São Paulo, domingo, 14 de setembro de 2008 |
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Ponto de fuga As garras do mestre
JORGE COLI COLUNISTA DA FOLHA
Depois de décadas, José
Mojica Marins termina
um filme. Traz de volta
o formidável personagem de Zé
do Caixão.
Nenhum declínio nos poderes criadores do cineasta. Ao
contrário, eles se confirmam,
renovados. Fazem de "Encarnação do Demônio" não apenas
sua melhor obra até agora como uma criação excepcional
dentro do cinema brasileiro.
A força impressionante que
suas imagens apresentam não
deriva de uma técnica ou de
uma estratégia. Ela se impõe
por uma intuição cinematográfica que a escola não ensina.
O novo filme mostra que
Mojica não tem nada de um
primitivo, como se costuma
classificá-lo. Primitivo, nesse
caso, é um álibi indulgente, que
permite o sorriso e o olhar desdenhoso do espectador esnobe.
Mojica nunca fez cinema
com regras acadêmicas: ele
sempre inventou as suas próprias, em que expõe seu universo atormentado.
No início de sua carreira, a
técnica era rude, mas ele transformava as limitações em qualidades. Era obrigado a inventar soluções inéditas que se encadeavam, expressivas.
Agora, domina, tecnicamente, mas não se acomoda nunca
a qualquer convenção. Diante
das produções anêmicas próprias à assim chamada "renascença do cinema brasileiro",
cheia de bons moços e filmes
bonitinhos, "Encarnação do
Demônio" se abate com fúria
criadora e esmaga tudo.
Do começo ao fim, em cada
instante, o filme tem um poder
de verdade. Verdade, em arte,
não quer dizer verossimilhança
nem realismo. Quer dizer expressão convicta e convincente. As situações e personagens,
absurdos, em "Encarnação do
Demônio", passam a palpitar
com uma vida que só os artistas
mais altos conseguem obter.
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