|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
DENTRO DA NOVA ORDEM
PARA O ECONOMISTA EDUARDO GIANNETTI, PAÍS DEVE RESISTIR À CRISE NOS EUA, MAS DEPENDÊNCIA DA CHINA PODE SER PROBLEMA
JOÃO PEQUENO
DA REDAÇÃO
P
rofessor no Ibmec
(Instituto Brasileiro
de Mercados de Capitais/SP), o economista Eduardo Giannetti
da Fonseca atribui a uma expansão "extravagante" do crédito a crise que abala a economia norte-americana e ameaça
a mundial. Ponderando as previsões de analistas mais pessimistas e mais otimistas, ele não
acredita em uma pronta reação
da economia, mas tampouco
aposta na recessão permanente, considerando mais provável
uma recuperação gradual (curva em U).
Nascido em 1957, em Belo
Horizonte, Giannetti é formado pela USP e PhD pela Universidade de Cambridge (Reino
Unido), já tendo lecionado em
ambas. Ganhou o Prêmio Jabuti em 1994, por "Vícios Privados, Benefícios Públicos?" (Cia.
das Letras), e, em 1996, por "As
Partes e o Todo" (ed. Siciliano).
Para Giannetti, também
membro do Conselho Superior
de Economia da Fiesp (Federação das Indústrias do Estado de
São Paulo), o Brasil, como o
mundo todo, sofrerá conseqüências, mas tem como sobreviver à crise, porque não estaria
mais tão dependente da economia dos EUA.
FOLHA - O capitalismo liberal está
passando por uma crise irreversível?
EDUARDO GIANNETTI - O crash da
Bolsa norte-americana em
1987 foi saudado por muitos como "o muro de Berlim do neoliberalismo". Em retrospecto, o
que foi? Um soluço nas telas.
As "crises irreversíveis do capitalismo", o que quer que isso
signifique, têm se sucedido
com regularidade desde que
Marx nos viciou a pensar a história como uma auto-estrada
de modos de produção. Também a imaginação humana é
dada a surtos especulativos.
FOLHA - Por que a crise das hipotecas está ocorrendo?
GIANNETTI - Trata-se de uma típica crise de crédito. Motivado
pelos baixos juros, apetite pelo
risco e aumento da liquidez, o
sistema financeiro expandiu o
crédito de forma extravagante.
Parte dos investimentos feitos frustrou as expectativas e
não deu o retorno esperado.
A aversão ao risco subiu e o
crédito encolheu. Como diz
Warren Buffett [investidor
americano apontado pela revista "Forbes" como homem mais
rico do mundo], "é só quando a
maré baixa que descobrimos
quem estava nadando nu".
FOLHA - Como o senhor prevê os
desdobramentos da atual crise?
GIANNETTI - A incerteza favorece a dispersão de expectativas.
Para os otimistas, o paralelo é
a recessão de 2001 nos EUA, a
menor do pós-guerra: a curva
do nível de atividade terá um
formato em V.
Os pessimistas vêem um paralelo com a crise japonesa dos
anos 90, cuja origem foi também o sistema de crédito: a curva da recessão será um L.
O provável, creio, é o U: mais
grave que 2001, mas longe da
deflação japonesa.
FOLHA - Quais são as soluções a
curto, médio e longo prazo?
GIANNETTI - A resposta imediata
é o que o Fed vem fazendo: baixando os juros e garantindo a liquidez necessária para evitar
uma crise sistêmica.
O ideal é que os prejuízos sejam o mais rapidamente explicitados e os EUA consigam estreitar o seu déficit externo
sem provocar uma recessão
global. Olhando à frente, creio
que será preciso rever o marco
regulatório do sistema financeiro, visando a prevenir bolhas
de crédito.
FOLHA - Os EUA caminham para
um enfraquecimento inevitável de
seu poder político e econômico em
nível mundial?
GIANNETTI - Felizmente o mundo vem se tornando menos dependente da turbina norte-americana. Há um processo de
rebalanceamento das fontes de
crescimento na economia
mundial. Os países emergentes
já representam cerca de metade do PIB global (PPP) e respondem por mais de 45% das
exportações mundiais.
O outro lado da moeda é que
estamos nos tornando cada vez
mais perigosamente dependentes do dínamo chinês.
FOLHA - Quais são as perspectivas
vislumbradas para o Brasil e os demais países emergentes?
GIANNETTI - Muito dependerá
da intensidade e duração da crise americana. Nenhum país ficará totalmente imune. Os
mais afetados serão os que dependem muito do mercado
norte-americano (como México e Canadá) ou que têm elevados déficits externos (como
Turquia e África do Sul).
Embora o Brasil não chegue a
ser, como dizia o ex-presidente
Ernesto Geisel (1908-1996),
"uma ilha de prosperidade num
mar turbulento", estamos aptos a transpor a tormenta.
Texto Anterior: Jogo frenético Próximo Texto: Empurrão público Índice
|