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Diário de Buenos Aires

O MAPA DA CULTURA

Literatura exportada

O apoio de tradução e o bar que virou hype

DAMIÁN TABAROVSKY

TRADUÇÃO CLARA ALLAIN

EM 2010, a Argentina foi o país convidado de honra da Feira de Frankfurt. Uma longa e penosa discussão sobre a decoração do estande -com divergências sobre assuntos tão profundos quanto a conveniência ou não de se pendurar uma foto de Evita- monopolizou boa parte da atenção pública.

Longe dos holofotes da mídia, o mais interessante que essa feira deixou foi a criação, a encargo do Ministério das Relações Exteriores da Argentina, do Programa Sul, de apoio à tradução de literatura argentina a outras línguas, que oferecia até US$ 3.200 (cerca de R$ 6.400) de subsídio para traduções.

O plano foi um sucesso, e editoras de meio mundo traduziram mais 200 livros de autores argentinos de todos os estilos e as épocas.

Depois a feira terminou, e, como costuma acontecer nesses casos, não se ouviu mais nada a respeito do assunto.

Até algumas semanas atrás, quando foi anunciado o relançamento do Programa Sul, agora como política permanente do Estado, outorgando subsídios, sempre de maneira democrática.

É uma grande notícia para a literatura argentina. Agora tudo fica nas mãos dos editores estrangeiros e de seu bom gosto para fechar contratos com autores argentinos que sejam interessantes.

Editores brasileiros, façam boas escolhas!

Colunas de opinião

Juan José Becerra é um dos maiores escritores argentinos entre os contemporâneos que já passaram dos 40 anos.

Publicou vários romances; o último acaba de sair na Espanha, o que pode ser sinal de uma carreira internacional em vista (embora nenhum subsídio do Programa Sul tenha sido outorgado a traduções de obras dele).

Nos últimos anos, vem escrevendo uma coluna longa na revista "Los Inrockuptibles", versão argentina da revista francesa de dedicada ao rock, aos livros e ao cinema e dirigida a jovens ricos que querem parecer modernos (só que na França a revista é semanal e na Argentina, mensal).

Pois a coluna de Becerra é o que existe de mais interessante hoje em publicações periódicas de Buenos Aires. De política a literatura, nada escapa de seu olhar ácido, corrosivo, por vezes cínico.

Apenas um exemplo: em sua última coluna, Becerra define ironicamente o prefeito de Buenos Aires, famoso por trabalhar pouco, como um "fanático leitor de 'Bartleby'", aludindo ao personagem de Melville que dizia sempre "eu preferiria não fazer".

Vale a pena comprar a revista apenas por essa coluna.

BAR MODERNO

O San Bernardo é um bar de bairro localizado na avenida Corrientes, longe do centro, na região de Villa Crespo. Tem mesas de bilhar e de pingue-pongue, está mais para pé-sujo e é cheio de aposentados que jogam baralho.

O lugar sempre foi assim. Até pouco tempo atrás, quando, nas noites dos dias de semana, de uma hora para a outra converteu-se no centro do cenário portenho intelectual e "cool". Um reduto descolado onde, em meio às mesas de bilhar, acontecem lançamentos de livros, shows de rock e tremendos campeonatos de pingue-pongue.

Renomados poetas, editores, romancistas, jornalistas e até mesmo tietes frequentam o lugar, em especial nas noites de terça, quarta e quinta, para beber e falar de literatura, em especial.

O jornal "Clarín" já dedicou uma reportagem ao fenômeno. Confesso que sinto saudade da época em que o San Bernardo era só um bar tranquilo -quando menino, meu avô me levava até lá (a Villa Crespo é um típico bairro da comunidade judaica) aos sábados para tomar o café da manhã.

UM ENIGMA

Dois anos atrás saiu um romance intitulado "Sol Artificial", assinado por um tal J.P. Zooey, pseudônimo que evidentemente remete a Salinger. Nada se sabia sobre o autor, que não dava entrevistas nem, é claro, se deixava fotografar. Sabia-se apenas que tinha nascido em Buenos Aires em 1973. Sabíamos também, depois de ler o romance, que era ótimo. Agora o autor reaparece com seu segundo romance, "Los Electrocutados", que conserva o nível do primeiro.

Texto escrito sob a influência da entropia e da desordem, é exatamente isso que o torna sedutor: passa rapidamente de um tema a outro, de uma teoria científica falsa à história de duas irmãs, e, desta, para a música de Bach e a possibilidade de que o mar se eletrifique. Um sopro de ar fresco na nova literatura argentina. Enquanto isso, sabemos a identidade do autor sem sabê-la. Um enigma que ainda não pode ser revelado.

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