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Exposições convertem as galerias em butiques

Espaços comerciais exibem obras críticas aos mecanismos do mercado

Artistas como Lucia Koch, Jac Leirner, Anna Maria Maiolino e Tamar Guimarães invertem valores em suas obras

DE SÃO PAULO

Quando a obra da dupla Claire Fontaine, o letreiro em neón "Capitalism Kills Love", foi montado pela primeira vez, em Miami, os donos do prédio exigiram sua retirada, considerando a peça um ataque direto ao sistema econômico dos Estados Unidos.

Sem esse tipo de pudor, a galeria Nara Roesler decidiu abrir seu novo espaço na avenida Europa, vizinha de concessionárias da BMW e da Lamborghini, com esse mesmo trabalho, criando uma tensão com sua condição de espaço para vender arte.

"É uma exposição não comercial dentro de um espaço comercial", diz Patrick Charpenel, curador da mostra paulistana e da coleção mexicana Jumex, um dos maiores acervos privados do mundo. "Quase nenhuma das obras está à venda, não pensei nisso ao criar a mostra."

Julieta González, que levou Marx à galeria Luisa Strina, também diz ter pensado a mostra para um contexto comercial, ressaltando uma tensão entre arte e dinheiro.

"Pensei essa exposição como um teatro, uso o dispositivo brechtiano de expor o aparato por trás, faço os visitantes atravessarem o escritório, a reserva técnica", diz González, do Museu Tamayo Rufino, na Cidade do México.

"Todos esses artistas têm galeria, nenhum deles está fora do mercado. Não tem por que negarmos isso. Parece contraditório, mas é mostrar mesmo as obras dentro de uma butique, refletir o boom econômico de São Paulo", diz.

INVERSÃO DE VALOR

Em maior ou menor grau, artistas que abrem hoje individuais nas galerias da cidade também parecem pensar nos mecanismos por trás desse mercado em ebulição.

Lucia Koch, na Nara Roesler, exibe suas peças inspiradas num mostruário de materiais de construção -um arsenal escancarado de formas. Até os restos de suas peças de acrílico recortadas viram obra, vendidos em caixas de entulho plástico e colorido.

Na galeria Millan, Anna Maria Maiolino decidiu mostrar os moldes de suas esculturas de argila em vez das peças extraídas dali, invertendo a noção de positivo e negativo. "Resta só a memória daquela escultura", diz ela.

Jac Leirner volta a catalogar o periférico para criar o centro de suas novas obras na Fortes Vilaça. Ela cria trabalhos usando o material que serve para pendurar telas e montar instalações - cabos de aço, parafusos, prendedores, níveis de arquiteto.

"Sempre achei que esse material valesse ouro", diz Leirner. "É tentar provocar uma inversão de valores."

No galpão da Fortes Vilaça, Tamar Guimarães mostra uma fotonovela em que retrata uma festa que reuniu atores e patrocinadores de seu próprio projeto, uma alusão, ela diz, ao momento histórico em que "colecionar arte virou uma necessidade social".

Um respiro -irônico- no meio da selvageria econômica, a coletiva que a Mendes Wood abre na segunda vai contra a fúria do circuito, com obras difíceis de enxergar, claras ou escuras demais, exigindo uma pausa por parte do público. (SILAS MARTÍ)

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