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Diário de Istambul

O MAPA DA CULTURA

Todos se importam

Hostilizado, Auster virou best-seller

CHICO FELITTI

Você não gosta de mim, mas seu povo gosta. Poderia ser essa a tréplica de Paul Auster a Recep Tayyip Erdogan, primeiro-ministro da Turquia, país que publicou antes de qualquer outro o mais recente livro do norte-americano, as memórias "Winter Journal".

Em fevereiro, o escritor disse ao diário istambulenho "Hürriyet" que não visitaria a Turquia em protesto "aos jornalistas e escritores aprisionados", referindo-se aos mais de cem profissionais atualmente atrás das grades no país, onde a liberdade de imprensa é artigo tão raro quanto na China.

Erdogan reagiu, chamando o escritor de "homem ignorante" e perguntando: "Quem se importa se você vem visitar nosso país ou não? Quem se importa com você?"

A resposta não demorou nem meio ano: o livro já teve mais de 70 mil cópias vendidas, e a sexta edição chegou há pouco às prateleiras. Passado todo esse tempo, a obra ainda encabeça a lista de mais vendidos em livrarias virtuais como a Can e a Idefix.

Leitores europeus já têm acesso às memórias de Auster, mas os americanos, conterrâneos do autor, e os brasileiros terão de esperar um pouco mais. "Winter Journal", que tem como base a relação do escritor com a mãe, está previsto para o fim deste mês nos EUA.

Já a Companhia das Letras planeja sua edição para o primeiro semestre de 2013.

NINGUÉM SOBE

Os seis minaretes da Mesquita de Sultanahmet (apelidada de Azul) poderão se manter erguidos nos céus com orgulho: com o Plano Diretor anunciado recentemente por Ertugrul Günay, ministro da Cultura e do Turismo, o horizonte de palácios e arabescos de Istambul não correrá mais o risco de sofrer a interferência de arranha-céus.

O guia de regras, ainda a ser escrito, é um compromisso para "conservar a silhueta da cidade", segundo Günay. "Por mais que lhe custe algum lucro."

A área em que prédios terão altura limitada é a península histórica, que compreende o Chifre de Ouro, onde está a ponte de Galata, e parte do estreito de Bósforo, espremido entre a Europa e a Ásia. Veja vista de Istambul do topo da ponte de Galata (bit.ly/pontegalata).

Edifícios que já tiveram a construção aprovada ou concluída não correrão riscos de sofrer limitações pelo plano, disse o ministro.

É o caso das torres (de Donald) Trump, com seus 155 m de altura, que desde sua inauguração, há um mês, veem de cima as seis torres da mesquita Azul, de 65 m de altura.

BOEMIA E DESOBEDIÊNCIA

Banidas das calçadas de Beyoglu por decreto do governo há dois anos, as mesas de bar voltam a pipocar aqui e ali no bairro, o mais boêmio da cidade.

Foi o verão começar que as mesas ressurgiram ao redor da torre de Galata, onde algumas tavernas conseguiram permissão da prefeitura.

"Depois de muito protestar, um dia veio um caminhão de fiscais e simplesmente nos entregou uma licença para recolocar as cadeiras no sereno, sem explicar uma palavra", disse um comerciante.

Outros botecos, como alguns do mercado de peixe, montam os móveis nas vielas à revelia do veto do Estado.

PARTO DE MÃO ÚNICA

A avenida Istiklal, equivalente local à Paulista, andou cheia de mulheres desacompanhadas nas últimas semanas. Mas nem valia a pena se empolgar: elas protestavam, e por um assunto que também tem causado debate no Brasil.

É que o Parlamento turco aprovou, no mês passado, uma lei que restringe cirurgia cesariana a casos de necessidade médica no país. No ano retrasado, 40% dos bebês turcos nasceram por cesárea.

"É isso, agora vão nos dizer como viver antes mesmo de nascer", disse a feminista Ipek Çorban, que desenhou uma camiseta que mostra a barriga de uma grávida levava uma placa de mão única entre as pernas.

Algumas dessas piqueteiras cobriram a cabeça com lenços. Há mesmo uma ou outra que tenha usado niqab (o tecido que só deixa ver os olhos), pois setores religiosos interpretam que o Corão não proscreve a interrupção da gravidez.

Mas o primeiro-ministro Erdogan tem uma leitura diferente sobre os direitos femininos. Semanas atrás, ele disse considerar um crime o aborto até a 12ª semana de gravidez -a prática é legalizada no país há mais de 30 anos.

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