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Em Havana, as colunas agora sustentam ruínas; Pompéia reabitada; nenhuma memória de que foi o cenário encantador da mais apoteótica festa cívica e política jamais havida nestas Américas
Cuba ida e volta
Associated Press
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Fidel Castro, Osvaldo Dortico, então presidente de Cuba, e Che Guevarra (da esq. para a dir.) participam em março de 1960 do funeral das vítimas da explosão do barco La Coubre, atribuída pelos cubanos aos EUA |
por Janio de Freitas
A Benetton, símbolo mundial da fusão de mau
gosto e esperteza capitalista, enfim está na rua
da Amargura. Mais precisamente, esquina com
Los Oficios. Na fachada, prevenindo suspeitas
de falsificação, o nome por inteiro, United Colors of Benetton. Primeira multinacional de comércio, e por ora
única, a se instalar em Havana desde que o governo revolucionário levou ao fechamento, voluntário ou forçado, os numerosos magazines, drugstores e lojas de departamento estrangeiros em Cuba, anos 60.
Exceção escandalosa entre as Benetton espalhadas
mundo afora, suas vitrines são mortiças e quase vazias
-como as vitrines das lastimáveis e escassas lojas cubanas-, embora limpas, qualidade incomum em Havana. Na rua da Amargura o conteúdo Benetton não
importa. Loja e vitrines foram estrategicamente situadas para sinalizar ao visitante de Cuba a recém-instituída receptividade ao capital estrangeiro e, portanto, a
certas práticas capitalistas.
Entre a suspensão e a renovação dessa receptividade,
40 anos. Ínfimos para um país, são, no entanto, 40 anos
de vida humana. E, para a maioria, o essencial da vida se
passa mesmo em uns 40 anos intermediários, o restante
são intróitos indispensáveis e epílogos nem tanto. Idéia
que não me abandona e me conduz no reencontro com
Havana e com a Revolução Cubana. Jovem repórter, fui
uma das testemunhas da ocupação de Havana, mal se
iniciara o ano de 59, pelos guerrilheiros de Sierra Maestra ali encabeçados pela coluna comandada por Guevara. É um pedaço da História esfumaçado por interesses
fortíssimos.
Passados 40 anos, volto a Cuba convidado pela Associação de Jornalistas Europeus como palestrante no seu
Forum Iberoamericano, desta vez realizado em Havana. Mas não encontro Havana. Foi esse o hotel, sim, aí
está ele. Ali o mesmo mar teimoso, surrando com bravura a amurada que o retém no Malecón. Lá está o Capitólio, em sua alvura externa incondizente com a alma
dos capitólios, muito menos a daquele, em Washington, ao qual homenageou imitando-lhe as linhas, no começo do século. No entanto, não encontro Havana.
O fascínio dos habaneros por colunas levou um dos
seus maiores escritores, Alejo Carpentier, a batizar Havana de "Ciudad de las Columnas". Gregas, mouriscas,
modernosas, rústicas, os muitos milhares de colunas faziam Havana parecer uma cidade fora do chão, leve no
corpo como alegremente leviana no espírito. As colunas
agora sustentam ruínas. São ruínas elas mesmas, descascadas, ventre exposto. Declarada Patrimônio da Humanidade, esta cidade que se desmantela, de pequenos
prédios escalavrados, feridos, parece uma lembrança
multimilenar. Pompéia reabitada. Nenhuma memória
de que foi o cenário encantador da mais apoteótica festa
cívica e política jamais havida nestas Américas.
Cuba, naquele 3 de janeiro de 59, acorrera a Havana
para saudar e ouvir o seu herói. Mais de um quinto da
população nacional, de 6 milhões, a longa praça repleta
de gente sobre gente. Os postes antigos, solenes na sua
beleza clássica, mostravam-se como coqueiros de palmas humanas. As árvores carregaram-se de corpos excitados na sua hora de expansão livre e esperançosa, outra vida começando para um país por fazer.
Contribuições americanas
Fidel Castro não era
herói recente, feito naqueles dias. Já era o símbolo de
oposição e combate à ditadura do general Fulgencio Batista desde 52. No 26 de julho daquele ano, respondeu à
suspensão das eleições, decidida pelo general, comandando o ataque de um numeroso grupo de jovens armados ao quartel de Moncada. Luta feroz, mais de cem
baixas. Preso, Fidel Castro, bacharel em direito, fez a
própria defesa. Sua argumentação final no julgamento,
"a história me absolverá", ficaria célebre. Suspensa a pena de 15 anos pela anistia eleitoral de 54, Fidel saiu de
um ano e meio de prisão para os Estados Unidos. Começariam lá as ironias e contradições de americanos e
de cubanos.
A arrecadação de fundos para o projeto de desembarcar um grupo revolucionário em Cuba foi conduzida
por Fidel nos Estados Unidos, com as contribuições de
exilados da ditadura e, em não menor proporção, de
americanos. O desembarque deu-se em 2 de dezembro
de 56. Nada saiu como planejado, desastre trágico e
quase total. Alertado desde a campanha nada discreta
de Fidel nos Estados Unidos ("ainda em 56 serei herói
ou mártir", dizia), Batista dispôs de informações suficientes para esperar, com um dispositivo militar bem
organizado, na região costeira prevista para a chegada
dos expedicionários.
Dos 82 que treinaram por um semestre no interior do
México e se amontoavam em um pequeno barco, hoje
relíquia exposta em Havana, só uma dúzia escapou em
grupo para a floresta. O barco não pôde atracar no lugar
previsto: teve que ser abandonado, com perda total das
armas, munição e alimentos que lotavam o porão. Além
disso, o mau tempo atrasou em dois dias o desembarque, e os aliados de Fidel que o esperavam em terra na
data planejada, para juntar-se aos expedicionários, ficaram dramaticamente expostos aos soldados e à polícia
de Batista.
A "morte" de Fidel
A aventura épica de Sierra
Maestra foi, a rigor, um improviso. O planejado era um
levante, encabeçado pelos expedicionários, para tomar
a Província de Santiago de Cuba, a mais importante depois de Havana, e dali avançar. As circunstâncias se voltaram tanto contra Fidel e seu grupo que foi fácil para a
ditadura propagar a notícia de sua morte e da dizimação dos opositores armados. Fidel esteve morto, com
atestado de óbito passado pela United Press e pelo embaixador americano Arthur Gardner, de 2 de dezembro
de 56 a 25 de fevereiro de 57. Nesse dia, a edição do
"New York Times" trouxe, na primeira página, a entrevista inicial da série de três reportagens feita por Herbert Matthews com Fidel Castro, na Sierra Maestra.
Matthews sempre foi jornalista sério, cujo currículo
incluía a Guerra Civil espanhola. Um dos poucos repórteres internacionais americanos que não veio a ser profissional do anticomunismo, dele Hemingway disse que
"não mente nunca". Nada disso foi bastante para ressuscitar Fidel. Os americanos que dominavam a economia cubana e o Departamento de Estado eram aliados
de Batista. Pela primeira vez em suas quatro décadas de
jornalismo, Matthews viu-se acusado de forjar uma reportagem. Fazê-la nem fora iniciativa sua, mas do acaso: chegava a Havana com a mulher, para descansar,
quando Fidel pediu a amigos o encontro com um jornalista americano de alto conceito. Só um filmeco de TV
acabou com as dúvidas interessadas. Ainda assim, a
progressão da guerrilha foi mais do que parcimoniosa e
distorcida.
No dia 31 de dezembro de 58, Batista aproveitou-se da
distração geral e fugiu de Cuba, deixando em seu lugar
um general cauteloso. Decorridos dois anos e um mês
desde sua volta conturbada a Cuba, Fidel Castro podia
entrar em Havana e discursava pela primeira vez como
vitorioso, nesta imensa praça que revejo emoldurada
por um casario que bem resistira ao tempo, mas não ao descuido arruinante. "El bloqueo, compañero." Não é o
que meus olhos obrigam a deduzir.
A cena que repasso na memória é muito impressionante, na conjunção rara de monumentalidade física,
de grandiosidade emocional e dos componentes ainda
mais incomuns. Aquelas figuras barbudas no palanque,
em indumentária de campanha, todos mostrando nos
rostos a dificuldade de sentir-se no mundo real, e não
em sonho. A voz juvenil e desafinada de Fidel se projeta
sobre incontáveis milhares de silêncios. Quem já vagou
pelo mar sabe o que é um silêncio oceânico, e era esse.
Uma ilha de liberdade
A oratória de Fidel é espantosamente peculiar. Nada da grandiloquência com
que nos sufocam os oradores latino-americanos. Coloquial, empenha-se mais em convencer do que empolgar, mais em se mostrar confiável do que retórico. O tema é empolgante por si, e a multidão faz suas explosões
nos parágrafos. Fidel perpassa a ditadura. Narra a epopéia guerrilheira de Sierra Maestra. E se lança no futuro
radiante de Cuba: uma ilha de liberdade, respeito integral aos direitos civis, justiça, igualdade, honradez governamental, democracia constitucional, autêntica e
plena. Cada ponto esmiuçado e explicado como algo
palpável, concretamente à vista e à mão. Um projeto
mais revolucionário do que a própria ação guerrilheira
por ele liderada.
Qualquer um podia perceber que era um homem
orando suas crenças mais enraizadas. Como sempre,
cada um viu e ouviu ali o que pôde, o que quis ou lhe interessava. As agências de notícias e a mídia americana,
sob venenosa ressaca desde a subida do Sputnik em 57,
retomaram o refrão iniciado quando Herbert Matthews
ouviu Fidel em Sierra Maestra. Em síntese: sob o disfarce da luta contra a ditadura e pela democracia, Fidel e
seu Movimento 26 de Julho eram comunistas, perigosos como todos os comunistas. Na praça, fosse no palanque ou na multidão, não fora visto um só símbolo
comunista. Claro. O Partido Comunista, assim como ficara contra o ataque a Moncada, ficou contra o plano de
insurreição em Santiago de Cuba e contra a guerrilha.
Uma das definições da linha partidária, na época, dizia: "Consideramos que esse grupo tem boas intenções,
mas está seguindo táticas erradas. Por isso não aprovamos suas ações, (...) o que Cuba precisa não é uma insurreição popular, são eleições democráticas" e "um
governo de Frente Democrática de Libertação Nacional". Era a linha comum aos partidos comunistas na
América Latina.
Os comunistas cubanos foram dos que mais esticaram a linha: a convivência pacífica entre Batista e o Partido Comunista foi por este retribuída com a adesão explícita e ativa ao ditador, em um momento de alta voltagem política e social. Os comunistas combateram a greve geral com que o movimento de democratização desejava parar Cuba, em abril de 58, até a queda da ditadura. Os cubanos estavam exaltados e decididos, ainda
sob a comoção com um acontecimento de menos de
um mês antes.
Enquanto o Diretório Estudantil mantinha outra
guerrilha contra Batista, na Sierra de Escambray, os líderes da Federação de Estudantes Universitários idealizaram ação mais direta e rápida para extinguir a ditadura. Batista escapou por muito pouco do assalto espetacular, em 13 de março, ao seu palácio. Cuba tornara-se
uma fogueira oposicionista, à qual nem mais a alta burguesia negava colaboração, por intermédio de setores
não ligados ao capital externo.
O arrogante e o atrevido
No dia seguinte ao discurso em praça pública foi a vez dos jornalistas. Ou porque a platéia fosse mais apropriada, ou pelo mau tratamento da mídia estrangeira ao seu discurso da véspera,
Fidel dedicou a dois temas quase toda a sua primeira
grande entrevista -e seu primeiro recorde no gênero,
ainda de modestas quatro horas (tive a sorte de me sentar bem à frente dele, do que resultou uma série de fotos
até hoje inédita, com uma exceção que, por acaso, recebeu um reconhecimento internacional). Eram jornalistas de todas as partes, e diante deles Fidel entrou nas
duas guerras em que atravessou os últimos 40 anos.
O que Guevara tinha de arrogante (a arrogância argentina multiplicada pelo prestígio de herói guerrilheiro), Fidel tem de atrevido. Com humor, com fúria, com
informações, com emoção, alternadas com maestria,
desnudou, desancou, tripudiou, desacatou o governo
dos Estados Unidos. Dera armamentos e assessores militares a Batista, para combater os que lutavam pela democracia; induzira os ingleses a dar até jatos a Batista;
acionara sua máquina de propaganda para proteger a
ditadura com falsidades -e estava derrotado, pedindo
audiência e fazendo ofertas aos vencedores. Pois bem, a
junta militar americana estava sendo mandada para fora. Como indesejável. O pessoal da CIA e os diplomatas
comprometidos, idem. Dali por diante, relações de absoluta soberania.
Na exposição de Fidel, nenhuma palavra escolhida
política ou diplomaticamente, nenhuma expressão que
não fosse de superioridade. Salvo para distinguir o povo
americano e o poder nos Estados Unidos. Seria o suficiente, mas não era tudo. Fidel comunicou que logo se
iniciariam as desapropriações de certos tipos de empresas e a interdição de várias atividades.
Americanos controlavam a economia e as finanças
públicas de Cuba, por dominarem os dois setores vitais:
do cultivo da cana à exportação do açúcar e o cultivo e a
indústria do fumo. Os cassinos, os bordéis de luxo, a
prostituição para o turismo sexual, as grandes casas noturnas pertenciam a uma máfia americana, cujos chefões eram pessoas influentes como o ator George Raft,
especialista em papéis de gângster até no cinema.
Para a quase-escravidão dos 40% de cubanos trabalhando no campo, viria logo a reforma agrária. Nas cidades, a reforma imobiliária acabaria com a indústria
dos aluguéis. Proibição do jogo, penas altíssimas para a
exploração sexual, amplos direitos trabalhistas na empresa privada, controle do sistema bancário, prioridade
para cooperativas e dissolução das forças armadas que
sustentaram a ditadura.
O regime? Socialista, sim. Como desde os primeiros
documentos do Movimento 26 de Julho ficara afirmado
("A revolução será democrática, nacionalista e socialista"). Como Fidel Castro dissera e o "New York Times"
publicara já na sua primeira entrevista, em Sierra Maestra. Nem social-democracia, nem comunismo. Democracia socialista.
Aí estavam a fonte do ódio à Revolução Cubana, por
parte dos grandes capitalistas locais e americanos, e o
seu atrativo para os críticos do "capitalismo selvagem".
A idéia-chave da propaganda americana contra a União
Soviética, no quadro da Guerra Fria, era a falta de liberdade política, econômica e cultural no regime soviético.
Um regime que realizasse a democracia social e econômica com liberdade política e cultural, e logo ali na cara
da Flórida, exemplo desastroso para o império ocidental dos Estados Unidos. Em particular, nesses domínios,
sobre o imenso e rico território latino-americano.
Mesmo que inexistisse o problema externo, a meta
cubana era de complexidade enorme. Desenvolver a revolução social mantendo a plenitude dos direitos civis
exigiria uma infinidade de soluções ainda por serem inventadas. Nem as probabilidades históricas favoreciam
tal propósito. As circunstâncias, na época, tinham componentes favoráveis, mas, a rigor, tudo era incógnita.
Pelas dificuldades do projeto, como por suas implicações.
A reação americana ao programa e às primeiras medidas revolucionárias foi dúplice. Não a testemunhei em
Cuba, testemunhei-a na tarefa de fazer a cada dia um
jornal carioca que, de repente o mais importante do
país, era também o alvo principal de todas pressões. É
inacreditável, hoje, que ainda na década de 60 publicar
em primeira página, por exemplo, a foto da primeira
ida de um chefe de governo soviético à ONU, no caso,
Kruschev, provocasse acusações de propagandismo comunista e pressões para demissão do editor. Originadas
do então cardeal do Rio e da Federação das Indústrias,
Associação Comercial, Federação ou Sindicato dos
Bancos, certos dirigentes publicitários e outros guardiães do subdesenvolvimento colonialista do Brasil.
Os mafiosos americanos da noite e da prostituição, fechados os seus negócios, montaram rico sistema de
campanha contra "o comunismo de Cuba", com a
pronta adesão dos controladores do açúcar e do fumo.
Como seus dólares não tinham limites, a ação não teve
fronteiras. Invadiu instituições como a Organização
dos Estados Americanos e a Sociedade Interamericana
de Imprensa, entre outras que se puseram como subsidiárias da CIA.
Chefia total
O governo americano não faltou com
apoio àquela ação, mas, na condição de governo propriamente, estava aturdido. Não achava resposta respeitável para as evidências de que as medidas revolucionárias agiam contra negócios sórdidos e contra a exploração desumana de quase metade dos cubanos na
agroindústria. Mas o Poder americano é a deformação
frankensteiniana, pela riqueza privada com qualquer
origem, dos ideais fundadores dos Estados Unidos. Não
fugiria ao destino programado.
Em sua única tentativa de dirimir o confronto, Fidel
viajou aos Estados Unidos para explicar na ONU a Revolução Cubana e, pelos meios de comunicação, convencer os americanos de que Cuba não era comunista,
mas uma democracia socialista. Se alguém se convenceu com os sólidos argumentos de Fidel, os meios de comunicação cuidaram de desconvencê-lo nos meses seguintes.
O propósito democrático não era farsa. Na reorganização institucional de Cuba, a presidência foi entregue
ao ex-juiz Manuel Urrutia, que enfrentara Batista. O advogado Miró Cardona tornou-se primeiro-ministro. A
composição era difícil, porém. De uma parte, a verdadeira liderança depositava-se em Fidel, voz e medida de
toda a revolução. De outra, os dois empossados, homens do direito formal, não se conciliavam com a natureza revolucionária do seu poder. Não tardou que entregassem a Fidel os cargos e a chefia total do governo.
Talvez fosse a única saída para o impasse, mas não a
solução. As dissensões se agravaram entre os revolucionários. A concentração do poder em Fidel Castro deu
ao governo americano um tema fértil: a cobrança de
eleições em Cuba. Era a "razão moral" desejada pelos
Estados Unidos para desenvolver ações também econômicas, além das políticas, contra Cuba. A tudo, no plano
externo como no interno, Fidel respondeu de maneira
cada vez mais extremada.
Em relação aos Estados Unidos, cada ato considerado
agressivo recebeu uma retaliação, aplicada contra algum bem americano em Cuba. A extremização sem saída já foi explicada pela falta de duas cabeças menos impulsivas ao lado do impetuoso e irado Fidel. A de Frank
Pais, morto pela polícia de Batista em uma de suas descidas da Sierra Maestra. Frank Pais -e não Guevara,
como a lenda faz supor- era o segundo na hierarquia
dos revolucionários. A ele se seguia, no nível também de
Raul Castro, o outro dos mortos prematuros, Camilo
Cienfuegos, vitimado em desastre de avião já no regime
revolucionário.
Cuba agiu com os Estados Unidos como se pudesse
fazê-lo de potência para potência. A tática inviável na
estratégia impossível. Fidel e a cúpula cubana pareciam
esquecidos de que eram guerrilheiros, esquecidos da
guerrilha como concepção, mesmo que só política, de
luta contra adversário mais poderoso.
A URSS e o desaforo cubano
Os Estados Unidos
aproveitaram esse tempo de retaliações mútuas para armar o golpe que consideravam fatal. Cuba foi o fornecedor secular de açúcar e fumo para os americanos. Desde
os primeiros meses da revolução, porém, a importação
se reduzia. Os americanos articulavam-se com novos
fornecedores, entre os quais os brasileiros tomados de
euforia com as perspectivas de lucro. A Guerra Fria estimulou a União Soviética a tornar-se compradora do
açúcar cubano, mas sem absorver todo o excedente, e
fornecedora de gêneros antes provenientes dos Estados
Unidos. E então, julho de 60, ano e meio de governo revolucionário, os americanos cortaram a cota de importação do açúcar cubano, no acordo de divisão do mercado internacional.
A União Soviética resolveu bancar o desaforo cubano
de sobreviver. Aumentou as compras e o fornecimento,
proporcionou mais armas para a defesa de Cuba contra
as ininterruptas investidas preparadas pela CIA, com o
uso de bem pagos exilados cubanos. A colaboração da
URSS, e só ela, enfim abriu aos comunistas o convívio
com Fidel e o governo revolucionário.
Os comunistas não foram admitidos na formação do
governo, antes nem depois da concentração do poder
em Fidel, e seus esforços para apagar a oposição aos revolucionários de Sierra Maestra, como aos outros movimentos contra Batista, não obtinham resultado.
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