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São Paulo, domingo, 18 de maio de 2003

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KATIA DE QUEIROS MATTOSO

[França]

Achutti - 9.mar.2000/Folha Imagem


1. Fui professora titular do departamento de história da Universidade Católica de Salvador (1964-84) e professora titular visitante no departamento de história da Universidade Federal da Bahia (1986-88). Como professora visitante, ensinei também nas universidades de Minnesota (EUA, 1978), Paris-Sorbonne (França, 1982-83) e Columbia (EUA, 1983).

2. A criação da cadeira de história do Brasil na Universidade de Paris-Sorbonne (Paris 4), para a qual fui convidada a concorrer pelos professores François Crouzet e Pierre Chaunu. Primeira titular dessa cadeira e eleita por unanimidade pelos colegas, aposentei-me em 1999 com o título de professora emérita.

3. Não. Futebol e Carnaval são ainda lembrados como lazeres que identificam os brasileiros. Essa visão de um Brasil eternamente festivo cedeu lugar à visão de um Brasil onde impera a pobreza e a criminalidade. Essa visão por demais negativa oculta os progressos que o Brasil alcançou nos últimos decênios do século passado. Talvez esse aspecto negativo do nosso país ajude os países do Primeiro Mundo a descobrirem seus próprios problemas sociais, não isentos de pobreza e de criminalidade.

4. As diferenças são importantes. Se em um primeiro momento da carreira o salário é condicionado pelos títulos universitários, pelas pesquisas realizadas, pelas publicações e funções exercidas como, também, pelo tempo de serviço ("professor de segunda classe"), num segundo momento a promoção para "professor de primeira classe" ou para a "classe excepcional" se faz por mérito. Somente 7% dos professores titulares alcançam a "primeira classe", e só cerca de 0,5% chega à "classe excepcional". Por isso os salários dos docentes são, de um para outro, diferentes. Na média os salários franceses não são superiores aos brasileiros. Somos cooptados por comissões compostas unicamente de colegas para passar da segunda para a primeira classe. Fui daqueles que alcançaram o último escalão da primeira classe.

5. Por incrível que pareça, as condições de pesquisa em nível de graduação e pós-graduação são melhores no Brasil. Na França as bolsas são raras, especialmente na área de ciências humanas -história, história da França e a de outros países europeus são privilegiadas em relação às outras histórias consideradas "exóticas". Durante os 11 anos de meu ensino na Sorbonne, somente dois de meus alunos foram beneficiados por bolsas para doutorado, e cinco outros receberam ajuda de custo para realizar pesquisas em Portugal e no Brasil. Nove dos doze doutorados que foram realizados sob minha direção foram financiados pela Capes (Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior) e pelo CNPq (Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico) [ambos órgãos do governo brasileiro". Os estudantes que receberam diplomas de DEA (doutorado, 39 pesquisadores) e de mestrado (75 pesquisadores) se autofinanciaram.

6. Se por um lado o caráter "exótico" de meu objeto de ensino e o fato de eu ser mulher não contribuíram para que me sentisse discriminada, não permitiram também que me sentisse à vontade. Na hora de minha aposentadoria, houve até tentativa de suprimir a cadeira de história do Brasil, que, no tempo de sua fundação (1988), era a única cadeira existente da nossa história fora do Brasil. Meus colegas de departamento que não eram favoráveis a sua manutenção preferiam substituí-la por mais uma cadeira de história da França. Permaneceu e foi provida graças aos esforços conjugados do então ministro de Educação da França, professor Claude Allègre, de sua chefe de gabinete, professora Jeanne Marie Parly, do reitor da Universidade de Paris-Sorbonne, Georges Molinié, e do embaixador do Brasil na França, Marcos Azambuja. O governo francês me honrou com a medalha da Ordem da Legião de Honra -"por minha contribuição ao reforço dos laços entre as universidades francesas e brasileiras"- e com a medalha das Palmes Acadêmicas, ambas no grau de cavaleiro.

7. Com 72 anos de idade a minha carreira de docente está encerrada. Grega de nascimento, estudei e me doutorei nas universidades de Lausanne (Suíça) e Sorbonne . Morei 30 anos no Brasil e tenho descendentes na Bahia e na Grécia. Assim, divido meu tempo entre a França, a Grécia e o Brasil.


Por incrível que pareça, as condições de pesquisa são melhores no Brasil


Historiadora, 72
Universidade de Paris 4
Deixou o Brasil em: 1988
Principais obras: "Ser Escravo no Brasil" (ed. Brasiliense), "Bahia, Século 19" (ed. Nova Fronteira); organizadora de "Mémoires et Identités au Brésil" (L" Harmattan) e "Littérature, Histoire -Régards Croisés" (Presses de l'Université de Paris-Sorbonne)


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