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Divorciada aos dez anos
Best-seller mundial, autobiografia "Meu Nome É Nujood" narra a história de menina que se separou do marido
após ser forçada ao casamento
NICHOLAS D. KRISTOF
É difícil imaginar que já
tenham existido muitas divorciadas mais
jovens ou mais corajosas que a pequenina
Nujood Ali, aluna de terceira
série.
Nujood é uma menina iemenita, e não é por coincidência
que o Iêmen abriga tamanho
número de noivas meninas e de
terroristas (bem como, agora,
graças a Nujood, de crianças divorciadas). Sociedades que reprimem as mulheres são mais
propensas à violência.
Para Nujood, o pesadelo começou aos dez anos, quando
soube, por sua família, que se
casaria com um entregador de
mais de 30 anos de idade. Ainda que sua mãe não gostasse da
ideia, ela não protestou.
"No nosso país, são os homens que dão as ordens, e as
mulheres que as obedecem",
escreve Nujood e em sua nova e
forte autobiografia, que acaba
de ser publicada nos EUA, "I
Am Nujood, Age 10 and Divorced" [Meu Nome é Nujood, 10
Anos, Divorciada, com Delphine Minoui, Three Rivers Press,
192 págs., US$ 12, R$ 21].
O marido a forçou a deixar a
escola, porque não ficaria bem
para uma mulher casada estudar. O pai da menina pediu que
o marido não a tocasse até um
ano depois de sua primeira
menstruação.
Mas tão logo se casaram, ela
escreve, o marido a forçou a fazer sexo. Não demorou para
que começasse a espancá-la.
Nujood tinha ouvido dizer
que juízes podiam conceder divórcios, e por isso um dia fugiu
de casa, apanhou um táxi e pediu para ser levada ao tribunal.
Celebridade
Jornalistas iemenitas fizeram dela uma causa célebre, e
Nujood por fim conseguiu o divórcio que desejava. A publicidade que cercou o caso inspirou
outras meninas, como uma garota saudita de oito anos casada
com um homem de 50, a solicitar anulações e divórcios.
Em sua condição de pioneira,
Nujood visitou os EUA e em
2008 foi celebrada como uma
das mulheres do ano pela revista "Glamour".
Suas memórias ficaram por
cinco semanas no primeiro
posto da lista de livros mais
vendidos na França, e estão
saindo em 18 outros idiomas,
entre os quais seu árabe natal.
Perguntei a ela, que agora
tem 12 anos, o que pensava de
sua vida como escritora de sucesso. Ela disse que as edições
estrangeiras não lhe importavam muito, mas que aguardava
com ansiedade a publicação do
livro em árabe.
Após o divórcio, voltou à escola e a morar com sua família,
que agora vive dos royalties de
seu livro.
Inicialmente, os irmãos de
Nujood a criticaram por trazer
vergonha à família. Mas agora
que se tornou o arrimo da família, todo mundo vê as coisas de
modo um pouco diferente.
"Agora, todos a tratam muito
bem", disse Khadija al-Salami,
uma cineasta que serve como
conselheira de Nujood e traduziu a entrevista para mim. "Eles
a tratam como rainha."
O Iêmen parece uma bomba-relógio. É um dos focos das
ações da Al Qaeda e também
enfrenta guerras intermitentes
no norte e um movimento de
secessão no sul. Não é coincidência que tenha ficado em último lugar no índice de disparidade entre os sexos do Fórum
Econômico Mundial.
Há duas razões para que os
países que marginalizam mulheres terminem instáveis.
A primeira é que eles em geral apresentam elevados índices de natalidade. E um dos fatores que apresentam mais forte correlação com conflitos sociais é uma proporção elevada
de rapazes na faixa etária dos 15
aos 24 anos.
Em segundo lugar, esses países também tendem a praticar
a poligamia e a apresentar taxas
de mortalidade mais altas para
as meninas. Isso significa menos mulheres disponíveis para
casamento e mais solteiros
frustrados para recrutamento
por extremistas.
Assim, educar Nujood e lhe
dar a chance de se tornar advogada -seu sonho- não é apenas questão de justiça, mas
também uma forma de domar
todo um país.
Considere-se o caso de Bangladesh. Após se separar do Paquistão, Bangladesh começou a
educar suas meninas de um
modo que o Paquistão jamais
fez. As mulheres instruídas servem como força de trabalho para o setor têxtil emergente e como força na sociedade civil. De
bom nível educacional, elas são
uma das razões para que Bangladesh, hoje, seja muito mais
estável que o Paquistão.
No mês passado, os EUA
anunciaram US$ 150 milhões
[R$ 270 milhões] em assistência militar ao Iêmen para o
combate aos extremistas. Em
contraste, enviar uma menina à
escola pública custa US$50 por
ano, e menininhas como Nujood podem se provar mais efetivas que os mísseis como forma de derrotar os terroristas.
A íntegra deste texto saiu no "New York Times".
Tradução de Paulo Migliacci.
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