha um pouco de dinheiro, para uma filmagem rápida. Por isso os técnicos eram ótimos e fundamentais: não havia margem para erro.

Eficientes mas sonhadores, esses trabalhadores podiam interromper a rotina quando um filme conseguia estourar na bilheteria.


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