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EUA
Gestor diz que norte-americanos não se abalam com a decisão do Fed e continuam perseguindo ganhos nas Bolsas
Mais agressivo, aplicador ignora juro alto
FÁBIO ALVES
DA REPORTAGEM LOCAL
O comportamento do investidor norte-americano vem mudando nos últimos dez anos: ele
tem trocado de aplicação com
mais frequência, investe em ações
cujo real valor econômico não
consegue medir e presta mais
atenção à rentabilidade passada
do que aos fundamentos.
"O investidor médio dos Estados Unidos vem se tornando cada
vez mais agressivo", diz Gus Sauter, 45, o principal gestor da área
de ações do Vanguard Group, segunda maior administradora de
fundos de investimentos dos Estados Unidos.
O Vanguard tem 14 milhões de
clientes e administra nada menos
que US$ 550 bilhões, dos quais
aproximadamente US$ 370 bilhões estão aplicados nas Bolsas
norte-americanas.
Para Sauter, o pequeno investidor norte-americano aprendeu
uma lição nos últimos anos: é
quando o mercado desaba que
surgem as oportunidades de investir. "Eles aprenderam o conceito de comprar na baixa", explica.
A Folha ouviu três investidores
norte-americanos, que relataram
como estão atravessando a recente turbulência do mercado acionário (leia textos abaixo). Na estratégia dos três, há em comum o
fato de não incluírem aplicações
de renda fixa nas suas carteiras de
longo prazo.
"A elevação da taxa de juros,
anunciada pelo Fed (banco central dos Estados Unidos) na semana passada, foi ignorada em grande parte pelos investidores", explica Sauter.
Para ele, somente quando o aumento da taxa de juros afetar o ritmo de crescimento da economia
norte-americana é que os investidores vão se preocupar.
Leia a seguir os principais trechos da entrevista.
Folha - Que impacto o último aumento de 0,5% da taxa de juros terá no mercado de ações dos Estados Unidos?
Gus Sauter - O mercado teve
uma reação muito boa ao anúncio
da elevação dos juros hoje (terça-feira da semana passada). A
maior parte dos investidores já
havia antecipado esse aumento de
0,5%. Por isso o sentimento de
calma foi a reação inicial.
Folha - A volatilidade vai continuar forte até o final deste ano?
Sauter - Sim. Essa volatilidade
está sendo causada pelos altos níveis de "valuation" (valor econômico estimado pelos investidores
para uma determinada ação) observados no nosso mercado. Os
índices P/L (relação preço/lucro)
das ações também estão elevados,
e qualquer pequeno choque externo no sistema pode resultar em
grande volatilidade.
Folha - O anúncio pelo Fed, o banco central norte-americano, do aumento da taxa de juros pode ajudar
a reduzir a volatilidade?
Sauter - Parte da volatilidade registrada no mercado foi motivada
pela expectativa da elevação dos
juros, mas os juros são apenas um
exemplo de um choque externo.
Há vários tipos de choque que
atingem o mercado semanalmente e qualquer um deles pode criar
o mesmo grau de volatilidade que
a expectativa de juros gerou. Se os
níveis de "valuation" não estivessem tão elevados, esses choques
externos não teriam tanto impacto no mercado de ações.
Folha - O comportamento do investidor mudou com a maior turbulência nas Bolsas?
Sauter - Temos visto o comportamento do investidor se dando
em duas formas diferentes. Na
Vanguard, administramos fundos de maneira passiva (os fundos de índice, por exemplo) e ativa. Nas carteiras passivas, observamos que a captação líquida
continua, embora num ritmo menor do que nos anos anteriores.
Mas, o que é interessante, nos dias
em que a Bolsa cai fortemente
(como aconteceu em abril), temos registrado grandes depósitos.
No dia 14 de abril, por exemplo,
quando o mercado teve a maior
queda no mês, tivemos uma captação líquida de US$ 300 milhões.
Parece-me que os investidores
desse tipo de fundo não estão
nem um pouco abalados pela volatilidade e estão tendo uma visão
de longo prazo em relação às suas
aplicações. Por outro lado, em outros segmentos do setor, os investidores fizeram resgates, resultando em captação negativa.
Folha - E os pequenos investidores? Eles ainda estão com seu dinheiro aplicado em Bolsa?
Sauter - Ainda há uma parcela
dos investidores que continua a
pôr dinheiro no mercado de
ações. A nossa experiência nos últimos 15 anos é que, toda vez em
que as cotações caem, o mercado
se recupera rapidamente. Então,
muitos investidores adotaram o
conceito de que as quedas nos
preços das ações são, na realidade, oportunidades de compra.
Chamamos esse movimento dos
investidores de "comprando na
baixa".
Folha - Inclusive o pequeno investidor?
Sauter - Alguns deles se assustaram com a volatilidade e se retiraram, mas há muitos investidores
de varejo que adotaram a filosofia
de "comprando na baixa".
Folha - Com a taxa de juros norte-americana no nível mais alto em 9
anos, poderá haver uma migração
do dinheiro investido em Bolsa para aplicações de renda fixa?
Sauter - Certamente, com taxas
de juros mais elevadas, os papéis
de renda fixa ficam cada vez mais
atraentes. Mas, neste momento,
ainda não observamos uma migração de recursos. Os instrumentos de renda fixa não estão
captando o mesmo volume que as
aplicações em ações.
Folha - Isso poderá acontecer em
caso de novo aumento dos juros?
Sauter - Apenas se o mercado
acionário reagir ao aumento numa forma extremamente negativa. Até hoje, mesmo com as recentes quedas das cotações, os investidores não estão apavorados
com a turbulência.
Há, provavelmente, um nível de
queda nos preços que deixaria os
investidores bastante nervosos e
eles, certamente, sacariam seus
recursos. Não sei qual é esse nível,
mas ainda não chegamos a esse
ponto.
Folha - Como a alta dos juros poderá afetar o investidor médio norte-americano?
Sauter - Até agora, os investidores vêm, em grande parte, ignorando esses movimentos com os
juros. Este (o da semana passada)
foi o sexto aumento que tivemos
em pouco mais de um ano. Os investidores têm aplicado em ações
e não têm colocado quantias
substanciais no mercado de renda
fixa. Eles têm ignorado os aumentos nos juros porque a nossa economia continua extraordinariamente forte. Até que a economia
venha a reagir a esses aumentos,
continuaremos a ver os investidores privilegiando o mercado acionário.
Folha - Qual tem sido a estratégia
da Vanguard na gestão dos recursos dos clientes que aplicam em
Bolsa?
Sauter - Deixamos os nossos
fundos de ações completamente
investidos em Bolsa durante todos os momentos. Não achamos
que temos a habilidade para predizer quando o mercado vai cair.
E os nossos clientes de fundos de
ações aplicam conosco na expectativa de que seu dinheiro estará
com exposição à Bolsa.
Folha - Como o senhor acha que
vai ser o desempenho da Bolsa neste ano?
Sauter - Não costumamos fazer
previsões de curto prazo. Acreditamos que a volatilidade continuará. Achamos que, num período de cinco ou dez anos, o retorno
do mercado acionário dos Estados Unidos será muito menor do
que o retorno visto nos últimos 15
anos.
Folha - O apetite do investidor
por ações de tecnologia diminuiu
em razão da recente turbulência?
Sauter - No momento, a demanda por essas ações diminuiu um
pouco. Acho que novas quedas
nos preços das ações do setor de
tecnologia talvez abalem um pouco mais a fé do investidor nesses
papéis. Mas, até agora, boa parte
dos investidores está disposta a
conviver com a queda observada
nas ações. Ainda há uma grande
expectativa entre os investidores
de que as ações de tecnologia sejam as opções para investir no futuro, apesar dos elevados níveis
de "valuation" que carregam esses papéis.
Folha - Qual será o setor ou ação
que atrairá a atenção do investidor
como a próxima grande tacada?
Sauter - É, provavelmente, a previsão mais difícil de fazer. Achamos que o retorno das ações do
setor de tecnologia será menor,
pelo menos a médio prazo. Não
sei qual o segmento de mercado
que será um sucesso, mas acredito que o investidor deveria estar
exposto a todo o mercado acionário.
Folha - Quando o mercado desaba, o noticiário é negativo e o pânico se instala, os investidores costumam fugir em massa. Quando a
Bolsa sobe e as notícias são encorajadoras, eles correm para o mercado acionário. Como o investidor pode evitar essa mentalidade de agir
como fosse parte de um rebanho?
Sauter - É muito difícil evitar esse comportamento. Há uma área
nas finanças, que vem se desenvolvendo nos últimos dez anos,
chamada de "finança comportamental". Essa área tenta explicar
justamente isso - os investidores
agem em massa, e há ocasiões em
que tomam decisões sem o devido cuidado e de uma forma até irracional. Não sei como resolver
isso. É uma questão de mudar o
comportamento humano. E boa
parte do nosso comportamento é
uma reação a lições do passado.
O que estamos vendo agora no
nosso mercado é que, com o fenômeno "comprar na baixa", muitos investidores aprenderam a lição de que o mercado se recupera
rapidamente depois de uma queda. Acredito que possamos entrar
numa era em que, em alguns momentos, o mercado não se recupere automaticamente ou fique
estagnado por algum tempo. Talvez isso mude o comportamento
de alguns investidores, especialmente aqueles que investem em
ações de tecnologia, que viraram
uma verdadeira mania.
Folha - Os investidores norte-americanos estão mais agressivos
ou conservadores em relação ao
que eram?
Sauter - Eles vêm se tornando
cada vez mais agressivos nos últimos dez anos. Há hoje muito mais
americanos investindo em Bolsa
do que em qualquer período do
passado. Eles também estão movimentando o dinheiro muito
mais rapidamente. Antes, o investidor médio norte-americano
permanecia num fundo mútuo
durante dez anos. Agora, ele está
resgatando seu dinheiro do fundo
em dois anos e meio. O dinheiro
está se movimentando pelo mercado com maior rapidez em busca da rentabilidade passada. Daí
estarmos observando um comportamento cada vez mais agressivo dos investidores de ações.
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