São Paulo, Segunda-feira, 30 de Agosto de 1999
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PERFIL
Luís Stuhlberger, da Hedging-Griffo, administra um fundo cujo patrimônio dobrou em sete meses
"Ganho apostando contra o consenso"


MARA LUQUET
Editora do Folhainvest

ODETE PACHECO
Editora-adjunta do Folhainvest


Se você tivesse aplicado R$ 10 mil em janeiro deste ano em cotas do fundo Hedging-Griffo Verde, administrado pela Hedging-Griffo, teria hoje, menos de sete meses depois, o dobro do dinheiro em suas mãos - R$ 20,2 mil.
O histórico dessa carteira, que nasceu em janeiro de 97, exibe um retorno médio mensal de 4,47%. Observe que esse foi um período, no mundo inteiro, de crises sucessivas. Quer saber por que essa carteira rendeu tanto?
A resposta é que seu gestor, Luis Stuhlberger, um dos sócios da Hedging-Griffo, se arrisca a perder dinheiro, desde que seja pouco, aproveitando as oportunidades de fazer grandes negócios.
Descubra, nessa entrevista, seu estilo de gestão. Trata-se da primeira reportagem, de uma série que a Folha estará publicando, para mostrar como os mais diferentes estilos de gestão podem produzir bons resultados.


Folha - Na sua trajetória profissional, há outra carteira que tenha oferecido ganhos tão altos como os do Verde?
Luis Stuhlberger -
Não.

Folha - Foi seu melhor momento?
Stuhlberger -
Como gestor, sim. Mas há outros também interessantes, como em 94, quando criamos, em parceria com a Linear, o primeiro "hedge fund" do Brasil. Não é só o dinheiro ou a performance que importam. Criar alguma coisa, fazer, de certa forma, parte da história, é importante.

Folha - Como você entrou no mercado financeiro?
Stuhlberger -
Quando comecei a trabalhar no mercado de ouro, em 81. Foi o primeiro ano em que o ouro foi reconhecido como ativo financeiro.

Folha - Como você operava?
Stuhlberger -
Era um estrategista, fazia arbitragens (operações que buscam ganhos com a diferença de preço de determinado ativo em diferentes mercados). Nunca fiz um "trading direcional" (operações curtas que pressupõem uma direção específica do mercado, de alta ou de baixa). Parti da hipótese de que o mercado tinha tantas imperfeições que, sem arriscar quase nada, oferecia excelentes oportunidades de ganhar dinheiro.

Quando você vai para a asset (empresa de administração de carteiras) leva esse estilo para outros mercados?
Stuhlberger -
Sim. O estilo da minha administração é arbitrar imperfeições, se houver. De uns tempos para cá, isso está infinitamente mais difícil.

Folha - Para arbitrar imperfeições, você utiliza muito derivativos (mercados futuros e de opções)?
Stuhlberger -
Sim. As imperfeições estão nos mercados futuros e de opções.

Folha - Os ganhos do fundo Verde estão nas arbitragens?
Stuhlberger -
Meu estilo de operar é arbitrar imperfeições e buscar opções que tenham um alto potencial de retorno, com baixo risco. Opções que você tenha muito pouco a perder e muito a ganhar. Muitas vezes, perde-se muito pouco por muito tempo. Isso não importa. Os valores são pequenos e, de repente, se você consegue acertar, o ganho compensa as perdas.

Folha - O lucro do Verde veio do câmbio?
Stuhlberger -
Sim. Compramos em dezembro e no começo de janeiro. Quer dizer, a gente fez a posição muito antes dos dias fatídicos.

Vocês pegaram toda a alta?
Stuhlberger -
Não, uma parte. Fomos até R$ 1,80 mais ou menos.

Folha - Foi a primeira vez que você comprou câmbio?
Stuhlberger -
Não. Já tinha entrado no mercado em agosto, em setembro e em outubro. Em cada uma dessas posições, perdemos um pouco.

Folha - Como é que você vê as oportunidades?
Stuhlberger -
As oportunidades são assim: hoje há um consenso no mercado. Todo mundo pensa da mesma forma a respeito de um certo mercado. Aí faço a pergunta: esse consenso está na direção certa ou errada? Se estiver na direção certa, fico quieto, se achar que não, identifico a oportunidade. Nelson Rodrigues dizia que toda a unanimidade é burra, mas não é bem burra. O mercado, às vezes, tem razão; outras vezes, não. O desafio é identificar a oportunidade: apostar contra o consenso e acertar. Apostar contra o consenso, em geral, é barato.

Folha - Dê um exemplo.
Stuhlberger -
Quando a Bolsa de Valores, na crise da Rússia, caiu, as ações do Pão de Açúcar estavam cotadas a R$ 10; hoje, valem R$ 39. Naquela época, pensei: alguém está detonando esse papel para bater R$ 10. Vou comprar. Quando tem uma crise na Bolsa, caem os papéis bons, os médios e os ruins. Os bons não deveriam cair tanto. Então surge muita qualidade a preços baixos.

Folha - Você investiu contra o consenso recentemente?
Stuhlberger -
Há alguns meses, havia um consenso de que o câmbio ficaria em R$ 1,75. Eu achava que superaria os R$ 2. Então, estava barato para comprar, porque, mesmo que não subisse, eu tinha pouco a perder.

Folha - Quer dizer que você ganhou dinheiro?
Stuhlberger -
Não, não ganhei. Na verdade, tentei uma arbitragem com contratos de opções de dólar (contratos negociados na Bolsa de Mercadorias e Futuros). Comprei umas opções, mas, na hora de vender, perdi o momento. Deixei para vender na sexta-feira à tarde e o Banco Central fez o leilão (de venda de papéis cambiais, que empurrou para baixo a cotação do dólar). Mas é assim mesmo, a vida não é só feita de vitórias.

Folha - Por que você não vendeu na sexta?
Stuhlberger -
Achei que o dólar subiria um pouco mais. Na verdade, nunca imaginei que o Banco Central faria um leilão naquele dia. Achava que as revistas de final de semana seriam favoráveis ao governo, no sentido de denunciar os deputados ruralistas que estão legislando em causa própria, e haveria, então, uma deterioração dessa força contrária.

Folha - O conceito é o de perder pouco sempre?
Stuhlberger -
Perder muito pouco e operar com sua cabeça disciplinada para nunca colocar seu patrimônio em risco, mesmo que, de cinco eu ganhe um, o importante é não perder muito.

Folha - Neste momento, qual é o consenso do mercado?
Stuhlberger -
Não há consenso. Nessas épocas, fico fora.

Folha - Quanto tempo você passa por dia nas mesas de operações?
Stuhlberger -
Varia. Houve uma época, entre 96 e 97, antes da crise da Coréia, em que não havia muito o que fazer. Então, você passa o tempo fazendo outras coisas. É um tédio.

Folha - Ninguém trabalha?
Stuhlberger -
Analistas de ações, de fundos, de mercados futuros seguem na sua rotina. A compra de títulos públicos e privados continua. Mas eu, na minha especialidade, fico sem ter o que fazer.

Folha - Você trabalha apenas nos momentos nervosos?
Stuhlberger -
Não. Às vezes, é nos momentos mais calmos que tenho chance de comprar uma coisa barata, para vender e ganhar num momento nervoso; outras vezes, quando você chega num momento nervoso, já é tarde.


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