São Paulo, domingo, 17 de dezembro de 2000

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Uma vida de conservadorismo e tragédias

especial para a Folha

Max Karl Ernst Ludwig Planck nasceu em Kiel (norte da Alemanha), em 23 de abril de 1858. Aos nove anos, mudou-se com sua família para Munique (sul), mas sempre disse que Kiel era sua "autêntica pátria".
Fez seus estudos superiores na Universidade de Munique. Foram três anos de graduação. No ano seguinte, foi para Berlim, estudar com renomados cientistas de sua época: Hermann von Helmholtz (1821-1894) e Gustav Kirchhoff (1824-1887). Em Berlim, Planck leu os trabalhos de Rudolph Clausius (1822-1888), que seria a sua principal influência na termodinâmica, área na qual se tornou um dos maiores especialistas de seu tempo.
De volta a Munique, Planck obteve em 1879 seu doutorado, com uma tese sobre o segundo princípio da termodinâmica. Em 1885, tornou-se professor extraordinário na Universidade de Kiel, para, quatro anos depois, assumir o mesmo posto na Universidade de Berlim. Passou a catedrático em 1892, em uma época em que só havia duas cátedras para teóricos na Alemanha. Manteve esse cargo até os 70 anos, quando se aposentou e passou a dar palestras pela Europa sobre um tema que lhe era muito caro: ciência e religião.
Suas aulas, apesar de meticulosamente bem preparadas, não entusiasmavam os alunos. Tinha preferência por orientar estudantes dos primeiros anos dos cursos de graduação, mas teve poucos discípulos e formou poucos doutores. Apesar de ocupar postos importantes na estrutura acadêmica, Planck dedicou parte de seu tempo a reformular o currículo de física das escolas médias alemãs, defendendo o fortalecimento das aulas de laboratório nessa disciplina.
Planck foi educado em um ambiente religioso, mas liberal e ecumênico. Era profundamente religioso, porém nunca se vinculou a nenhuma igreja. Ao longo de sua vida, norteou-se por "respeito à lei, confiança nas instituições estabelecidas, obediência ao dever e honestidade absoluta", como escreveu o historiador John Heilbron na biografia "Dilemmas of an Upright Man".
Planck nunca deu sinais de genialidade, seja na física, seja em qualquer outro domínio. "Aliás, nunca acreditou ter um talento especial para a física", diz Heilbron. Mas ia bem na escola, em todas as disciplinas, especialmente em música, o que fez dele um exímio pianista, tendo acompanhado várias vezes Einstein ao violino.
Foi um conservador que promoveu a carreira de revolucionários, como a de Einstein, a de Max von Laue (1879-1960), seu principal discípulo, e a da física Lise Meitner (1878-1968), co-descobridora da fissão nuclear.
Apesar de inicialmente cético quanto à entrada de mulheres na universidade, Planck foi um dos primeiros catedráticos alemães a defender publicamente o direito de as mulheres ingressarem na vida universitária, o que ficou evidenciado por sua escolha de Lise Meitner como assistente, no início da década de 1910. As reticências de Planck em aceitar os desdobramentos radicais de sua obra não o impediram de reconhecer o valor de novas teorias. Ainda em 1906, promoveu um seminário para discutir as alterações dos conceitos de tempo e espaço propostas pela teoria da relatividade especial, publicada um ano antes por Einstein. Foi Planck quem lhe deu o nome de "teoria da relatividade".

Sob Hitler Seu conservadorismo ia além da física. "Lealdade ao Estado e orgulho patriótico eram valores inquestionáveis", segundo o historiador Fritz Stern, em "Einstein's German World" (O Mundo Alemão de Einstein; Princeton University Press, 1999).
Mesmo tendo sido admirado pela extrema integridade pessoal, Planck adotou durante o regime nazista posições que foram criticadas por colegas e amigos, como Von Laue e Einstein. Considerava que a Alemanha e sua cultura estavam acima do regime de Hitler, o que o levou a permanecer no país para tentar salvar o que fosse possível da ciência germânica. A amizade entre Planck e Einstein ficou irremediavelmente abalada (leia entrevista com David Cassidy na página10).
Sua vida pessoal foi marcada por tragédias. Durante a Primeira Guerra, seu filho mais velho, Karl, morreu em combate. Perdeu duas filhas gêmeas por complicações no parto. Mas seu maior infortúnio foi o fuzilamento do filho mais novo, Erwin, acusado de ter colaborado com os responsáveis pelo atentado frustrado contra Hitler em 1944. Tentou desesperadamente salvar Erwin, que acabou executado no início de 1945. Em carta ao físico alemão Arnold Sommerfeld (1868-1951), de 23 de janeiro daquele ano, Planck exprimiu seu estado de espírito: "Tiraram de mim o amigo mais querido e mais próximo. Minha dor não pode ser expressa em palavras".
Planck morreu em 4 de outubro de 1947, após um longo período de doença. No ano anterior o governo alemão fundou a Sociedade Max Planck para o Avanço da Ciência, para prosseguir com seus ideais científicos. Sua imagem foi estampada na moeda de 2 marcos em 1958.
Em cerimônia da Academia de Ciências dos EUA de 1948, Einstein prestou-lhe uma homenagem. Escreveu: "Um homem a quem foi dada a oportunidade de abençoar o mundo com uma grande idéia criativa não precisa do louvor da posteridade. Sua própria façanha já lhe conferiu uma dádiva maior". (CLV e AAPV)


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