São Paulo, quarta-feira, 02 de junho de 2004

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DESATE-SE

Repórter aceita desafio de viver 30 dias conectado à internet sem cabos e conclui que vida wireless faz pouca diferença

Leigo livra-se de fios para conectar micro

WILLIAM GRIMES
DO "NEW YORK TIMES"

A missão era simples. Experimentar o mundo wireless e escrever sobre isso. Fantástico. Uma pergunta: o que é wireless?
Essa tecnologia sem fios apareceu do nada. Com ela, eu poderia perambular por minha casa ou pelo quintal e acessar meus e-mails de um laptop. Com um toca-DVD sem fios, poderia pegar música do meu PC e reproduzi-la na TV de cristal líquido.
Eu estava disposto a dar uma chance ao mundo sem fios. Outras tecnologias tinham melhorado minha vida. Controles remotos e celulares são sem fios. Quem sabe, transformando minha casa em uma Xanadu sem fios, eu poderia abrir uma porta para prazeres eletrônicos incontáveis, poupar tempo e atingir uma meta acalentada: jamais sair de minha poltrona.
Alistei-me para a experiência e concordei em viver por um mês em um mundo sem fios.
O primeiro passo foi adquirir um roteador (ponto de acesso) sem fios. O nome não significava nada para mim, mas a figura na caixa, sim. Com suas duas antenas, um ponto de acesso se parece com o que é: orelhas de coelho que captam os sinais de dispositivos remotos e os transmitem para o computador. Com as instruções de uma das equipes de suporte técnico do jornal, iniciei minha viagem pela estrada sem fios.
Instalar o ponto de acesso foi rápido. O passo-a-passo em um CD era à prova de idiotas, quer dizer, até eu seria capaz de segui-los. Agora meu micro estava pronto para receber sinais wireless.
Meu ThinkPad IBM veio equipado com placa wireless, poupando-me de aborrecimentos.
Para me conectar à internet, bastou ligar o laptop e clicar em um ícone que ativava meu agente de rastreamento wireless, um nariz farejador eletrônico chamado Segue, que detecta os canais wireless disponíveis na região.
O laptop automaticamente fez contato com meu ponto de acesso e eu podia perambular conectado.
Para testar o seu alcance, desci para o porão. A conexão continuou estável. Levei meu laptop para o fundo do meu quintal, a cerca de 23 metros de distância do ponto de acesso. Espantoso. Acessei a rede perto de uma roseira.
Com a chegada de uma nova versão de um toca-DVD sem fios, da Gateway, corri para comprá-lo. Como qualquer aparelho do gênero, o ADC-320 toca discos de vídeo e pode comunicar-se com um computador e capturar vídeos, fotos e músicas que podem ser reproduzidas em uma TV.
Novamente, a configuração foi fácil. Com um teste inicial, eu cliquei no controle remoto do DVD para estabelecer comunicação com meu computador, cliquei novamente para transferir um arquivo de foto para o DVD e me sentei para apreciar um show de slides na TV. Deixei as experiências com música e vídeo para outro dia, sem abusar da sorte.
Tudo ia bem, mas estava ansioso. Haveria um paraíso sem fios lá fora que eu ignorava? Juntei dois homens de inteligência confiável e fomos a um café na Union Square para papear sem fios.
O toca-DVD os impressionou. "Você está certo quanto à modernidade dele", disse um deles. Mas alguns defeitos se revelaram.
Primeiro, eu precisava de um mouse e de um teclado sem fios. Segundo, eu precisava usar mais a minha recém-conquistada mobilidade. A alguns passos de distância, na Union Square, você poderia passear e captar toda a sorte de sinais sem fios. Os bobos podem ir a algum lugar e pagar pelo acesso. Mas os piratas procuram pontos de acesso e navegam de graça.
Não entendo isso. Não quero navegar na rede em um parque, onde não se pode ler a tela se o sol estiver brilhando.
Brandindo seu celular com câmera digital, um dos meus amigos enviou fotos ao outro amigo, do outro lado da mesa. Este, com a caneta na mão, cutucou freneticamente seu palmtop para acessar as imagens. Ambos estavam em estado de êxtase eletrônico.
"Quero ver seu celular", disse um deles, e puxei meu aparelho.
"Você está quase pronto para se tornar um homem totalmente sem fio", disse o outro. "Você tira fotos com a câmera do seu celular, transmite as imagens por infravermelho para o seu palmtop e as passa por bluetooth para o seu PC para "bimá-las" para o seu toca-DVD e exibi-las na sua TV".
Eu saí de lá com dor de cabeça.
Tive uma dor de cabeça ainda maior ao tentar tocar arquivos musicais no meu DVD sem fios.
Depois de me esforçar muito para dominar os labirintos do KaZaA, caí no site do Wal-Mart. Por US$ 0,88 por música, fiz download de várias canções. Isso é tudo o que consegui. Por mais que eu tentasse, o toca-DVD não lia os arquivos. Consegui um contato com um paciente engenheiro da Gateway. Ao longo de muitas horas de conversa, enquanto tentávamos diligentemente desemaranhar os nós do meu problema, ele não conseguiu passar meus arquivos de música do Wal-Mart para meu toca-DVD, embora ele tenha descoberto o motivo.
Por meio de tentativa e erro, descobrimos que as músicas copiadas dos meus próprios CDs funcionavam maravilhosamente.
As músicas do Wal-Mart, entretanto, consideraram todas as abordagens do toca-DVD como uma tentativa de compartilhamento de arquivos ilegais. Um esquema de criptografia chamado Digital Rights Management (ou controle de direitos digitais) estava bloqueando meus esforços.
O mouse sem fios, por outro lado, proporcionou uma gratificação instantânea. Em uma liqüidação, comprei mouse e teclado sem fios por US$ 50. A instalação foi simples e fácil. Bastou conectar um pequeno receptor alimentado por baterias nas portas na parte traseira do meu computador.
Os novos mouse e teclado, cada um deles alimentado por duas pilhas comuns, comunicam-se com o PC por meio do receptor, o que significa que eu não ficaria mais com fios enrolados no meu tornozelo esquerdo.
Enquanto as semanas passavam, brinquei com meu novo equipamento. Baixei videoclipes e os reproduzi na TV. Vi meus arquivos fotográficos. De tempos em tempos, toquei as músicas que eu havia copiado de um CD de James Brown e percebi que o exercício era inútil, já que eu tinha um aparelho de som e um toca-CD muito bons na mesma sala da TV.
Munido do laptop, curti o prazer da liberdade de ir para onde eu quisesse dentro de casa e ainda desperdiçar um tempo precioso navegando na internet. Em outras palavras, eu explorei o meu mundo sem fios, identifiquei seus limites e cheguei a algumas conclusões sobre que diferenças a tecnologia sem fios faria na minha vida.
A resposta é alguma diferença, mas não muita. O mouse fica. Eu o adorei. O teclado não faz nenhuma diferença, já que eu não fico andando com ele de um lado para outro e o fio do antigo teclado não se enrosca na minha perna.
O laptop sem fios provou ser útil, principalmente porque ele me permite usar a internet quando minha mulher está no computador. Eu não tive mais de ficar em pé atrás dela, irradiando vibrações hostis. A mobilidade foi uma vantagem média, mas eu tendo a não me mover quando estou na frente de um PC. Por outro lado, eu realmente fiquei acostumado a ficar relaxado na poltrona usando o laptop para fazer partes de pesquisas durante os comerciais. Seria difícil abrir mão disso.
O toca-DVD continua sendo mais um assunto para conversa. Se eu realmente precisar ver fotos na minha TV, poderei fazê-lo diretamente da câmera. Se eu fosse um tipo diferente de ouvinte, poderia criar compilações geniais de músicas de vários CDs, mantê-las em arquivos no DVD e tocá-las pela TV, mas a equação custo-benefício não acrescenta nada.
O homem totalmente sem fios continua sendo um ideal. Como um programa rigoroso e exercícios abdominais, uma maratona ou um esclarecimento espiritual, ele é uma meta atingível. Não para mim. Talvez no próximo ano.


Tradução de Angela Caracik


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