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Conceitos de Agamben
Estado de exceção - Criada pela Assembléia Constituinte francesa em 1791 sob o
nome de "estado de sítio", a figura de
um quadro legal para a suspensão da ordem jurídica em "casos extremos" aplicava-se inicialmente apenas às praças-fortes e portos militares.
Em 1811, com Napoleão, o estado de sítio
podia ser declarado pelo imperador a
despeito da situação efetiva de uma cidade estar sitiada ou ameaçada militarmente. A partir de então, vemos um progressivo desenvolvimento de dispositivos jurídicos semelhantes na Alemanha,
Suíça, Itália, Reino Unido e EUA, que serão aplicados, durante os séculos 19 e 20,
em situações variadas de emergência
política ou econômica.
Giorgio Agamben compreende tal desenvolvimento como a manifestação de
um processo de generalização dos dispositivos governamentais de exceção. Processo este que teria sido o motor invisível
das democracias ocidentais (o que
Agamben tenta salientar ao aproximar a
lógica da exceção e o problema do lugar
do soberano nas teorias clássicas da filosofia política).
Por um lado, tal teoria da generalização
progressiva do estado de exceção procura fornecer o quadro de análise para a
tendência contemporânea em criar situações nas quais a distinção entre estado de guerra e estado de paz seja impossível. Indistinção que visaria, assim,
transformar o estado de exceção em regra universal.
No entanto, a partir desta teoria da centralidade de processos de suspensão da
norma que não equivalem necessariamente à abolição da norma, Agamben
procura fazer mais do que fornecer uma
visão das tendências que atuam na estrutura político-jurídica contemporânea. Ele visa fundamentalmente criticar
uma noção de razão vinculada à crença
de que racionalizar é assegurar a vida
por meio da posição de critérios normativos de justificação intersubjetivamente
partilhados.
Neste ponto, o trabalho de Agamben
aparece como um desdobramento das
reflexões de Michel Foucault sobre os
modos de coincidência entre a norma racional e o seu outro.
Biopoder - Termo cunhado por Michel
Foucault para dar conta da centralidade,
na consolidação do poder na modernidade, daquilo que o filósofo chama de "administração dos corpos" e de "gestão calculista da vida". Foucault insiste no fato
de que tal transformação da vida humana em objeto do poder soberano implicou em sua redução à condição de pura
vida biológica, vida pronta para ser administrada pelos dispositivos ordenadores do poder ou, ainda, redução àquilo
que Agamben chama de "vida nua".
Neste sentido, a contribuição mais importante de Agamben no interior do debate sobre as estruturas do biopoder
consiste em mostrar como a vida nua vai
progressivamente coincidindo com a integralidade do espaço político, no sentido de ela ser posta como a figura hegemônica da vida que pode aparecer no interior do espaço político.
Isto implica necessariamente compreender qual a estrutura jurídica própria a
um poder que reduz a vida à condição de
mera vida biológica. É neste ponto que se
articulam os livros "Homo Sacer" e "Estado de Exceção".
Homo sacer - Partindo do fato de que no
termo latino "sacer" convergem duas
determinações aparentemente opostas
de sentido ("sagrado" e "maldito" ou
"matável"), Agamben procura dar conta
do verdadeiro sentido da sacralidade da
vida enquanto princípio inviolável e elemento político originário.
As determinações opostas de "sacer"
apenas indicariam aquele que está fora
tanto do direito humano (por ser sagrado) quanto do direito divino (por ser matável de maneira não sacrificial). Habitante excedente de uma zona de indistinção entre a vida humana e a morte
consagrada, o "homo sacer" demonstraria como a sacralidade é apenas a figura
perfeita de uma vida nua cada vez mais
presente. Com isto, Agamben procura
dar conta do sentido biopolítico de políticas de vitimização (baseadas na dissociação entre os direitos do homem e os direitos do cidadão) e de situações contemporâneas nas quais sujeitos são, cada vez
mais, jogados em zonas de anomia.
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