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Crítica Romance

Arquivo secreto da polícia da Guatemala guia ótimo livro

JOCA REINERS TERRON
ESPECIAL PARA A FOLHA

Vivemos um bom momento no que se refere à publicação de autores hispânicos no Brasil, sejam americanos ou peninsulares.

Alguns fatores contribuem para isso, como os subsídios para tradução fornecidos pelos governos espanhol e argentino, ou o aporte do Instituto Cervantes.

Com isso, o público brasileiro não tem motivos para se queixar; um exemplo é a publicação de "O Material Humano", primeiro livro do guatemalteco Rodrigo Rey Rosa no Brasil.

Rey Rosa nasceu em 1958 e pertence à categoria de narrador latino-americano que desenvolveu sua carreira no exílio, cujo paradigma máximo é Roberto Bolaño.

Mais sortudo do que o chileno, porém (que, entre outros subempregos, trabalhou como vendedor de bijuterias), quando vivia no Marrocos, o guatemalteco foi descoberto por Paul Bowles, que o traduziu ao inglês.

Em "Entre Paréntesis" (inexplicavelmente não traduzido aqui -pronto, eis uma queixa), Bolaño afirmou (ao analisar os contos do colega) que "Rey Rosa é um mestre consumado, o melhor de minha geração, uma geração, por outro lado, que deu excelentes contistas".

Contudo (e não caberia aqui uma discussão acerca do desinteresse do mercado na publicação de contos, embora fosse pertinente), "O Material Humano" é um romance, e a maestria diagnosticada por Bolaño se apresenta na forma fragmentária e exata adotada por Rey Rosa.

PESQUISA

O romance, desenvolvido ao modo de um diário que cobre três meses, relata as pesquisas feitas pelo autor no Arquivo da Polícia Nacional Guatemalteca, descoberto quase por acaso num hospital abandonado.

O arquivo (mais para um depósito bagunçado) reúne documentos (ou o que restaram deles) e registros policiais, além do Gabinete de Identificação, que procura dar ordem ao caos da memória de um país que esteve em guerra civil de 1960 a 1996.

O fio condutor (é conveniente que o narrador seja recebido por uma certa Ariadna) é a passagem de Benedito Tun pelo gabinete, diretor que introduziu métodos científicos no sistema policial guatemalteco e se demitiu por se recusar a adulterar uma autópsia com propósitos de falsidade ideológica (e eleitoreiros).

INTENÇÃO

A intenção declarada de Rey Rosa com sua pesquisa é localizar artistas perseguidos pela ditadura. Mas outras motivações surgem conforme o diário avança: a mãe do escritor foi sequestrada.

A contradição reside no fato de que os sequestradores pertenciam à militância esquerdista, e não à repressão totalitária, o que torna tudo absurdo. E como descobrir a verdade política de um país, a não ser esmiuçando suas mentiras?

JOCA REINERS TERRON é autor de "Do Fundo do Poço se Vê a Lua" (Companhia das Letras)

O MATERIAL HUMANO
AUTOR Rodrigo Rey Rosa
EDITORA Benvirá
TRADUÇÃO Josely Vianna Baptista
QUANTO R$ 29,90 (192 págs.)
AVALIAÇÃO ótimo

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