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ENTREVISTA PETER SUNDE
software livre
Internet não é a culpada dos crimes
FISL - Confira entrevista com cofundador do Pirate Bay, site de compartilhamento de arquivos como músicas e filmes
DANIELA ARRAIS
ENVIADA ESPECIAL A PORTO ALEGRE
Peter Sunde, 30, cofundador
do Pirate Bay, foi tratado como
estrela no 10º Fisl (Fórum Internacional do Software Livre),
que ocorreu em Porto Alegre
na semana passada.
Para os cerca de 8.200 participantes do evento, o sueco
atua como um símbolo de defesa da liberdade na internet. Afinal, ele é um dos responsáveis
por um dos sites de compartilhamento de arquivos mais
acessados na rede.
Em entrevista exclusiva à
Folha, Sunde afirmou que é
preciso conscientizar mais pessoas para que elas se tornem
ativistas em relação ao compartilhamento na internet.
Quando indagado sobre os
planos futuros do site, Sunde
foi evasivo: "Muita coisa vai
ocorrer ainda, mas não posso
falar sobre isso". Ontem, uma
empresa sueca anunciou a
compra do site.
FOLHA - A Justiça considerou que o
juiz responsável pelo veredicto do
Pirate Bay não foi tendencioso. Qual
é o próximo passo que vocês darão?
PETER SUNDE - Eu vou soar como
uma pessoa que nunca desiste.
Você já assistiu a Monty
Python? Há um cara lá que não
desiste nunca. Um juiz decidindo se outro juiz foi tendencioso
já é tendencioso. Não podemos
mais apelar. A única maneira
de conseguirmos isso é recorrendo à União Europeia de Direitos Humanos. Agora vamos
ver se a Anistia Internacional
nos ajuda. É um processo que
vai levar cinco anos, por aí. A
decisão é totalmente errada.
Eles estão falando sobre eles, e
não sobre a situação.
FOLHA - Christian Engström, do Pirate Party, disse que a decisão mostra que a única maneira de vencer
essa batalha é por meio da política.
Você concorda com ele?
SUNDE - Nós precisamos mudar a política a longo prazo. A
curto prazo, precisamos ser ativistas para quebrar o sistema
ou modificá-lo para que ele
funcione da maneira como deve funcionar. O que nós fazemos é desobediência civil legal.
Nós não infringimos a lei. Nós
fazemos coisas que ainda são
legais e não devemos ser condenados. Temos que incentivar
mais pessoas a agirem contra
esse tipo de coisa. Precisamos
de pessoas se rebelando e dizendo que isso é errado.
FOLHA - Você não teme ser preso?
SUNDE - Não serei preso. Vamos recorrer e vencer no final.
Até agora, o juiz não disse o motivo de nossa condenação.
FOLHA - Você acredita que as pessoas estão começando a ficar preocupadas com as consequências de seus atos na internet?
SUNDE - As pessoas estão de saco cheio de ouvir grandes corporações dizendo como elas
devem agir. É ruim para a sociedade ter poucas companhias
muito ricas dizendo como elas
devem ou não devem agir. Não
é produtivo. E o Pirate Bay se
tornou o símbolo disso.
FOLHA - Você acha que advogados
e juízes ainda não sabem lidar com
questões ligadas à internet?
SUNDE - Eles não entendem sobre tecnologia. E ainda dizem
que ela não é tão ou mais importante do que a lei. A maioria
dos juízes é muito velha, provavelmente vai ser trocada, em
breve, por novos juízes que têm
experiência no assunto. A tecnologia de hoje em dia é muito
avançada para aqueles que se
formaram há 30 anos. Enquanto isso não acontece, temos que
atuar como ativistas.
FOLHA - Como você enxerga as críticas de grandes corporações ao
compartilhamento na internet?
SUNDE - Elas não têm opção.
Ou mudam ou vão perder ainda
mais espaço. Elas têm que adotar novas tecnologias, inventar
outras também. Elas não têm
um problema de dinheiro, mas
um problema de controle. As
vendas continuam altas, não
tanto em suporte físico, mas
elas ganham dinheiro com licenciamentos para televisão,
rádio. Mais gente usa a mesma
música em diversos suportes.
No final, elas sabem que estão
perdendo controle sobre como
o conteúdo está sendo espalhado. E isso as assusta.
FOLHA - E a atitude dos artistas sobre o mesmo assunto?
SUNDE - São artistas que não
produzem há muito tempo
aqueles que se contrapõem ao
compartilhamento de arquivos. Prince e Village People
tentaram processar a gente.
Nenhum deles está fazendo
música desde os anos 1980.
Mas eles se incomodam por
não vender coletâneas de melhores sucessos.
No entanto, sem a internet,
os novos músicos não seriam
nada -ela abriu possibilidades.
As pessoas não vão pagar pelo que já pagaram. Em que tipo
de trabalho você ganha dinheiro toda vez que alguém usa o
que você fez? É assim que o
copyright atua. Por 70 anos, você paga todas as vezes que usar
uma obra. Imagine se você tivesse uma casa e precisasse pagar US$ 1 a cada vez que entrasse nela? Não estou dizendo que
as obras não devem ser pagas,
mas sim que a forma como elas
são pagas deve ser revista.
FOLHA - O que você achou da quase aprovação da lei antipirataria
francesa?
SUNDE - O que aconteceu é
realmente estúpido e mostra
como os políticos não têm a
menor ideia do que é a internet.
Se alguém entra na sua casa e
rouba alguma coisa, você não
consegue bloquear a rua por
onde ele passou. O mesmo
acontece com a internet. Se alguém faz algo supostamente
ilegal, você não pode bloqueá-la. A internet não é a razão pela
qual as pessoas cometem um
crime, é apenas uma conexão.
Você tem que consertar os problemas da sociedade para que
as pessoas não cometam crimes, e não dizer que o meio que
elas usam para isso é ilegal. A
internet é a forma de comunicação das novas gerações. Nenhum crime iria desconectar
você da internet por um ano.
FOLHA - E como fica a imagem do
presidente francês, Nicolas Sarkozy,
após esse episódio?
SUNDE - Ele não liga para democracia. É um ditador. A mesma coisa ocorre na Itália. E são
essas pessoas que estão decidindo como as pessoas se comunicam. Os governos conseguem maneiras fáceis de fazer
vigilância, como ocorre na China ou na Coreia do Norte. Eles
não entendem sobre liberdade
e democracia, e sim sobre dinheiro e controle.
FOLHA - A política o atrai?
SUNDE - Não. Não entraria na
política porque nunca seria organizado. Uma das coisas que
eu mais quero combater é
aqueles que dizem que somos
[o Pirate Bay] organizados. Não
somos. Somos desorganizados
como o diabo. Acredito que não
posso falar sobre os valores de
outras pessoas nem sobre o que
elas acreditam, por isso não poderia ser candidato. Quero que
as pessoas pensem por si mesmas, se imponham.
FOLHA - Você costuma baixar muito conteúdo? Tem uma conexão rápida e muito espaço no disco rígido?
SUNDE - Baixo o que me der
vontade. Minha conexão é bem
rápida, como a da maioria das
pessoas na Europa. Acho que
um desafio de hoje em dia é lidar com a quantidade de informação disponível. Então, nem
sempre armazeno tudo -baixo
de novo quando dá vontade.
FOLHA - Se você fosse ouvido pela
indústria do entretenimento, que
conselho daria para que ela saia do
estado em que está?
SUNDE - Diria para eles se inspirarem no Swedish Model
(www.theswedishmodel.org), organização que reúne
gravadoras para repensar o futuro da música. Em vez de brigar com a internet, eles querem
usar as mil possibilidades que
ela oferece. E, claro, conseguem ganhar dinheiro assim.
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